Saiba como funciona o controle da internet na China
Atividades como assistir a um vídeo no YouTube ou buscar um tema no Google faz parte do cotidiano de muitos internautas brasileiros. O mesmo não ocorre em países como a China, em que há um forte bloqueio do conteúdo online. Além de censurar o acesso a sites, o governo chinês também impede a busca de determinados termos em plataformas de busca, como "free tibet".
De acordo com a jornalista Janaína Camara da Silveira, residente no país desde 2007, o Estado chinês controla todo o conteúdo online em circulação no país, barrando o que for considerado impróprio. Outra medida que ocorre com algumas páginas é o direcionamento automático para sites equivalentes. Além disso, todos os provedores de internet precisam passar por aprovação do governo, sendo que tudo que é acessado pelos usuários deve ser canalizado para portas de entradas, as chamadas gateways, onde ocorre uma fiscalização do teor do tráfego. Devido a esses tipos de medidas, criou-se a denominação Great FireWall of China, em referência à Grande Muralha. Assim como a expressão sugere, firewall é uma barreira de proteção que pode bloquear o acesso a conteúdos considerados indesejados.
Segundo o professor do Instituto de Computação da Unicamp, Paulo Lício de Geus, o bloqueio de determinados sites da internet é considerado uma prática relativamente simples para ser executada, até mesmo por usuários domésticos. Por meio desse programa, o site censurado carrega infinitamente, até a conexão espiar. Na internet, inclusive, estão disponíveis diversos programas desse tipo, que podem ser instalados e utilizados por usuários não especializados como, por exemplo, pais que desejam impedir que os filhos acessem determinados conteúdos. Para barrar uma determinada página, o dispositivo identifica informações como a porta IP e os endereços do destinatário e do remetente.
O bloqueio da busca em sites de determinadas palavras e expressões é, no entanto, um processo que requer outras medidas de controle, assim como o direcionamento automático de páginas. De acordo com o pesquisador, esse tipo de cerceamento requer a utilização de programas complexos. Para ele, essa sofisticação está ligada à qualidade dos profissionais da área de computação, os quais detêm um amplo domínio de conhecimentos técnicos. Além disso, a estrutura chinesa só é possível devido ao suporte econômico provido pelo Estado, que investe em tecnologia especializada e em larga escala.
Na China, são grandes os boatos de que há um controle de históricos de acesso, correios eletrônicos e outras informações pessoais. Durante os seus cinco anos no país, Janaína já soube de pessoas que tiveram suas contas de e-mail invadidas. Um dos casos mais conhecidos dessa violação de privacidade foi a prisão do dissidente político Wang Xiamong em 2002. O oposicionista esteve preso durante 10 anos devido uma sentença que teve base em dados sigilosos fornecidos pelo Yahoo. Após ser duramente criticada, a empresa pediu desculpas, inclusive indenizando os familiares de Xiamong e de outro contestador, Shi Tao, que também foi condenado em circunstâncias semelhantes.
As alternativas para burlar o bloqueio: os sistemas VPN
Apesar da forte censura estatal, existem alternativas para o acesso ao conteúdo bloqueado, sendo a mais comum a utilização de sistemas de comunicação por VPN (Virtual Private Network). Esse serviço pode ser utilizado para interligar dois computadores pela internet, possibilitando a criação de uma rede anônima que protege o conteúdo acessado. Por meio dessa rede privada, são promovidas trocas constantes no endereço de IP do computador, dificultando a identificação pelos programas de censura.
Muitos turistas, intercambistas e pessoas que pretendem morar em locais com a internet censurada contratam esse tipo de serviço. Residente na China, há cinco anos, o jornalista e escritor brasileiro Richard Amante decidiu utilizar um sistema IP, pois se sentia prejudicado por ter seu uso da internet limitado. A estudante de jornalismo Manuela Lenzi tomou a mesma medida quando foi realizar um intercâmbio no país oriental. Logo após chegar em Pequim, a intercambista recebeu um folheto de uma empresa que oferecia acesso irrestrito à plataforma online. Segundo ela, o papel continha um código promocional que possibilitava o acesso ao sistema de forma gratuita durante um mês.
Para o professor Lício de Geus, no entanto, não há como se estimar se as redes VPN são realmente seguras, pois o sistema de controle chinês é complexo e abrangente. O pesquisador considera que o aparato do Estado tem fortes possibilidades de poder invadir esses serviços, possibilitando, inclusive, o monitoramento do comportamento dos internautas. Para ele, é difícil garantir que essas redes anônimas burlam totalmente a inspeção estatal. Afinal, essa alternativa de fraudar o sistema é amplamente conhecida entre o público.