Análise: Toyota Etios pode sair de linha e isso será um erro
Com o fim da produção do carro na Índia e a inexistência de um substituto, o mesmo pode ocorrer no Brasil em 2021. Calma lá, Toyota!
Vamos aos fatos. O Toyota Etios sairá de linha ainda neste primeiro semestre na Índia. Não haverá um substituto para o carro compacto criado especialmente para mercados emergentes, como a Índia e o Brasil. Na Índia, o Etios estreou em 2010; no Brasil, em 2012. Ao longo da década, o carro marcou presença também em outros países, como Indonésia e Argentina. De 2010 para cá, o mercado de carros da Índia cresceu, o país chegou à marca dos 4 milhões de veículos, mas o Etios não foi um grande sucesso. No Brasil, após um crescimento no início da década passada, o mercado encolheu. O Etios não foi um campeão de vendas, mas fez um bom papel.
O Yaris pode ser visto como um substituto natural do Etios, uma vez que os dois carros são feitos na mesma plataforma. Por isso, crescem os rumores de que a Toyota desistirá do Etios também no Brasil. Pode ser, mas seria um erro. O Etios foi um dos carros que mais evoluíram no mercado brasileiro. Ele pagou o preço de uma certa arrogância da Toyota em seu lançamento, ao acreditar que mercados emergentes comprariam um carro feio e mal acabado só por trazer a grife da marca. Não. Os emergentes também querem um bom produto em todos os sentidos. Por isso, aos poucos, a Toyota melhorou o acabamento e o estilo do Etios, começando pelo quadro de instrumentos.
O Toyota Etios já nasceu bom de mecânica. Com as modificações feitas ao longo do tempo, ele se tornou também um carro maduro. Dependendo da versão, ele é até bonitinho. Por dentro, apesar de simples, passa uma sensação agradável. O carro tem bom espaço interno e conseguiu o milagre de entrar no segmento dos compactos automáticos com um câmbio de quatro marchas. Ficou bom (na verdade, melhor do que alguns automáticos de cinco) e isso mostra a capacidade da engenharia da Toyota ao lidar com a transmissão Aisin (uma de suas subsidiárias).
O Brasil pós-pandemia de Covid-19 será muito diferente. A renda média do brasileiro, que já era baixa, vai cair. A compra de carros modernos vai ficar cada vez mais difícil. Por outro lado, para fugir das aglomerações, muitas pessoas voltarão a procurar um carro barato. São as mesmas pessoas que estavam trocando o automóvel por outras formas de mobilidade. Sabemos que o Etios nunca foi “barato”, nunca sequer teve a ambição de ser “popular”. Claro que a decisão de manter o Etios em produção no Brasil depende de muitos outros fatores que só a Toyota poderia responder -- mas, como é óbvio, a marca não fala de suas estratégias futuras. Para o Brasil, porém, seria ruim a aposentadoria do Etios.
Mesmo que seja para atuar em mercados alternativos, como a venda para taxistas, motoristas de aplicativos ou frotistas (além dos interessados comuns), o Etios ainda pode render bons frutos para a Toyota. Entraremos num mundo em que a troca constante de mercadoria poderá diminuir seu ritmo drasticamente. As montadoras sofrerão com falta de caixa. Dessa vez, não dá para manejar os investimentos pelas regiões do planeta, segurando a barra aqui para salvar a operação ali, pois trata-se de uma crise global. O dinheiro sumiu no mundo inteiro. Nesse cenário, vale para o Toyota Etios o mesmo que vale para o Volkswagen Gol (ameaçado de não ter uma nova geração): o modelo atual está bom para a realidade econômica e social do Brasil.
Pense bem, Toyota! Matar o Etios talvez fosse uma alternativa correta no mundo pré-pandemia. Matar o Etios no mundo pós-pandemia talvez seja um luxo desnecessário. Trata-se de um carro que já teve seu investimento pago e ele pode, sim, ficar mais uns cinco anos no mercado com seu atual formato. Para os consumidores que buscam um carro mecanicamente confiável e agradável de dirigir, o Toyota Etios é uma das melhores opções do mercado brasileiro. Quantos mais correrão atrás dos modelos que, aperfeiçoados, ficam cada vez mais caros? A Toyota vai liderar com certeza o mundo dos carros eletrificados (basta ver a tecnologia de seus híbridos e o incrível Mirai movido a hidrogênio). Por isso, deixar o Etios mais um tempo nas ruas, para um país que está com a economia em frangalhos, talvez seja uma sensata concessão ao mundo dos motores a combustão interna. Afinal, estamos falando de um carro que teve mais de 500 mil unidades vendidas.