Peugeot e Citroën usarão motores turbo da Fiat e da Jeep
CEO da Stellantis, Carlos Tavares, afirma que a sinergia mais óbvia é fazer motores em um só lugar para carros de todas as marcas
Está confirmado: em breve os carros da Peugeot e da Citroën poderão usar a nova família de motores GSE Turbo que a Stellantis começou a produzir em Betim (MG) para modelos da Fiat e da Jeep. A informação foi dada nesta quinta (11) pelo próprio CEO global da Stellantis, Carlos Tavares, durante uma entrevista coletiva virtual para um pequeno grupo de jornalistas do Brasil.
Falando da fábrica da Stellantis em Goiana (PE), onde são produzidos os Jeep Renegade e Compass e a picape Fiat Toro, Tavares estava acompanhado de Antonio Filosa, chefe de operações para a América Latina. É a primeira vez que Tavares visita as fábricas de Betim e Goiana. Além dessas duas, a Stellantis tem a fábrica de Porto Real, que produz os carros da Peugeot e da Citroën.
Na prática, o novo Peugeot 208 vai trocar o atual motor 1.6 aspirado pelo novo GSE Turbo T3 (1.0 de 3 cilindros). Além de a potência ser maior (estima-se 125 cv), o consumo será bem menor, o que dará ao novo Peugeot 208 mais competitividade em relação aos demais hatches do mercado. Da mesma forma, o Citroën Cactus e o Peugeot 2008 poderão ser equipados com o motor GSE Turbo T4 (1.3 de 4 cilindros), que tem 170 cavalos com gasolina. Tavares não foi específico. Portanto, não dá para saber quando haverá a utilização desses motores.
Segundo Tavares, a utilização dos motores concebidos para Jeep e Fiat em modelos da Peugeot e Citroën “é a sinergia mais óbvia”. Segundo ele, “podemos fazer motores em um só lugar com mais economias de escala e usar no máximo de modelos”. A decisão final, entretanto, caberá a Antonio Filosa. O chefão da empresa que surgiu da união da antiga FCA com a antiga PSA afirmou que as fábricas agora deixam de pertencer a uma ou duas marcas.
“Não há ligação entre uma marca e uma fábrica”, disse Tavares. Segundo ele, “desde que haja uma lógica industrial”, qualquer fábrica da Stellantis pode produzir qualquer coisa para qualquer uma das marcas. A nível global, são 14 marcas: Fiat, Jeep, Chrysler, Dodge, Ram, Peugeot, Citroën, DS, Opel, Vauxhall, Maserati, Alfa Romeo, Lancia e Abarth.
A similaridade de produtos entre Fiat, Peugeot e Citroën, especialmente as duas francesas, não parece ser prioridade. “Se no Mercosul temos mais ou menos 30% de cota de mercado, obviamente quer dizer que nos faltam 70%”, disse Tavares. Portanto, aumentar a participação nas vendas é mais importante do que as semelhanças ou diferenças entre Peugeot e Citroën, que oferecem praticamente os mesmos carros no Brasil.
“Se houver muito cross shopping entre a Peugeot e a Citroën, temos que diferenciar os produtos de maneira mais significativa”, disse o CEO global. Uma das marcas poderia, por exemplar, focar num veículo verdadeiramente popular e acessível para o mercado brasileiro? “Isso pode ser uma alternativa, pode até ser”, afirmou. Segundo Carlos Tavares, Peugeot e Citroën foram prejudicadas pela falta de investimento em produtos nos últimos anos.
“Numa Stellantis bem alargada, as oportunidades para fazer produtos diferentes também existem porque há mais possibilidades de derivar automóveis de outras marcas que não sejam da Peugeot para a Citroën ou da Citroën para a Peugeot”, comentou. “Temos um painel muito mais alargado para diferenciar mais essas duas marcas, se fosse este o problema.”
Mas não é. Portanto, Antonio Filosa trabalha com três critérios: lucro, cota de mercado e satisfação do cliente. “Se não houver lucro, não há futuro, este é o primeiro critério”, disse Tavares. “O segundo critério é o crescimento da cota de mercado e o terceiro é a satisfação do cliente do ponto de vista do produto e do ponto de vista do serviço.”
Carlos Tavares também afirmou que a Stellantis da América Latina “é uma maravilha, pois aqui temos tudo: design, engenharia, logística, compras, fabricação, marcas, concessionárias, temos tudo”. Na visão do CEO global, a região da América Latina é como se fosse uma pequena Stellantis. “Isso dá às equipes locais uma grande autonomia”, afirmou. “É uma das coisas que está na origem do sucesso da FCA na região, que foi anterior ao sucesso da PSA. Vamos continuar nessa mesma direção.”
Além da utilização livre de motores e até mesmo modelos dentro uma lógica industrial, a Stellantis planeja economizar 5 bilhões de euros em sinergia a nível global. Segundo Carlos Tavares, ao desenvolver apenas um motor e não dois ou três, a empresa ganha porque tem maior escala e capacidade de negociar preço, o fornecedor ganha porque se concentra em apenas uma peça e o cliente ganha porque o preço final cai.
Tavares se disse impressionado com sua visita de três dias às fábricas de Betim e Goiana. “O plano de sinergias que nos foi apresentado pelo Sr. Filosa é superior àquilo que representava nossas expectativas do plano global”, afirmou. “Há mais ideias, há mais oportunidades do que aqueles que podíamos observar a partir de Paris ou de Turim. Lá de longe não se vê tão bem como de perto.”
Ele disse que a sinergia não se refere a fechar fábricas ou descontinuar marcas. “Nossa compreensão da sinergia não tem nada a ver com as fábricas no sentido de fechar ou não fechar”, explicou. “Tem a ver com libertar as sinergias e dar espaço para nossas equipes para que elas possam utilizar sua inteligência, seu bom senso e sua frugalidade.”
Falando a nível global, Carlos Tavares desmentiu que qualquer marca seja descontinuada: “Não é nossa intenção. Nós temos uma paixão e um respeito muito grande pelas 14 marcas que temos na nossa empresa automóvel”. Entretanto, nada impede que a Stellantis América Latina chegue à conclusão de que uma Citroën ou uma Peugeot, por exemplo, não seja rentável para o Brasil, mas seja para a Argentina.
“Os patrões das regiões têm autoridade da minha parte para decidir o que vão utilizar em tal e tal marca, em tal e tal sítio”, explicou Tavares. “Se ele achar que dessas 14 marcas, algumas devem focar em um ou dois mercados específicos, enquanto outras marcas vão brigar em outros mercados, a decisão é do patrão da região. Ele tem essas 14 marcas e pode decidir qual é a melhor estratégia em função dos mercados em que está. Ele pode usar uma determinada marca em uma região e utilizar as outras em outro sítio.”
Claro que caberá a cada chefe de operações traçar um plano de investimentos para cada marca e convencer o board global de que tem “uma ideia clara sobre qual direção quer ir, que tipo de tecnologia quer utilizar, que tipo de produto precisa”. Cabe ao líder de cada região, portanto, apresentar negócios rentáveis para decidir se faz sentido, a nível de negócio, a continuidade da empresa. "Vamos dar uma chance para cada uma das marcas”, disse Tavares.