Por que os radiadores estão nas laterais em um carro de F1?
Até 1970, o mais comum era que os carros tivessem radiadores na frente. Mas um carro mudou isso: o Lotus 72
Uma certeza quando se pensa em carros de fórmula é que seus radiadores estarão nas laterais. Mas nem sempre foi assim. Na verdade, era comum os radiadores ficarem na frente dos carros.
Para se entender a importância dos radiadores, é preciso entender a sua necessidade. De maneira simplista, os motores a combustão geram bastante calor para o seu funcionamento, mas precisam ser mantidos em uma faixa de temperatura para seu funcionamento ideal. Para isso, um fluido passa pelo motor tirando parte do calor gerado. Para esse fluido estar sempre resfriado, é preciso passar pelo radiador, que, por sua vez, é resfriado pela entrada de ar do carro.
Nos primeiros carros de F1, datados da década de 50, o design lembrava a forma de um charuto, com o motor dianteiro e uma entrada de ar na frente para o radiador. Isso se manteve mesmo quando os carros com motores centrais traseiros apareceram na F1 e começaram a ter sucesso, a partir de 1958. Mesmo com os motores na parte de trás, o radiador ficava à frente, ligado por grandes mangueiras que praticamente atravessavam o carro para isso.
Mas a ideia de colocar os radiadores nas laterais não foi orgânica. Ela veio por conta de uma inovação da Indy 500. Em 1967, o STP-Paxton Turbocar foi inscrito para a prova. Seu diferencial era que ele não usava um motor convencional, mas sim de uma turbina de avião, a Pratt & Whitney Canada PT6, que não precisava de um radiador, além de poder contar com tração nas quatro rodas. O carro foi dominante na prova: o seu motor gerava 550 cv, mas quebrou a poucas voltas do fim por conta de uma falha de rolamento, abandonando a corrida.
No ano seguinte, foi a Lotus que se interessou pelo projeto. Mas a USAC, a entidade que cuidava da prova na época, limitou o tamanho das entradas de ar para carros movidos a turbina. O STP-Paxton era muito mais um carro adaptado a uma turbina do que qualquer outra coisa, com a sua unidade de força ficando ao lado do piloto. Por conta disso, Colin Chapman (chefe de equipe e diretor técnico) e Maurice Philippe (designer chefe) pensaram em formato totalmente aerodinâmico, visando compensar a perda de potência gerada pelas novas regras.
O carro batizado como Lotus 56 tinha formato de cunha, o que ajudava a cortar o ar de maneira muito mais eficiente que os carros convencionais. Outra solução foi colocar a turbina atrás do piloto, o que só era possível pela ausência do radiador. Foram inscritos quatro carros para a prova, mas Mike Spence acabou falecendo após bater nos treinos livres. Foram mantidos nesse cenário os três outros carros: Graham Hill, Joe Leonard e Art Pollard.
Embora Leonard tenha conquistado a pole, o Lotus 56 não sobrava como o seu antecessor, até pela questão do equipamento ter que ser poupado. A Lotus sabia que, mesmo com a diminuição de 550 para 500 cavalos, os carros quebravam se fossem forçados. Hill acabou batendo seu carro e uma bandeira amarela no fim da prova acabou fazendo com que Leonard e Pollard tivessem que acelerar seus carros para tentar reassumir a ponta. Mesmo com tanta potência, esses carros demoravam muito mais para acelerar e conseguir chegar em altas velocidades, o que era vantajoso para os convencionais. No fim, a aposta não deu certo e os dois quebraram.
Na verdade, se provou um ponto na edição de 1968: a eficiência aerodinâmica do Lotus 56 acabou se sobressaindo, mas com tão pouca entrada de ar, as turbinas acabaram se mostrando frágeis. Tendo isso em mente, a Lotus já pensava em trabalhar para a edição de 1969, mas a USAC criou barreiras a esse tipo de carro, tornando o projeto inviável.
Sem poder usar seu carro na Indy, Colin Chapman voltou suas atenções a tentar usar o conhecimento adquirido em um carro de F1 inicialmente. Então surgiu o projeto do Lotus 72, mas com um “problema”: ele usaria o convencional motor Ford Cosworth DFV 3.0 V8. Desta forma, precisaria de radiadores. Sem poder colocá-los na frente pelo design do carro, a solução seria colocar nas laterais. Além de, claro, se acrescentar as asas, que já era comuns na F1
Isso também daria vantagens ao carro. Primeiro, por não ter mangueiras tão longas atravessando o carro, o que já ajudaria no equilíbrio. Mas a questão do design ajudou também na questão aerodinâmica e de distribuição de peso. O carro estreou em 1970, no GP de Espanha, mas teve alguns problemas: a suspensão tinha que ter um sistema diferente, para evitar que a frente abaixasse nas freadas e que a traseira abaixasse nas acelerações. Isso gerou certo estranhamento dos pilotos, mas, com alguns ajustes, o problema foi resolvido.
Falando em resultados, Jochen Rindt garantiu seu título graças ao modelo. Ele já tinha vencido o GP de Mônaco com o Lotus 49C, mas a partir do momento que pegou o Lotus 72C, já que as modificações necessárias, venceu quatro corridas seguidas, entre o GP dos Países Baixos e o da Alemanha, acabou abandonando o GP da Áustria, mas faleceu durante os treinos do GP da Itália, quando perdeu o controle na curva Parabólica.
Mesmo não correndo as quatro últimas etapas, Rindt se tornou o único campeão póstumo da categoria. O Lotus 72 não se mostrou competitivo em 1971, mas venceu os construtores em 1972 e 1973, além de vencer o campeonato de pilotos de 1972. Mas seu legado mais importante é, com certeza, a questão dos radiadores. Depois dele, todos os carros começaram a ter essas peças nas laterais, não só na F1, mas em todas as outras categorias de Fórmula.
E ainda sobre o Lotus 56, ele acabou sendo usado na F1 em 1971. Mas isso é tema para outro artigo. Afinal de contas, ele merece ter sua história contada em mais detalhes.