Crítica: Série com Liniker é belo projeto da diversidade na Amazon
"Manhãs de Setembro" traz a cantora trans como mulher que descobre ter um filho de dez anos
Se há hoje uma guerra dos streamings para lançarem séries brasileiras pioneiras, existe também um esforço de associar as novas plataformas aos conceitos atuais de diversidade e pluralidade. A Netflix já incluiu personagens plurais em séries como "Sintonia", "3%", "Boca a Boca". Mas ninguém foi tão longe até agora quando a Amazon Prime Video com "Manhãs de Setembro", série em cinco episódios curtos com a atriz e cantora trans Liniker que estreou nesta sexta.
É uma série que respira humanidade em todos os seus personagens de classe baixa em São Paulo, espremidos por muitas dificuldades financeiras, se virando para ter uma vida digna. Liniker é Cassandra, mulher trans que um dia já foi Clóvis - e que acaba de descobrir que tem um filho de dez anos com uma namorada do passado, a ambulante Leide (Karine Telles). Cassandra tem um namorado garçom (Tomás Aquino, de "Bacurau"), acaba de realizar seu sonho de morar sozinha em sua quitinete (não por muito tempo) e ama cantar na boate músicas de sua diva Vanusa - ainda que a dona da boate reclame que ela deveria cantar mais divas contemporâneas como Anitta e Pabllo Vittar.
"Manhãs de Setembro" já ajuda muito a quebrar preconceitos ao mostrar essa protagonista trans em toda a sua completude - não a vemos apenas cantando na boate, mas fazendo entregas, lidando com as dificuldades da vida, rejeitando esse novo filho a princípio. (Sim, ninguém é perfeito, e Cassandra rejeita com todas as forças essa criança na sua vida).
Outro grande mérito da série, que tem direção de Dainara Toffoli e Luis Pinheiro, foi dar peso aos outros personagens da série - o elenco ainda inclui Paulo Miklos, Gero Camilo e uma participação de Linn da Quebrada. A equipe de dramaturgia inclui a roteirista trans Alice Marcone. E que bela sacada homenagear a cantora Vanusa, uma intérprete de obra riquíssima nos anos 70, nunca devidamente valorizada na MPB, e que acabou mais conhecida pelo vídeo que viralizou cantando o Hino Nacional sob efeito de remédios numa cerimônia na Assembleia Legislativa de São Paulo. A cantora é muito maior que o meme, e agora Liniker ajuda a reabilitá-la com novas versões de seus hits, incluindo a música-tema que dá nome à série.