Conheça ONG que usa lixo tecnológico para ajudar a remover redes de pesca do oceano
Voluntários da ONG Tangaroa Blue Foundation na Austrália estão reutilizando boias de pesca com GPS para localizar e remover esses apetrechos
A cada ano, cerca de 25 milhões de animais marinhos são afetados — seja pela morte, mutilação, ferimentos ou aprisionamento — pela pesca fantasma no Brasil, conforme estimado pelo estudo Maré Fantasma de 2018, conduzido pela Organização Proteção Animal Mundial. No entanto, o estudo também apontou uma grande carência de dados sobre a atividade pesqueira no País, o que indica que a situação da fauna marinha pode ser ainda mais grave.
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A pesca fantasma ocorre quando equipamentos de pesca, como redes de emalhar e de arrasto, varas, linhas, anzóis, espinhéis e armadilhas, são abandonados ou descartados no oceano, causando sérios danos aos animais. Esse é um problema grave no Brasil, mas não é exclusivo do país.
Em Portugal, por exemplo, ao menos um golfinho morre acidentalmente em redes de pesca a cada dia, segundo Catarina Eira, bióloga responsável pelo Centro de Reabilitação de Animais Marinhos do país europeu, afirmou em 2020 ao Ciência com Impacto.
Com números alarmantes do impacto na vida marinha em todo o mundo, já há uma iniciativa na Austrália que tenta combater essa ameaça. Trata-se de um grupo de voluntários da ONG Tangaroa Blue Foundation, que desenvolveu uma abordagem inovadora para enfrentar o problema das redes de pesca fantasmas. Neste caso, quando abandonadas no mar, podem aprisionar animais marinhos, ferindo-os e levando-os à morte por inanição, já que os animais não conseguem se mover ou se alimentar.
Como a iniciativa funciona
A ONG coordena a Iniciativa Australiana de Detritos Marinhos (AMDI) e, desde o lançamento do programa em 2004, já removeu mais de 24 milhões de fragmentos de detritos marinhos da costa australiana. Todos os dados coletados durante essas operações foram registrados no Banco de Dados AMDI.
Já em 2022, a intituição iniciou um novo projeto, chamado "Project ReCon", após os voluntários descobrirem boias de pesca abandonadas equipadas com GPS durante uma operação de limpeza. Em vez de descartar esses dispositivos, perceberam que as boias ainda funcionavam e poderiam ser reutilizadas para localizar outras redes fantasmas.
A ação conta com o apoio de empresas de tecnologia como a Satlink, que recondiciona e testa as boias para garantir que seus sistemas de GPS estejam operando corretamente. Uma vez reativadas, essas boias são lançadas novamente ao mar, ajudando a identificar e remover redes de pesca abandonadas.
Segundo Kathryn Gavira, chefe de Ciência e Sustentabilidade da Satlink, a tecnologia também permite a criação de cercas virtuais ao redor dos recifes, fornecendo notificações antes que as redes atinjam áreas sensíveis.
Desafios e atuação
O projeto desenvolvido pela instituição australiana ainda enfrenta desafios logísticos significativos: algumas redes são tão grandes que podem medir o tamanho de um campo de futebol e pesar mais de três toneladas, o que torna impossível a remoção imediata. Para contornar essa dificuldade, a ONG mantém essas redes sob monitoramento contínuo até que uma empresa parceira possa fornecer os recursos necessários, como barcos e equipamentos adequados, para retirá-las do mar.
A primeira grande rede resgatada pelo Project ReCon foi localizada a cerca de quatro quilômetros da costa de Weipa, em Queensland, no Golfo da Carpentária. Pesando aproximadamente 3 toneladas, a rede havia sido monitorada por mais de um ano e foi finalmente removida em setembro de 2023, com a ajuda de equipamentos e oficiais da Australian Border Force (ABF), a agência responsável pelo controle das fronteiras australianas.
Desde esse primeiro resgate, a Tangaroa Blue Foundation já removeu outras duas redes fantasmas gigantes da costa australiana. A mais recente, pesando 2,4 toneladas, foi retirada em abril deste ano com equipamentos fornecidos por uma empresa de mineração, após estar sob monitoramento desde março.
Atualmente, o Project ReCon conta com o apoio de cerca de 22 empresas comerciais, que disponibilizam aproximadamente 100 embarcações para auxiliar na remoção dessas redes. O projeto segue monitorando outras redes fantasmas espalhadas ao longo da costa australiana, com o objetivo de proteger a vida marinha e manter os oceanos limpos.