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Governo usa ação de fiscais demitidos para turbinar balanço

Ministério exonerou agentes do Ibama por causa de queima de máquinas, o que irritou Bolsonaro; apreensões feitas neste trabalho, porém, entraram na conta de investida militar

23 jun 2020 - 10h11
(atualizado às 12h29)
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Fachada do prédio do Ibama em desuso, localizado no SQS 309 Bloco A, em Brasília (DF)
Fachada do prédio do Ibama em desuso, localizado no SQS 309 Bloco A, em Brasília (DF)
Foto: Fátima Meira / Futura Press

O presidente Jair Bolsonaro e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, determinaram em abril a exoneração de uma equipe de agentes do Ibama após a queima de máquinas de criminosos na Amazônia. O próprio governo, no entanto, tem usado os resultados dessa operação para turbinar sua investida militar na floresta. O trabalho das Forças Armadas na floresta começou só no mês seguinte.

O Estadão apurou que operação militar Verde Brasil 2, iniciada em 11 de maio pelo Conselho da Amazônia e liderada pelo vice-presidente da República, Hamilton Mourão, incluiu em seu balanço de resultados as apreensões, multas e destruições de máquinas que o Ibama havia feito em uma megaoperação no Pará, entre os dias 4 e 16 de abril.

Na 1ª quinzena de abril, uma equipe de agentes do Ibama fez diversas incursões nas terras indígenas Apyterewa e Trincheira Bacajá. Nas ações, foram lavrados, conforme ofício obtido pela reportagem, 26 autos de infração, 24 apreensões e 17 termos de destruição de máquinas, entre outros itens.

As imagens dessa operação, com tratores e máquinas de grande porte incendiadas no meio da floresta, ganharam a imprensa e foram exibidas no programa Fantástico, da TV Globo, o que enfureceu Bolsonaro. O presidente é contra a destruição de máquinas do crime organizado, apesar desta ação ser prevista em lei há anos.

Bolsonaro condenou a ação e cobrou respostas. Dias depois, o Salles exonerou o diretor de proteção ambiental do Ibama, Olivaldi Alves Borges Azevedo, além dos coordenadores de fiscalização e operações Renê Oliveira e Hugo Loss.

No mês seguinte, porém, conforme apurou o Estadão, todos os dados dessa operação, incluindo as destruições condenadas por Bolsonaro, foram incluídos pelo governo no balanço da operação militar Verde Brasil 2, como forma de incrementar os resultados da ação militar.

Iniciada em maio, operação envolve 3,8 mil militares

A Verde Brasil 2 não é uma operação qualquer. Para criá-la, Bolsonaro publicou decreto em 6 de maio, que autorizou o emprego das Forças Armadas para a Garantia da Lei e da Ordem (GLO). A Operação teve início em 11 de maio, com duração de um mês, tendo renovada em 10 de junho. A operação militar envolve efetivo de 3,8 mil profissionais e 110 viaturas, segundo o governo. Seu orçamento inicial foi estimado em R$ 60 milhões.

A reportagem procurou o Ministério da Defesa, responsável por consolidar o balanço da operação militar encampada pela Presidência da República. Em nota, os militares confirmaram a apuração. "As autuações e as apreensões de madeira e de materiais realizadas nas terras indígenas de Trincheira Bacajá e de Apyterewa estão contabilizadas no balanço da Operação Verde Brasil 2", declarou o ministério.

Reportagem publicada pelo Estadão na sexta-feira, 19, já revelava que a investida militar na floresta havia inflado dados da operação como forma de apresentar resultados mais positivos à população e de sinalizar que o governo tem atuado para combater o desmate na Amazônia. Ações realizadas por outros órgãos federais e estaduais, sem qualquer participação dos militares, estavam sendo usadas para melhorar os dados dos militares. Não se sabia, porém, que até mesmo uma operação anterior à decretação da GLO, e que tinha causado tanta indignação do próprio presidente, agora era usada irregularmente, para maquiar suas próprias ações.

Em nota, a Defesa declarou que "os números estão sendo apurados e são enviados diariamente pelos comandos conjuntos e os dados consolidados serão divulgados no fim da operação". Ocorre que foi o próprio Mourão que, em 9 de junho, convocou a imprensa para divulgar os resultados da empreitada, celebrar o trabalho e informar que ele seria ampliado, por causa do período de queimadas na Amazônia.

No balanço, o governo afirmou que a ação militar apoiou a destruição de 104 tratores de esteira, escavadeiras e máquinas agrícolas, além de ter apreendido 14 mil metros cúbicos de madeira ilegal e de ter emitido 103 multas por infrações ambientais, as quais somam R$ 95,6 milhões. Como se sabe agora, boa parte desses números incluem ações sem nenhuma participação militar.

Não foram só as ações do Ibama que ajudaram a inflar os dados. A reportagem apurou que apreensões de madeira realizadas pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), várias destas sem nenhum apoio militar, também tiveram seus dados somados à Verde Brasil 2. Isso ocorreu, por exemplo, em apreensões feitas pela PRF no Mato Grosso, na fronteira do Brasil com a Bolívia.

A Defesa afirmou que as autuações, apreensões e inutilizações são de competência exclusivas dos órgãos de proteção. "Reiteramos que a Operação Verde Brasil 2 é o resultado a atuação das Forças Armadas e de diversos órgãos e agências, que conduzem operações para reprimir os delitos ambientais na Amazônia. Assim os valores numéricos apresentados consolidam tais resultados, sendo o somatório das ações dos órgãos envolvidos", declarou.

Enquanto isso, o crime avança na floresta. Os alertas do sistema Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), ligado ao Ministério de Ciência e Tecnologia, indicam a perda de 828,97 km² em maio, alta de 12,24% em relação ao mesmo mês de 2019. Em apenas um mês, foram derrubados na Amazônia o equivalente à metade da área da cidade de São Paulo. É o mês de maio com maior devastação desde 2015.

Estadão
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