'Não sei onde vamos parar', diz cientista sobre frequência de eventos climáticos extremos
Especialistas ouvidos pelo Terra alertam que as consequências do aquecimento global podem antecipar projeções sobre extinção da vida humana
O agravamento do aquecimento global nos últimos anos, aliado aos eventos climáticos extremos recentes, como as enchentes que atingiram 458 cidades no estado do Rio Grande do Sul no início de maio, levanta várias questões no meio científico, incluindo a possibilidade de uma extinção em massa da humanidade devido às variações de temperatura no planeta. Especialistas ouvidos pelo Terra alertam, no entanto, que as mudanças climáticas podem ser mais extremas, catastróficas e, o que é pior, mais rápidas do que o projetado.
Receba as principais notícias direto no WhatsApp! Inscreva-se no canal do Terra
Na avaliação de Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, a população humana deve se preparar para cenários pessimistas decorrentes do aquecimento global, em um período mais curto do que o projetado em meios acadêmicos.
"Existem projeções de aquecimento do planeta para daqui até o fim do século, não precisa nem ir tão longe assim, de milhões de anos, não", comenta, referindo-se à pesquisa da Universidade de Bristol, cujos modelos climáticos indicam que os mamíferos serão extintos em 250 milhões de anos.
"Podemos chegar ao aquecimento médio de temperatura no planeta de aproximadamente 4 graus, se nada for feito e se continuarmos acelerando a emissão de gases. Com 4 graus, a extinção em massa de espécies no planeta é algo seguro e garantido. Não há dúvida", alerta Márcio Astrini, do Observatório do Clima.
Astrini cita como base o relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), organizado pela Organização das Nações Unidas (ONU) e que conta com mais de 600 cientistas para estudar, debater e projetar os impactos das mudanças climáticas. O documento, divulgado em 2023, detalha as consequências devastadoras do aumento das emissões de gases do efeito estufa em todo o mundo: a destruição de casas, a perda de meios de subsistência e a extinção de comunidades.
Astrini cita ainda a perda de espécies inteiras em todo o ecossistema marinho, dificuldade de produzir comida na quantidade que produzimos hoje, e escassez da água potável.
"O ser humano vai ter baixa capacidade adaptativa e alguns vão sobreviver, outros não. É isso que vai acontecer se continuarmos assim", diz.
De acordo com o relatório, cerca de metade da população global já vive, por exemplo, em situações de escassez severa de água durante pelo menos um mês por ano, enquanto as altas temperaturas facilitam a disseminação de doenças vetoriais, como a malária.
Na mesma linha de Astrini, Francisco Milanez, diretor científico da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), ressalta que a pior catástrofe socioambiental da história do Rio Grande do Sul é um alerta de como as consequências das mudanças climáticas já são uma realidade. Segundo ele, a realidade gaúcha afasta a ideia de aquecimento global como um problema abstrato e distante da vida da população do planeta.
"Tanto o planeta como o Brasil estão emitindo alertas constantes por meio desses eventos climáticos extremos. Nunca vimos isso na história do País", afirma.
Milanez cita um estudo realizado por pesquisadores do ClimaMeter, que indica que as mudanças climáticas provocadas pela ação humana, especialmente a emissão de gases do efeito estufa liberados com a queima de combustíveis fósseis, tornaram as chuvas no Rio Grande do Sul mais intensas.
"Se continuarmos assim, nesse ritmo, não sei onde vamos parar. Não será preciso milhões de anos, se permanercemos assim", completa.