Como o novo marco regulatório pode impulsionar o hidrogênio verde no Brasil
Conjunto de regras vigente para o setor pode fazer com que o País supere o trauma de políticas públicas malsucedidas e vislumbre um futuro renovável e bem-sucedido, segundo especialista
A aprovação do marco regulatório do hidrogênio verde, sancionado no início de agosto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva após aprovação no Congresso Nacional, é um passo importante que pode colocar o Brasil em mais uma das várias rotas seguras de transição energética disponíveis atualmente.
O conjunto de regras vigente para o setor, agora, pode fazer com que o Brasil supere o trauma de políticas públicas malsucedidas e vislumbre um futuro renovável e bem-sucedido, segundo Fernanda Delgado, diretora executiva da Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde (ABIHV). Ela será uma das participantes do evento Summit ESG - Empresas e Sociedade pela Agenda 2030, promovido pelo Estadão e que será realizado em 26 de setembro, no Teatro B32, em São Paulo.
"A importância do hidrogênio verde para a composição não só da matriz energética brasileira, mas para os processos de fabricação dos produtos nacionais é que ele tem a capacidade de trazer para baixo o conteúdo de carbono da produção. Portanto, para o Brasil fazer parte da nova economia verde será preciso principalmente descarbonizar setores como o da indústria siderúrgica, de fertilizantes, química, de alimentos e até do próprio petróleo", diz a executiva.
Não que esteja tudo resolvido, muito pelo contrário, ainda mais porque a consolidação do chamado hidrogênio verde depende de entendimentos entre lideranças das várias áreas da sociedade brasileira. Em linhas gerais, como explica Delgado, a proposta, um "avanço notável", segundo ela, criou um mecanismo de incentivos tributários e medidas para descarbonizar a matriz energética brasileira, por meio do Rehidro (Regime Especial de Incentivos para a Produção de Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono).
Por intermédio dessa iniciativa, incentivos fiscais da ordem de R$ 18 bilhões serão concedidos às empresas produtoras de hidrogênio verde entre 2028 e 2032. Haverá a suspensão de PIS, Cofins, PIS-Importação e Cofins-Importação. A criação do Programa de Desenvolvimento do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono, outra determinação da lei, também visa o financiamento do setor.
E mais uma medida aprovada no conjunto de regras, o fato de a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) passar a ser a instituição responsável por autorizar a produção, a importação, o transporte, a exportação e a armazenagem de hidrogênio, também é classificada como positiva pelos especialistas do setor. Empresas que não estiverem sediadas no Brasil não poderão produzir o combustível em território brasileiro.
Dados da Agência Internacional de Energia Renovável indicam que, em 2050, o hidrogênio verde deve ser responsável por 12% da necessidade global de energia. O que significa 409 milhões de toneladas produzidas todos os anos. E, se a neutralidade climática for realmente atingida em todas as cadeias de produção do novo tipo de combustível, o impacto sobre o aquecimento global poderá ser grande, da ordem de até 20% na redução das emissões globais, segundo o Hydrogen Council.
No caso brasileiro, além da exportação, a produção via mercado interno, por meio de hubs em construção principalmente no Nordeste, é uma realidade palpável, com vários projetos privados já em andamento. Que devem ganhar fôlego, agora, com o marco regulatório.
Matéria-prima renovável
Tanto do ponto de vista científico quanto tecnológico, o chamado hidrogênio verde apenas recebe esse título quando a matéria-prima utilizada no início do processo vem de uma fonte renovável ou da biomassa, como no caso do etanol. Existem veículos em várias partes do mundo que já são abastecidos com hidrogênio, mas são combustíveis produzidos a partir do gás natural. É o que se padronizou chamar de hidrogênio cinza, por estar no meio do caminho entre as fontes limpas e os combustíveis fósseis.
Outra possibilidade de produção de hidrogênio, e que nutre um trilho tecnológico em franco desenvolvimento no Brasil e em todo mundo, é a partir da água, por meio da hidrólise, a quebra da molécula.
No caso dessa quebra da água, tecnologia que está sendo usada, por exemplo, para a obtenção de hidrogênio no Ceará, um dos pontos importantes para a neutralidade climática do processo é o tipo de energia primária que será usada para movimentar os equipamentos que farão a hidrólise. Como a ideia, no caso, é usar energia solar, a conta fecha.
O mesmo raciocínio é válido para a energia eólica. A tecnologia da quebra da água, em larga escala, está recebendo atenção em várias partes do mundo. Os chineses estão com vários projetos em andamento.
Na prática, os dois processos, o que utiliza a biomassa como o etanol, ou o da quebra da água, estão partindo de uma molécula altamente energética (até quatro vezes mais do que a do carvão) estocada na natureza a partir de ligações químicas com outros elementos da tabela periódica. Apesar dos resultados promissores, e de muitas associações internacionais promoverem o hidrogênio verde como uma solução milagrosa, ainda vão ser necessários muitos anos para a tecnologia, de fato, decolar, segundo especialistas.
O Summit ESG Estadão - Empresas e Sociedade pela Agenda 2030 será realizado em 26 de setembro, das 8h30 às 19h, no Teatro B32, em São Paulo. Para se inscrever, acesse este link.