Incêndios em Los Angeles: o que é o 'pó rosa' usado contra o fogo? É adotado no Brasil?
Retardante de chamas é usado para conter avanço do fogo, mas enfrenta críticas por impacto ambiental; uso não é regulamentado no Brasil, segundo o Ibama
Mais de uma semana após o início dos incêndios florestais na região de Los Angeles, na Califórnia, parte da cidade ficou coberta por uma nuvem de poeira rosa, que assentou sobre o asfalto, os carros e as árvores da cidade.
A substância, um retardante de chamas, foi despejada por aviões tanque e é usada para impedir que o fogo se espalhe, ajudando a combatê-lo em áreas difíceis de serem alcançadas por terra.
Nos Estados Unidos, o produto costuma ser pulverizado ao redor de incêndios florestais, na vegetação e no solo de áreas propensas ao fogo.
No processo mais recente, movido em 2022 por um grupo ambientalista, a agência estatal foi acusada de poluir cursos d'água ao derramar neles grandes volumes de retardante durante as campanhas contra incêndios florestais. Desde 2024, o serviço florestal americano proíbe o despejo desses produtos em hidrovias e habitats de espécies ameaçadas.
Há também quem questione a eficácia dos retardantes frente ao dano ambiental, uma vez que pode ser difícil medi-la depois que o fogo é extinto.
Defensores argumentam que eles são uma arma poderosa e indispensável contra grandes incêndios, que também oferecem riscos à saúde pela exposição à fumaça.
Brasil não tem preparo para uso seguro e eficaz, diz Ibama
Retardantes de chama são utilizados em casos pontuais para combater incêndios florestais no Brasil. O uso desses produtos não é proibido no País, mas carece de regulamentação específica e de mais estudos sobre seu impacto na vegetação e na fauna.
Para o Ibama, esses efeitos "ainda não foram adequadamente investigados" e, diferentemente de países como Estados Unidos e Canadá, onde há frotas aéreas dedicadas e infraestrutura para a aplicação dos retardantes, "o Brasil carece de preparação adequada para o uso seguro e eficaz" desses produtos, declarou o órgão ambiental em nota.
Ele também não costuma ser usado pelo órgão federal porque a atuação principal do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo) do Ibama no combate e prevenção a incêndios está concentrada em áreas federais, principalmente em terras indígenas e quilombolas, "situação que carece de maiores cuidados, haja vista os efeitos tóxicos que estes produtos podem causar".
O Ibama também cita a segurança para a saúde humana entre as preocupações, recomendando que usuários busquem por informações detalhadas na Ficha de Informação de Segurança de Produtos Químicos fornecidas pelos fabricantes e utilizem Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) para minimizar riscos à saúde dos combatentes.
Segundo o órgão, a tecnologia pode ser eficaz, desde que haja proficiência das equipes para realizar operação efetiva e mitigar os impactos negativos: no caso da flora, alerta que esses impactos podem incluir "severa mortalidade" e alterações temporárias no ciclo de vida das plantas. "A decisão de usar retardantes de chama deve ser bem fundamentada, considerando os riscos e benefícios potenciais", afirma.
O órgão já usou retardantes de chama de modo esporádico, nos incêndios ocorridos em 2008 na Chapada Diamantina e em 2015 na Terra Indígena Arariboia.
No entanto, faz a ressalva de que os incêndios florestais no Brasil diferem de países como os Estados Unidos em relação à vegetação e ao comportamento do fogo.
Nos EUA, há alta incidência de incêndios de copa, que exigem intervenções mais drásticas, utilizando meios aéreos para lançar água e retardantes de chamas, enquanto no Brasil predominam os incêndios que ocorrem sobre a superfície do solo, o que dificultaria a eficácia do lançamento aéreo de água ou retardantes, com penetração limitada desses agentes.
São Paulo testou produto similar em setembro
Um retardante foi testado pelo governo de São Paulo durante a onda de incêndios que ocorreu em cidades do interior em setembro. Em vídeo promocional, o governo estadual anuncia o uso do "produto inovador no combate às queimadas", que permitiria reduzir custos e aumentar a eficácia do combate, tornando-a mais rápida e impedindo a re-ignição em áreas já controladas.
Em nota, a Defesa Civil de São Paulo informou que um produto desse tipo foi usado pelo governo no 2º semestre de 2024, durante o combate a incêndios em Ribeirão Preto e na Reserva Ecológica do Jataí, em Luiz Antônio. O líquido retardante seria capaz de combater incêndios florestais até cinco vezes mais rápido que a água.
De origem nacional, o químico é usado como fertilizante na produção agrícola e, "de acordo com informações do fabricante, não causa efeitos ao ecossistema", afirma o órgão estadual. O nome do fabricante e sua composição não foram informados.
Segundo a Defesa Civil, o produto deve ser utilizado em incêndios de grandes proporções como os que ocorreram no ano passado, seguindo "critérios preestabelecidos": incêndios que estejam próximos a residências, atinjam áreas muito extensas ou coloquem em risco as reservas florestais do Estado.