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Saiba qual é o país que desponta como liderança mundial em ações climáticas. E se aproxima do Brasil

Uma das poucas nações-ricas que enviou seu principal chefe de estado à COP-29, Reino Unido quer 'liderar pelo exemplo' e se tornar 'super potência' de energia limpa; entenda

24 nov 2024 - 12h14
(atualizado às 14h04)
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Nova meta de financiamento climático definida na COP-29 gerou insatisfação entre países em desenvolvimento
Nova meta de financiamento climático definida na COP-29 gerou insatisfação entre países em desenvolvimento
Foto: Reprodução/X @COP29_AZ

ENVIADA ESPECIAL A BAKU - Em um ano em que o maior evento sobre mudanças climáticas do mundo ficou esvaziado de grandes lideranças mundiais, o berço da Revolução Industrial enviou o seu time principal: o premiê e o alto escalão de ministros de secretariados chave. Também foi um dos poucos a apresentar antecipadamente a nova meta de redução de emissões de gases do efeito estufa, assim como foi convidado pela presidência da Cúpula do Clima deste ano (COP-29) para intermediar as demandas dos países ricos.

Não se trata aqui de França, Alemanha ou outro forte integrante da União Europeia. Mas, sim, do Reino Unido, que utilizou largamente os termos "liderança" e "empregos verdes" ao longo de toda a conferência da Organização das Nações Unidas (ONU), descrevendo-se como futura superpotência de energia limpa.

A mudança também é marcada pelo novo governo britânico. Diferentemente do seu antecessor, Rishi Sunak — político conservador criticado por liberar a exploração de combustíveis fósseis no Mar do Norte — Keir Starmer assumiu como primeiro-ministro, em julho, com uma sucessão de ações e anúncios em resposta à crise climática.

Essa lista inclui, dentre outras medidas, o fechamento da última mina de carvão do país, a proibição de novos poços de exploração de petróleo, a liberação de usinas de energia eólica terrestres, a criação de uma estatal de energia limpa, o lançamento de projetos de captura de carbono, investimentos em hidrogênio verde e a ampliação de incentivos para energias renováveis.

Em seu discurso a outros representantes de nações, na COP, Starmer ressaltou que centenas de milhares de britânicos poderão ser atingidos por inundações, maior instabilidade econômica e insegurança nacional caso o aquecimento global ultrapasse os 1,5ºC. Encerrou dizendo que "o Reino Unido liderará o caminho, irá liderar a Grã-Bretanha e o mundo para um futuro mais limpo, mais seguro e mais próspero para todos".

A declaração pública também mencionou a meta de redução de emissões, de 81% até 2035 em relação aos números de 1990. A promessa anterior, de 2021, era de 78%.

A proposta foi elogiada por uma parte das organizações locais, como WWF-UK e WRI, por seguir a indicação do conselho especializado do país e ser "um exemplo de liderança". Embora tenha sido anunciada, a meta (NDC na sigla em inglês) ainda será formalmente detalhada até o ano que vem.

Com um resultado criticado, não apenas pelo valor de financiamento climático definido, mas também pelas reclamações oficiais de diversos países em desenvolvimento (como Chile, Índia e Bolívia) de que não foram ouvidos adequadamente, a própria efetividade de que lideranças ambientais consigam "liderar pelo exemplo" foi posta em xeque. Nesse cenário, o Reino Unido foi questionado por uma parte das organizações ambientais, até por não ter se posicionado tão enfaticamente como o Canadá, por exemplo.

Após a decisão, o secretário de Segurança Energética e Net Zero britânico, Ed Miliband, declarou que foi um "crítico acordo de última hora para o clima". "Não é tudo o que nós ou outros queríamos, mas é um passo em frente para todos nós", disse.

Além disso, na quinta-feira, 21, o Reino Unido participou de um evento da Beyond Oil & Gas Alliance (BOGA), aliança de países pela extinção da produção dos combustíveis fósseis, durante evento na Cúpula do Clima. O país também divulgou um acordo de cooperação com os Estados Unidos nesta COP, para desenvolvimento de energia nuclear.

O país tem sofrido com ondas de calor, tempestades, enchentes, queimadas, grandes nevascas e outros extremos climáticos. Por suas características territoriais, também está especialmente vulnerável ao avanço e outras alterações do mar.

No ano passado, por exemplo, alguns trechos do Oceano Atlântico no entorno do Reino Unido e da Irlanda foram impactados por uma onda de calor marinha, classificada como extrema e, em alguns lugares, "além do extremo", com a temperatura do mar cerca de 5ºC acima da média, como destacou o mais recente relatório da Organização Meteorológica Mundial, veiculado no início de 2024.

Até mesmo a família real tem buscado se associar à agenda climática. O rei Charles e o príncipe William participaram de eventos recentes sobre essa temática.

Ademais, a própria página oficial da monarquia britânica tem ressaltado que Charles tem alertado sobre os perigos da poluição por plásticos desde os anos 1970, quando tinha 21 anos. Diferentemente do ano passado, contudo, ele não foi à COP de Baku.

Aproximação com o Brasil

Os pavilhões do Brasil e do Reino Unido estavam lado a lado durante a COP-29. Para além da vizinhança de espaços onde realizaram dezenas de atividades, ambos tiveram reuniões bilaterais, ações conjuntas e diversas aproximações antes e durante a conferência.

Ao Estadão, a representante especial de clima do Reino Unido na COP-29, Rachel Kyte, confirmou a aproximação entre os dois países. "O Brasil é efetivamente um líder. E estamos juntos na nossa ambição", disse. "Nós vamos ajudar o Brasil a fazer a COP que precisamos", afirmou. A declaração ocorreu em um contexto de dificuldades de avanço nas negociações da conferência atual, realizada em Baku, no Azerbaijão.

Sede da COP-26, de Glasgow, o país se colocou à disposição para passar experiência para o Brasil, que será o anfitrião do evento no ano que vem, em Belém. A cúpula de 2025 tem grande expectativa entre lideranças e ambientalistas, assim como pelo simbolismo de ser realizada em um estado amazônico.

Para Stela Herschmann, especialista em política climática do Observatório do Clima, a postura britânica ao estimular propostas mais ambiciosas de outros países na preparação da COP-26 pode inspirar o Brasil. "Viajaram o mundo inteiro fazendo 'NDC diplomacy' (meta de redução de emissões, cuja nova deverá ser entregue no ano que vem), instigando as partes a fazerem o seu melhor", aponta.

Na Cúpula do G-20, no Rio, o premiê britânico e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se encontraram pela segunda vez neste ano. O desenvolvimento econômico sustentável e o combate às mudanças climáticas estiveram entre os principais temas tratados em ambos os encontros.

No encontro mais recente, nesta semana, os dois países lançaram juntos a Aliança Global de Energia Limpa. O grupo também é formado por França, Noruega, Chile, Colômbia, Tanzânia, Emirados Árabes Unidos e Alemanha. O premiê britânico ainda teve uma série de agendas no País.

Além disso, o Brasil teve atividades variadas com representantes do Reino Unido na COP-29. No penúltimo dia do evento, por exemplo, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, teve reuniões bilaterais com apenas quatro representantes de governo. Dentre eles, estava o secretário de Segurança Energética e Net Zero do Reino Unido, Ed Miliband.

Já um painel com representantes de ambos os países discutiu as NDCs anunciadas por ambos nesta COP (apenas Emirados Árabes Unidos também apresentou). Na ocasião, a secretária de Mudança do Clima do Brasil, Ana Toni, reafirmou a aproximação dos dois países. "O Brasil e, tenho certeza, o Reino Unido também, quer liderar pelo exemplo", disse.

Nesse aspecto, considera positiva a sinalização com a nova NDC e o discurso enfático na COP-29. Para ela, contudo, diante da responsabilidade histórica britânica como berço da Revolução Industrial, ainda mais poderia ser feito.

Dentre novas medidas que poderiam ser tomadas, a ambientalista menciona maior investimento na proteção da biodiversidade e restrição da pesca industrial, assim como significativo financiamento público para países em desenvolvimento. "O Reino Unido tem uma forte responsabilidade histórica, e isso significa que precisa avançar e abrir caminhos", defende.

Consultora de diplomacia climática, Alexandra Scott avalia que, em períodos mais recentes, o Reino Unido tem um histórico significativo de ações climáticas no âmbito nacional. Nesse caso, menciona impostos de carbono e reduções de emissões. Há quatro anos, uma decisão judicial no país também virou notícia mundial por reconhecer a poluição do ar como uma das causas da morte de uma criança londrina.

"É o lugar de nascimento da Revolução Industrial, onde começou a disparada das emissões de carbono, que estão causando a crise", avalia. Para ela, a aproximação de Brasil e Reino Unido na política climática pode ser "game-changer". "Há uma grande chance dos dois países realmente liderarem essa ambição climática", diz.

Já a diretora executiva do Climate Action Network Reino Unido (CAN-UK), Catherine Pettengell, destaca que o atual governo está há poucos meses no poder, mas reconhece que houve uma mudança significativa no discurso e uma clara intenção de priorizar ações climáticas nacional e internacionalmente.

"Há razões para ser otimista", considera. Também menciona que o país cumpriu o seu dever ao trazer as principais lideranças para a COP.

Ela pondera, contudo, que há muito ainda a ser feito, inclusive em relação a países em desenvolvimento, assim como na retomada de políticas de financiamento climático enfraquecidas no governo anterior. "O Reino Unido tem responsabilidade e capacidade para avançar mais e rapidamente e prover mais recursos para o Sul Global agir contra as mudanças climáticas", completa.

Além disso, há o entendimento de que o Reino Unido não cumpriu tudo o que prometeu em metas recentes e que precisa fazer mais. Em julho, mês da troca de premiê, o Climate Change Committee (que orienta decisões do governo) apontou que foi cumprido apenas um terço das reduções de emissões necessárias para que se atingisse a meta determinada até 2030. Por outro lado, reconheceu que os índices estavam com um terço do que era a média de 1990.

*A repórter viajou a convite do Instituto Clima e Sociedade

Estadão
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