Por que cientistas correm contra o tempo para 'descobrir' mais insetos no Brasil
Pesquisadores brasileiros estimam que número de espécies pode ser cinco vezes maior do que o mapeado até agora
Pesquisadores brasileiros enfrentam desafios para classificar a imensa gama de insetos do país, que representam 73% das espécies registradas, mas, segundo estimativas, podem chegar a 500 mil.
Pesquisadores brasileiros enfrentam desafios para classificar a imensa gama de insetos do país. Só hoje, estes animais representam 73% das 125 mil espécies registradas no Brasil. Ainda que já pareça muito, está longe da realidade, já que, de acordo com estimativas de cientistas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), se todas as espécies de insetos brasileiros fossem identificadas, a quantidade saltaria quase cinco vezes, o que resultaria em cerca de 500 mil.
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No entanto, os grupos de cientistas que vão a campo para coletar materiais e estudar esses animais fazem um alerta não só para a importância de catalogar espécies, mas também para o ritmo de trabalho: "é uma tarefa realmente muito urgente que precisa ser feita não só para os insetos, mas para todos os elementos da nossa fauna e da nossa flora", explica o professor Gabriel Augusto Rodrigues de Melo, do Departamento de Zoologia da UFPR.
"Os insetos formam a base da alimentação de diversos grupos de animais, principalmente aves, mamíferos e peixes. Eles, por sua vez, são elementos fundamentais para os nossos ambientes e a manutenção deles. Esses animais estão envolvidos em vários processos, como a reprodução das plantas, principalmente dispersão de sementes, e também são fundamentais para a manutenção de um meio ambiente saudável. Podemos citar também o papel fundamental que os insetos têm na polinização, principalmente as abelhas, as mariposas, borboletas, vários grupos de besouros", começa o professor.
Em entrevista ao Terra, Melo, que é corresponsável pela coordenação do livro Insetos do Brasil — Diversidade e Taxonomia, afirma que faltam profissionais especialistas em diferentes grupos de insetos no Brasil, o que desacelera o trabalho. "Mas eu posso dizer, que nos últimos 20 anos, com a expansão do sistema de pós-graduação, nós tivemos um estímulo relativamente considerável para que novas pessoas ingressassem nessa carreira".
A obra, feita em parceria com o também professor da UFPR Claudio José Barros de Carvalho e relançada este ano, levou dez anos para ser elaborada e descreveu todos os insetos brasileiros descobertos até então. "Nosso principal desafio foi poder contar com especialistas nessa área e que tinham domínio e conhecimento dos diferentes grupos de insetos e que pudessem trazer informações mais precisas sobre a diversidade presente no País. Nós já tínhamos tido esse problema na primeira edição", continua Melo.
"Um caso bem interessante foi a descrição de uma espécie em 2013 e que, portanto, não estava incluída na primeira edição do livro. É uma espécie nova da família Meropeidae, que foi descoberta nas florestas do Espírito Santo e que representou algo muito extraordinário para a gente. Porque representava a descoberta da presença no Brasil de uma família extremamente rara e com pouquíssimos representantes em outras regiões do mundo (com um nos Estados Unidos e um na Austrália). Posso dizer que é um excelente exemplo de como que a gente ainda tem muito a descobrir sobre a nossa fauna", pontua.
Hoje, problemas já conhecidos na época em que a primeira edição do livro foi lançada, dez ano atrás, continuam: fatores de ameaça para a fauna brasileira e, principalmente, a degradação ambiental. "A gente sempre fala bastante da degradação da Mata Atlântica e das florestas na Amazônia, mas tem acontecido de maneira acelerada também no cerrado e na caatinga. Esses são biomas também extremamente importantes e que possuem uma diversidade muito rica".
Para que o trabalho de catalogação siga sendo realizado da melhor maneira possível, Melo acredita que políticas precisem ser intensificadas para garantir que as espécies sobrevivam.
"As iniciativas mais importantes para a proteção da nossa fauna de insetos e também, claro, de outros elementos da nossa fauna e da nossa flora, é a criação de unidades de conservação que permitam a sobrevivência dessas populações naturais representativas da nossa biodiversidade. (...) A quantidade de focos de incêndios que ocorreram (em 2024) mostra a falta de preparo que a gente tem para combatê-los. Muitos deles atingiram as unidades de conservação e levaram a uma perda significativa de áreas naturais exatamente nos locais onde isso não deveria ter acontecido", critica.
Segundo o professor, os insetos são bons indicadores das condições ambientais e muitos deles fornecem indicação mais refinada quando comparados com outros grupos animais, como mamíferos. "São muitos os estudos de impacto ambiental, com levantamentos que incluem grupos de insetos, mas não vemos essa informação sendo levada em consideração".