Amazônia vê desmate cair 34%, mas Cerrado tem alta. Por que risco de incêndio é maior este ano?
Dados dos primeiros seis meses de 2023 foram divulgados nesta quinta; apesar da reversão na derrubada da floresta, aumento de queimadas, associado ao El Niño, preocupa
O desmatamento na Amazônia caiu 33,6% no primeiro semestre de 2023, ante o mesmo período do ano passado, segundo dados do Deter, sistema de alertas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), ligado ao Ministério da Ciência. Apesar da reversão da derrubada da floresta, a região enfrenta uma alta de incêndios.
Já no Cerrado, houve aumento de 21% em seis meses, também conforme o Deter. Se considerar só a comparação de junho com o mesmo mês do ano passado, houve queda de 41%, após uma alta expressiva em maio. Bahia, Maranhão e Tocantins são os Estados com as maiores perdas no semestre.
Segundo João Paulo Capobianco, secretário executivo do Ministério do Meio Ambiente, "o esforço de reverter a curva de crescimento" de destruição da floresta foi atingido. "Se vamos conseguir redução que compense a herança do ano anterior, ainda não sabemos, mas atingimos o primeiro objetivo que foi reverter a tendência de alta e agora temos claramente demonstrada uma tendência de queda."
Entre os nove Estados da Amazônia Legal, só o Mato Grosso registrou alta no desmate (7,1%). No Amazonas, houve queda de 55,2%. O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), na campanha e em fóruns internacionais, se comprometeu a zerar o desmatamento até 2030.
Nos últimos quatro anos, o Brasil ficou isolado nos fóruns ambientais por causa da postura da gestão Jair Bolsonaro (PL), que negava as mudanças climáticas e enfraqueceu os órgãos ambientais. Após a eleição de Lula, a comunidade internacional tem sinalizado com a intenção de retomar laços com o Brasil e repassar verba para ações de preservação da floresta. Nesta semana, a Suíça anunciou que vai aderir ao Fundo Amazônia, programa que recebe doações estrangeiras em prol do bioma.
Fogo e Cerrado preocupam
Também conforme os dados do Inpe, a floresta (3.075 focos) e o Cerrado (4.472) tiveram em junho o maior número de queimadas desde 2007. Especialmente no caso da floresta, os resultados preocupam porque auge da estiagem na região ainda não chegou. A fase seca vai de maio a setembro, e julho é ser um dos meses mais críticos.
Além disso, especialistas preveem que o total de incêndios florestais cresça ainda mais com a atuação do fenômeno El Niño, que começou em junho.
"Diferentemente de outros países, onde há incêndios naturais, na Amazônia tem incêndio oriundo do desmatamento, de atividade humana. A melhor forma de combater os incêndios é combatendo o desmatamento. E é isso que estamos fazendo", afirmou a ministra Marina Silva.
"Agimos reativamente, quando o incêndio está acontecendo, mas o correto é a ação preventiva, controlando o desmatamento, evitando que se crie um processo de matéria orgânica que vai sendo ressecada num determinado tempo", acrescentou ela.
Presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho disse estar reestruturando o Sistema Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (PrevFogo). Segundo ele, 2101 brigadistas já foram contratados, além da criação de 99 brigadas. Segundo ele, a maior parte dos focos de incêndio está ligada à atividade humana.
No Cerrado, houve aumento de 21% no semestre, mas o governo também destacou a redução de 14,6% no recorte do mês de junho.
"Não podemos identificar interrupção da curva de crescimento. Mas esse primeiro resultado de redução, somado à parceria que vem crescendo muito nos Estados, animam no sentido de que seja possível fazer essa reversão (da curva de desmatamento)", afirma Capobianco.
"No Cerrado, o percentual autorizado e autorizável de desmatamento é muito maior do que na Amazônia. A estratégia tem que ser diferente. Primeiro, os Estados têm muito mais poder e responsabilidade sobre o desmatamento, porque ele pode autorizar e por autorizar, tem a responsabilidade de fiscalizar", diz o secretário extraordinário de Controle do Desmatamento e Ordenamento Ambiental Territorial, André Lima.
Legislação europeia e crise climática influenciam cenário
Para o pesquisador de Estudos Avançados da USP, Carlos Nobre, a nova linha de ação do governo, que prometeu punir crimes ambientais, e a a mudança na legislação europeia podem ter contribuído para o cenário. Em dezembro do ano passado, a União Europeia aprovou novo marco legal para restringir o comércio de produtos oriundos do desmatamento de florestas. A regra, porém, não incluiu o Cerrado.
Segundo Nobre, climatologista, os próximos meses serão desafiadores. "Devido às mudanças climáticas, o planeta está ficando mais quente e há mais risco do fogo queimar a vegetação. No 2º semestre, vamos ter o El Niño e há 60% de probabilidade de que ele seja muito forte, sobretudo em setembro, um dos meses com mais queima na Amazônia", diz.