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COP-27: Como Putin e a Guerra da Ucrânia complicam a Conferência do Clima no Egito?

Invasão da Ucrânia virou entrave a avanços no combate ao aquecimento global e recursos para adaptação e mitigação seguem abaixo do planejado; conferência começa neste domingo

6 nov 2022 - 05h10
(atualizado às 08h10)
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Vladimir Putin é o atual presidente da Rússia.
Vladimir Putin é o atual presidente da Rússia.
Foto: EPA / Ansa - Brasil

Olhando para o copo meio cheio, a expectativa internacional é de que a Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-27), que começa neste domingo, 6, em Sharm El- Sheikh, no Egito, seja a COP da justiça climática e da implementação dos acordos, a hora de trocar a retórica pela ação. Olhando para o copo do jeito que realmente está, no entanto, apontam especialistas, deve ser uma COP marcada pelas consequências da Guerra na Ucrânia e pela trava no financiamento para a adaptação e a mitigação do aquecimento global nos países em desenvolvimento.

O conflito na Ucrânia fez com que o mundo ocidental impusesse bloqueios econômicos à Rússia, um dos maiores responsáveis pelo fornecimento de petróleo e gás para a Europa. O resultado foi a retomada da exploração de combustíveis fósseis no continente que liderava tradicionalmente a discussão sobre o uso de fontes renováveis.

Apesar de previsto desde 2015, pelo Acordo de Paris, o financiamento para os países em desenvolvimento nunca chegou ao nível mínimo de US$ 100 bilhões por ano como foi definido. O último relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), no entanto, aponta que este valor nunca foi atingido. Em 2020, US$ 83,3 bilhões foram repassados por países desenvolvidos, valor 4% maior em relação a 2019, mobilizado principalmente por fundos públicos, mas ainda insuficiente para atingir o estipulado.

Para o ex-embaixador Rubens Barbosa, colunista do Estadão, a retórica sobre os problemas relacionados ao clima e ao meio ambiente devem continuar e alguns acordos podem ser anunciados, mas não se pode esperar muito além. "Os US$ 100 bilhões nunca aconteceram e não devem acontecer agora", afirma.

Mas, se o aquecimento global é um problema que atinge a todos e não pode ser evitado sem que medidas drásticas como o corte de emissões de gases do efeito estufa sejam tomadas, por que essas questões não são resolvidas de uma vez?

Um dos problemas em relação à questão das perdas e danos, por exemplo, é que para as nações ricas isso corresponde a assumir um passivo histórico de emissões e estabelecer um compromisso financeiro com os países em desenvolvimento que elas tentam evitar. Como a COP é, além da cúpula do clima, um tabuleiro geopolítico em que as nações se medem e tentam fazer valer interesses, é preciso muita negociação antes de um consenso. Assim, é importante saber como chegam os principais países para o encontro.

Estados Unidos

Será a segunda COP do governo do democrata Joe Biden. Após comparecer à abertura da COP-26, na Escócia, e dizer em discurso que "Glasgow deve ser o pontapé inicial de uma década de ambição e inovação para preservar nosso futuro comum", no Egito os EUA devem cobrar dos países em desenvolvimento que apresentem metas claras sobre o que estão fazendo e tentar contornar o impulso ao uso dos combustíveis fósseis pós-invasão da Ucrânia, comandada pelo líder russo, Vladimir Putin.

Em setembro, na Assembleia-Geral da ONU, Biden afirmou que o governo americano tem liderado a agenda climática de forma "ousada", desde que tomou posse, e ressaltou os compromissos do país com o Acordo de Paris (do qual Donald Trump havia retirado os EUA) e o pacote contra inflação que incluiu pela primeira vez na história americana o compromisso de promover o uso de energia limpa.

Para quem espera que o país se comprometa com o financiamento climático, no entanto, o resultado pode ser frustrante. Dois dias após o início da COP, os americanos terão as eleições de meio de mandato. "Já está ocorrendo uma reação muito forte à agenda ESG com os republicanos. Há uma contradição entre a retórica e a prática", afirma Barbosa.

União Europeia

O bloco europeu deverá chamar os cerca de 200 países que participam da COP a tomarem medidas urgentes para reduzir as emissões de gases geradores do efeito de estufa e respeitar os compromissos assumidos no Acordo de Paris e em Glasgow. No entanto, entre a Escócia e o Egito, a invasão da Ucrânia mudou o cenário no continente.

No primeiro semestre de 2022, o consumo de carvão na Europa aumentou cerca de 10% para suprir os cortes de fornecimento ao gás natural russo e deve continuar subindo. Na véspera do inverno no Hemisfério Norte, a ameaça de cortes de energia e racionamento segue rondando. Itália, Grécia, Alemanha, Holanda e Hungria fizeram anúncios que, de diferentes formas, incentivam o uso de carvão.

A questão do financiamento também não deve encontrar receptividade além da retórica no bloco, fustigado pelos efeitos da guerra. "Haverá uma dificuldade de levar a questão do financiamento adiante", diz Barbosa.

Brasil

"No meio disso tudo, vai aparecer por lá o Lula e o Brasil vai voltar a ter um pouco de destaque", afirma o ex-embaixador sobre o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva. O soft power nacional no tema é reconhecido e essa será uma oportunidade de retomar o posto.

O País terá um estande oficial no evento, mas os olhos do mundo estarão mais voltados mesmo para o futuro presidente. "A importância da presença dele está na necessidade de catalisar as agendas ambiental e social", diz a ex-ministra do Meio Ambiente nas gestões petistas Izabella Teixeira - conselheira da COP-27. "Lula é uma voz estratégica."

A presença dele, porém, não apagará resultados negativos sucessivos nas taxas de desmate da Amazônia. Hoje, o País é visto com desconfiança e repúdio internacional e do atual governo pouco ou nada se espera. Da futura gestão, o nome do próximo ministro e o detalhamento da política climática transversal podem surgir. E é esperado que o País tenha a partir de 2023 uma secretaria de mudanças climáticas.

China

O maior emissor de dióxido de carbono do mundo chegará à COP com menos protagonismo e, novamente, em meio a disputas geopolíticas com os Estados Unidos. Dessa vez, a relação deve ser ainda mais complicada, fragilizada pelas recentes tensões causadas pelo apoio dos EUA a Taiwan, território reclamado pelos chineses.

Em Glasgow, a China se recusou a assinar o pacto pela eliminação do uso de carvão, o que não deve mudar neste ano, e não garantiu a entrada no pacto pela redução de emissão de metano. O anúncio conjunto com os EUA para aumentar suas ambições climáticas, no entanto, surpreendeu o mundo.

Neste ano, os observadores internacionais esperam que os chineses invistam mais na comunicação de avanços internos. O País que se comprometeu a atingir o pico de emissões até 2030 e neutralizá-las até 2060 desenvolve políticas verdes como o subsídio a fábricas de veículos elétricos e incentivos à transição energética.

Estadão
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