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Cúpula da Amazônia: Petro reforça linha diferente de Lula e ataca uso de combustível fóssil

Presidente colombiano, que está em Belém, diz que 'esquerda deve seguir a ciência'. Declaração ocorre em meio à controvérsia do governo petista sobre exploração na foz do Rio Amazonas

8 ago 2023 - 13h50
(atualizado às 15h42)
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O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, reforçou sua posição crítica ao uso de combustíveis fósseis e à exploração de petróleo na área da Amazônia, classificando de "negacionismo" medidas adotadas no sentido oposto. Na abertura da Cúpula da Amazônia, em Belém, nesta terça-feira, 8, Petro destacou que "as forças progressistas deveriam estar sintonizadas com a ciência". A posição colombiana ocorre em meio à controvérsia brasileira sobre a exploração na foz do Rio Amazonas.

"As direitas têm essa fonte de escape muito fácil através do negacionismo, de negar a ciência. Para os progressistas, é muito difícil, então isso gera outros tipos de negacionismos que é: vamos postergar as decisões", disse Petro. "'Ah, mas porque o aparato econômico, o desenvolvimento nacional', ou seja, tudo baseado no negacionismo, e que vai postergando as decisões essenciais para a vida", acrescentou.

Entre os países amazônicos, a Colômbia é o que mais se destaca na preservação da floresta. Após anos de aumento do desmatamento no governo do ex-presidente Iván Duque, a taxa de perda de cobertura florestal vem caindo. A pecuária e o plantio ilegal de coca são dois vetores que continuam a forçar a resistência do bioma.

Diferentemente do Brasil, no entanto, que passou a discutir a exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas, a Colômbia discute um plano progressivo para pôr fim à exploração desse tipo na floresta. Em Belém, a expectativa é de que se alie ao Brasil e também assuma o compromisso de desmatamento zero até 2030.

"Estamos às margens da extinção da vida e é nesta década que devemos tomar decisões. Somos nós, os políticos, que devemos tomar essas decisões. Nós e talvez durante esse tão rápido período presidencial que temos. O que estamos fazendo além dos discursos como esses?", acrescentou o presidente colombiano em Belém.

Petro acrescentou que os interesses econômicos estão na raiz das posições políticas sobre a crise climática, o que prejudica o sucesso de encontros como a Cúpula do Clima. "A política não consegue se destacar dos interesses econômicos que derivam do capital fóssil. Por isso, a ciência se desespera (...), vendo na política uma espécie de muro silencioso que não pode atuar. Por isso, as COPs fracassam."

Para Petro, as medidas precisam ir além do desmatamento zero, como pregado por Lula. O brasileiro quer atingir a meta até 2030. A Colômbia, aponta o presidente colombiano, "já experimentou isso antes com o presidente anterior, ele já se comprometeu em 2020 ao desmatamento zero". "O desmatamento desse ano comparado com o anterior reduziu em 70% no nosso país, é um certo êxito."

Petro propôs ainda a formação de um tribunal de justiça ambiental multilateral para julgar crimes contra a Floresta Amazônica. Ele sugeriu a formulação de um tratado "militar e judicial" conjunto para fortalecer a cooperação na região, inclusive em áreas como combate ao desmatamento. Defendeu também uma reforma do sistema financeiro global, que reduza a dependência da emissão de carbono. "O que o planeta está nos dizendo é que agora é o momento de mudar o sistema econômico - e muito, em profundidade", disse.

Exploração na foz do Amazonas desencadeou crise no governo Lula

O ministro de Minas e Energia do Brasil, Alexandre Silveira, defendeu nesta segunda-feira, 7, em Belém, que a Petrobras possa investigar se há petróleo na Margem Equatorial, que vai do Rio Grande do Norte ao Amapá, a cerca de 500 quilômetros da foz do Rio Amazonas. De acordo com Silveira, a população tem "direito" de conhecer os recursos disponíveis no País.

A negativa do Ibama à Petrobras para perfurar o local em busca de petróleo gerou uma crise no governo, opondo a área ambiental e a pasta de Minas e Energia. "Eu não tenho aposta, tenho uma convicção de que todos os brasileiros e brasileiras têm o direito de conhecer as suas potencialidades minerais seja de petróleo, gás, seja dos minerais críticos das terras raras", afirmou o ministro.

A exploração de petróleo na Amazônia tem sido um dos temas dominantes nas conversas que antecederam a Cúpula da Amazônia. A ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Susana Muhamad, defendeu que os países da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) elaborem um plano progressivo para pôr fim à exploração do recurso no território.

Lula fala em desenvolvimento que alie proteção e empregos

Mais cedo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriu a cúpula defendendo um modelo de desenvolvimento que combine proteção ambiental e geração de empregos. "Vamos discutir e promover uma nova visão de desenvolvimento sustentável e inclusivo na região, combinando a proteção ambiental com a geração de empregos dignos e a defesa dos direitos de quem vive na Amazônia", disse.

O presidente destacou a importância de fortalecer a OTCA e lembrou que desde a assinatura do Tratado de Cooperação da Amazônia, em 1978, os chefes de Estado só tinham se reunido três vezes. De acordo com Lula, a reunião fortalece os países para negociar no contexto global.

Lula destacou que, para resolver os problemas da região, "precisamos reconhecer que ela também é um lugar de carência socioeconômica histórica". "Não é possível conceber a preservação sem reconhecer os múltiplos problemas estruturais que ela enfrenta." O presidente brasileiro voltou a falar em financiamento bancado pelos países ricos.

Parlamento Amazônico

A Declaração de Belém vai incluir a criação de um grupo de trabalho para analisar a vinculação do Parlamento Amazônico (Parlamaz) à Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, fortalecendo o poder do grupo.

Criado em 1989 para dar suporte legislativo ao Tratado de Cooperação, sem vinculação formal à OTCA, o Parlamaz ficou inativo a partir de 2012. Em 2020, os trabalhos do grupo foram retomados sob coordenação do senador Nelsinho Trad. O parlamentar participou nesta terça-feira da abertura da Cúpula da Amazônia, em Belém.

"O trabalho do Parlamaz está associado à necessidade de que nossas casas legislativas juntas enfrentem esses problemas e apontem as soluções. Há que se ter um trabalho de transversalidade entre os países para que unindo as forças possamos enfrentar os complexos e difíceis problemas que existem no território amazônico", disse o senador.

Bolívia cobra países industrializados

O presidente boliviano, Luis Arce, pontuou o papel mundial no combate às mudanças climáticas. "O fato de a Amazônia ser um território importante não implica que os efeitos da crise climática tenham que recair nas nossas mãos e nas nossas economias, porque essa crise climática mundial não foi gerada por nós. São esses os países (em referência aos países industrializados) que têm que contribuir em maior medida para a solução desse problema, portanto é importante reafirmar nossos compromissos com princípio de equidade e justiça climática."

A presidente do Peru, Dina Boluarte, defendeu que a Cúpula de Belém seja um divisor de águas na atuação dos países amazônicos e se disponibilizou a contribuir com o Brasil para a organização da COP-30 em Belém. O Peru já sediou a Conferência do Clima, em 2014. Boluarte também aproveitou para convidar Lula para uma visita ao Peru.

"Estamos aqui para propor e iniciar nessa Cúpula abrir novos espaços de pariticipação como rede de povos indígenas e comunidades locais, um foro de diálogo para cidades amazônicas, bem como ações conjuntas para proteger as pessoas e as entidades defensoras dos direitos humanos e do meio ambiente", afirmou.

A Venezuela se alinhou ao Brasil e também propôs adoção de meta para zerar o desmatamento. A vice-presidente da Venezuela, Delcy Rodríguez, afirmou que acabar com a derrubada da floresta é urgente.

"Acho que isso precisa ser abordado com urgência e esse plano de desmatamento zero deve nos permitir mapear as áreas críticas para atingir uma taxa zero de desmatamento, para entender a real causa da emissão de gases de efeito estufa e para promover alternativas econômicas realistas. O presidente Lula disse ontem que nossa região não é um santuário, a nossa região precisa de um desenvolvimento econômico em harmonia, soberano e ecológico", disse. /COLABORARAM ANDRÉ MARINHO E EMILIO SANT'ANNA

A repórter viajou a convite do Instituto Clima e Sociedade

Estadão
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