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Desmatamento em florestas protegidas da Amazônia aumenta 40% em um ano

Devastação foi mais intensa em unidades de conservação do bioma do que na Amazônia Legal como um todo, indicam dados do Inpe analisados pelo WWF-Brasil; Defesa afirma ter feito mais de 24 mil patrulhas na floresta

31 ago 2020 - 23h01
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O avanço do desmatamento nas unidades de conservação da Amazônia no último ano - que, por lei, deveriam ser mais protegidas de devastação - foi ainda pior que na floresta como um todo. As perdas registradas nas áreas protegidas do bioma atingiram 1.008 km² entre agosto de 2019 e julho deste ano, alta de 40% em relação aos 12 meses anteriores. Os dados são do sistema Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, e foram analisados pela organização WWF-Brasil.

Já os alertas para a Amazônia Legal como um todo foram de 9.215 km², 34,5% superiores aos observados entre agosto de 2019 e julho de 2020. A devastação nas unidades de conservação (UCs) representou 11% do total e, pela segunda vez consecutiva em dez anos, superou a marca de 1.000 km².

Os dados foram revelados em uma análise feita sobre os dados do Deter, o sistema em tempo real do Inpe que faz alertas de onde o desmate está ocorrendo para orientar as fiscalizações. O número oficial do desmate é fornecido por outro sistema, o Prodes, que deve ser divulgado em novembro. Procurado, o Ministério do Meio Ambiente não se manifestou.

Em geral, quando saem os números finais, o Prodes revela que a perda foi ainda maior. De agosto de 2018 a julho de 2019, o Deter havia indicado uma perda de 6.844 km². Meses depois, o Prodes fechou em 10.129 km².

Nas unidades de conservação, o Deter tinha indicado desmate de 682 km², e o Prodes revelou que haviam sido perdidos, na verdade, 1.100 km². Conforme o levantamento do WWF, a maior parte da derrubada de florestas protegidas se concentrou em dez unidades.

Juntas elas representaram 86% das perdas. A Área de Proteção Ambiental (APA) Triunfo do Xingu, no Pará, lidera, com 406 km² devastados. Ela é seguida pela Floresta Nacional do Jamanxim, também no Pará, e pela Reserva Extrativista Jaci-Paraná (RO), ambas com cerca de 108 km² de perda.

"(Esse) desmatamento não é decorrente de atividades lícitas de manejo florestal ou de abertura de áreas agrícolas por comunidades locais. Pelo contrário, são derivadas de intensos processos de invasão e grilagem por grupos organizados, turbinados pela expectativa de regularização anunciada pelo governo federal, que chegou a enviar ao Congresso Nacional a MP 910 (apelidada de MP da grilagem)", aponta a nota técnica do WWF.

"Os dados nos passam duas mensagens importantes. A primeira é que mostra que a ferramenta de proteger a floresta em unidades de conservação é algo que funciona. São mais de 200 áreas protegidas na Amazônia e a maior parte do desmatamento está concentrada em dez delas. A maioria delas tem conflitos que precisam ser resolvidos. Isso não resolve só com fiscalização. Pode diminuir enquanto fiscais estiverem lá, mas vai voltar a acontecer se não fizer governança das áreas, regularização fundiária", diz Mariana Napolitano, gerente de ciências do WWF.

Na sexta-feira, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, anunciou que Ibama e ICMBio paralisariam as operações de combate ao desmatamento por causa do bloqueio de recursos do setor. Horas mais tarde, a área econômica do governo federal disse que iria liberar o dinheiro, após a repercussão negativa.

"Por outro lado, como o desmatamento está concentrado em poucas áreas, que sempre aparecem entre as devastadas, não é difícil saber onde é preciso agir para conter o problema. Ver o aumento em UCs que têm problemas históricos também indica uma baixa efetividade do governo, inclusive da GLO", diz, em referência à Garantia da Lei e da Ordem, estabelecida em maio, que enviou as Forças Armadas para a Amazônia na Operação Verde Brasil 2, sob comando do vice-presidente, Hamilton Mourão.

"As UCs mais vulneráveis ao desmatamento atualmente estão localizadas em regiões com elevadas dinâmicas de mudanças no uso e cobertura da terra e sob influência de rodovias", aponta a nota técnica. É o caso da área de influência da rodovia federal BR-163 (Cuiabá-Santarém), entre Novo Progresso (PA) e o entroncamento com a rodovia BR-230. Nesta região encontram-se a Floresta Nacional e o Parque Nacional do Jamanxim e a Floresta Nacional de Altamira.

Defesa afirma que operações renderam R$ 445 milhões em multas

Procurado, o Ministério da Defesa disse que a Operação Verde Brasil 2 tem participação ampla e as decisões são tomadas com a anuência de todos os órgãos envolvidos. Reforçou que autuações e apreensões são de competência exclusiva dos órgãos ambientais e disse oferecer "suporte a todas as ações e compila todos os dados para subsidiar os tomadores de decisão na elaboração de políticas públicas no tocante à priorização e planejamento de novas ações.

Segundo a Defesa, trabalham na operação 2.090 mil pessoas por dia, entre militares e representantes de agências, além de 89 veículos e 18 embarcações. Até 24 de agosto, afirma, foram realizadas 24.372 inspeções, patrulhas, vistorias e revistas, d inutilizadas 253 máquinas de serraria. Também faz parte do balanço do ministério a apreensão de 676 embarcações, 211 veículos diversos, 372 quilos de drogas e 28.773 mil m3 de madeira, além de 1.526 multas, em um total de R$ 445 milhões. Procurada, a assessoria de imprensa de Mourão não se manifestou.

A pasta também informou que cruza alertas de desmatamento com outras bases de dados para rastrear atividades ilegais. Ainda conforme o ministério, os "relatórios contam também com investigação detalhada dos representantes dos órgãos policiais, que averiguam a cadeia produtiva envolvida com o crime ambiental".

Terras indígenas sofrem impacto do garimpo

O trabalho também avaliou os alertas do Deter em terras indígenas da Amazônia, que avançaram 6% entre agosto de 2019 e julho de 2020, após terem subido 118% no ano anterior. Mariana Napolitano, da WWF, diz que o maior problema tem sido o garimpo ilegal. Entre agosto de 2017 e julho de 2018, o desmatamento nessas áreas tinha sido de 147 km². Subiu para 321 km² nos 12 meses seguintes e para 341 entre agosto de 2019 e julho de 2020.

Após o desmatamento em área indígenas ter dobrado no ano passado, neste ano o ritmo se manteve quase estável, com avanço de 6%. Ações do Ibama em algumas TIs, como Ituna-Itatá (PA), conseguiram evitar nova alta, mas não foram capazes de reverter a tendência, uma vez que o índice de devastação nas unidades continua em patamar elevado.

Levantamento feito pelo Greenpeace especificamente sobre os dados do Deter de julho deste ano mostrou que 73% do desmatamento para a exploração de garimpo na Amazônia foi em UCs e em TIs. "Somente Itaituba e Jacareacanga, cidades localizadas na região do Tapajós, concentram 70% do desmatamento para garimpo na Amazônia brasileira. Essas cidades também são apontadas como os principais pontos de origem de ouro ilegal, sendo grande parte fruto da extração realizada dentro de áreas protegidas", diz trecho do relatório do Greenpeace.

No início de agosto, Ricardo Salles, sobrevoou com helicóptero do Ibama a TI Munduruku, em Jacareacanga. Foi feita operação no local com destruição de equipamentos. No dia seguinte, a Defesa suspendeu a operação, e Salles recebeu os garimpeiros em seu gabinete em Brasília. Eles foram levados para lá em avião da FAB. Mais tarde, na mesma semana, a operação foi novamente autorizada pela Defesa. /COLABOROU RENATA OKUMURA

Estadão
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