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Governo Bolsonaro estuda reestruturar Inpe, órgão que monitora a Amazônia

Diretor interino propõe redução de 15 para 4 coordenações; área que cuida de monitoramento de desmate pode ser reduzida

25 out 2019 - 06h17
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SÃO PAULO - O Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTIC) está estudando uma reestruturação do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão que esteve no centro de ataques do presidente Jair Bolsonaro no final de julho após virem à tona dados que indicavam uma alta de desmatamento da Amazônia.

Na semana passada, o diretor interino Darcton Policarpo Damião, que assumiu o posto após a exoneração de Ricardo Galvão, apresentou aos servidores uma proposta que modifica o funcionamento do instituto. Das 15 coordenações existentes hoje, que respondem diretamente à direção, Damião quer apenas quatro coordenações gerais, que responderiam pelos temas: ambiente, espaço e tempo e clima.

Damião é formado em Ciências Aeronáuticas na Academia da Força Aérea (AFA)
Damião é formado em Ciências Aeronáuticas na Academia da Força Aérea (AFA)
Foto: Miguel Ângelo/CNI/Divulgação / Estadão

O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), que hoje é um órgão independente, seria incorporado ao Inpe. Junto com a coordenação de Observação da Terra (responsável pelo monitoramento por satélite do desmatamento) e o Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos (Cptec), passaria a compor a nova Coordenação Geral de Monitoramento, Modelagem e Análise.

Servidores ouvidos pelo Estado em condições de anonimato disseram que não foram dadas explicações sobre como a nova estrutura funcionaria. Na reunião, cujo áudio a reportagem teve acesso, Damião disse que recebeu uma incumbência do ministro Marcos Pontes para fazer a reestruturação e indicou que ela já foi aprovada.

"Eu tive o sinal verde para falar sobre isso. Tenho convicção plena de que (a mudança) é para bem melhor", disse. "O ministro queria uma mudança, entreguei em três semanas [...] Missão dada é missão cumprida", afirmou.

O Estado apurou que os funcionários foram convocados apenas uma hora antes da reunião para ouvirem uma "mensagem importante" do diretor. Damião disse que nos cerca de dois meses no cargo se deparou com problemas de gestão. "Devemos ser gestores antes de serem cientistas", afirmou, comparando a estrutura do Inpe aos 39 ministérios da gestão Dilma Rousseff. "O mês só tem 22 dias úteis, tinha ministro que nunca via o presidente."

O diretor interino ainda relatou que observou nesse período uma "defesa de territórios que é perniciosa para a organização como um todo". Segundo ele, isso "às vezes funciona bem para o dono do feudo, para a turma. Mas vai além da necessidade de cooperação para a missão ser cumprida".

Representantes do Comitê Técnico Científico, colegiado consultivo do Inpe, questionam o fato de a proposta ser apresentada antes mesmo da escolha de um novo diretor permanente do Inpe. O grupo vinha trabalhando na sucessão desde que a crise com o órgão resultou na exoneração de Galvão.

O pesquisador deixou o cargo depois de algumas semanas de desgate com o presidente Jair Bolsonaro, que disse que dados sobre desmatamento eram mentirosos e que Galvão "estaria a serviço de alguma ONG". Galvão reagiu e disse, em entrevista ao Estado, que atitude de Bolsonaro era "pusilânime e covarde".

Pelo regimento do Inpe, tem de ser formado um comitê de busca, que vai indicar uma lista tríplice para a escolha de um novo diretor por parte dePontes. O conselho havia solicitado formalmente ao MCTIC a instalação desse comitê e aguardava os próximos passos. A apresentação da proposta de reestruturação "caiu como uma bomba" no grupo, conforme o Estado apurou, por não ter sido nem sequer consultado sobre as mudanças.

Os membros do próprio Inpe que compõem o comitê (formado também por mais seis pessoas de fora do instituto e dirigido pelo diretor) optaram por nem entrar no mérito da proposta em si por entenderem que "existe um erro que a antecede".

"Como diretor interino, portanto provisório, ele (Damião) tem a missão de tocar o instituto enquanto o comitê faz a busca. Como nessa condição interina ela passa menos de dois meses, num órgão tão complexo, e propõe ou impõe uma reforma tão complexa que vira de cabeça pra baixo o Inpe?", questionam. Eles dizem que a sucessão é prioritária e que só um diretor efetivo, escolhido de lista triplice, poderia iniciar uma reestruturação.

O Sindicato dos Servidores Públicos Federais na Área de Ciência e Tecnologia do Setor Aeroespacial criticou a proposta. "Tem muitas áreas no Inpe que estão abandonadas, que precisam de reestruturação. E eles vão reestruturar justamente a que dá mais certo, que tem mais protagonismo e tem maior influência sobre a opinião pública e no meio científico. Não é estranho isso?", aponta o órgão, comentando as mudanças que envolvem a área de monitoramento.

Em nota, o ministério disse que "a reestruturação do Inpe é um estudo em andamento, em que estão sendo levantados todos os dados e um diagnóstico sobre o aumento de eficiência e eficácia do instituto". A pasta informou ainda que "como está na fase inicial, não é correto afirmar absolutamente nada sobre a modificação da estrutura sem esse levantamento. Após a elaboração do estudo, o MCTIC analisará o que será apresentado".

O ministério também disse que "o Inpe tem relevante trabalho para o País e referência para o mundo em projetos e ações em pesquisa espacial, além de outras iniciativas" e que o "objetivo de uma possível restruturação será otimizar processos e reduzir o tempo de resposta para a sociedade".

Damião foi procurado pela reportagem, mas a assessoria de imprensa do Inpe afirmou que ele está viajando e só falará sobre a proposta na sua volta, no dia 29.

Ministro também é contra fusão de Capes e CNPq

O ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, disse na semana passada ser contra a fusão do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) com a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgãos de desenvolvimento da ciência do País. Pela proposta em estudo no governo federal, as duas agências ficariam sob poder do Ministério da Educação.

Criados em 1951, os dois órgãos têm funções distintas. A Capes tem a missão de aprimorar a formação de profissionais de ensino superior, por meio da pós-graduação, além de ajudar na qualificação de professores de ensino básico e solidificar a educação a distância no País. Já o CNPq se concentra em fomentar projetos de pesquisa, com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento científico e tecnológico do Brasil.

Estadão
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