Ascensão e queda de PotosÃ
Potosà é uma cidade com os dias contados. Deve durar não mais do que 50 anos, quando se esgotarem os últimos metais existentes na mina de Cerro Rico. Será, então, o fim triste e previsÃvel daquela que foi a maior, a mais rica e a mais importante cidade de todo o Hemisfério Sul por 200 anos. Localizada ao sul da BolÃvia, Potosà – só para se ter uma vaga idéia – era, durante a época colonial, maior do que Londres e Xangai (China), com mais de 200 mil habitantes. Vivia luxuosamente da até então inesgotável prata da mina, que, ironicamente, acabou quando a BolÃvia se declarou-independente da Espanha, em 1825. Hoje, o único recorde é o de ser a mais alta cidade do mundo, a 4.090 metros acima do nÃvel do mar. Em 1987, a Unesco declarou Potosà Patrimônio da Humanidade. Colonial As ruas estreitas e Ãngremes ainda conservam um pouco do charme colonial. Há construções imponentes, como a escultural Torre de La CompañÃa de Jesús, de 1707, erguida em estilo barroco mestiço pelos padres jesuÃtas. As 80 igrejas guardam, mesmo depois da pilhagem ocorrida no século 19, uma riquÃssima coleção de arte sacra deixada pelos fervorosos católicos espanhóis. Mas nada na cidade é mais impressionante do que uma visita à s últimas minas de Cerro Rico. Uma aventura que, seguramente, ficará para sempre na memória do turista que se aventurar. A mina de Cerro Rico, imponente ao fundo da cidade, era, literalmente, uma montanha de prata. A maior descoberta pelos gananciosos colonizadores espanhóis nas três Américas. Essa riqueza foi a base da economia espanhola e da extravagante monarquia, que ficava com 20% de tudo que dali era extraÃdo. Ninguém sabe ao certo a quantia de prata retirada. Uma lenda indÃgena diz que teria sido o suficiente para construir uma ponte ligando Potosà a Madri, e mesmo assim ainda sobraria um pouco. GenocÃdio Mas o preço da extração da "inesgotável" prata, entre 1545 e 1825, pode ser considerado um dos maiores genocÃdios da humanidade. Custou a vida de mais de 8 milhões de Ãndios sul-americanos e escravos, trazidos aos milhares da Ãfrica. Em 1572 foi editada a Ley de la Mita, que obrigava todos os Ãndios e escravos com mais de 18 anos de idade a trabalhar em turnos de 12 horas na mina. O detalhe é que cada pessoa era forçada a viver dentro da montanha por quatro meses, sem dela sair. Ao fim do perÃodo os poucos sobreviventes tinham os olhos vendados para não ficarem cegos ao contato com a luz solar. Ainda hoje, muitos mineiros morrem de silicose e de acidentes com explosivos. As minas que restaram ainda produzem. Prata, só 5% do total dos minérios retirados. Estanho, zinco, chumbo e cobre são extraÃdos por mineiros que trabalham em sistema de cooperativa. A atmosfera da mina é pesada e a temperatura chega facilmente a 40º C. Levando em consideração que Cerro Rico está a mais de 5 mil metros de altitude, a visita não é nada fácil. Use as piores roupas e não se importe em enfiar o pé na lama. Pelos corredores, que mais parecem caminhos de rato, trabalham milhares de homens usando o mesmo método da época colonial. Fura-se a pedra a golpes de marreta e lá se coloca uma banana de dinamite. O "combustÃvel" para o trabalho braçal de mais de oito horas é folha de coca. Aliás, tome chá de coca antes de ir para a mina e masque algumas folhas junto com os mineiros. Leve água e, se der, uma lanterna. Ao visitante é recomendável comprar um kit mina para distribuir aos mineiros. Num saquinho plástico vem, entre outras coisas, folhas de coca, cigarros sem filtro e uma banana de dinamite. Distribua aos poucos para os trabalhadores e histórias impressionantes sobre a mina serão contadas . Não deixe de visitar "el tio". Os mineiros, na porta da mina, cultuam o bem, simbolizado pela imagem de Jesus. No fundo da mina eles reverenciam o mal e preparam com barro uma imagem do diabo, à qual são ofertados cigarros, bebidas alcoólicas e outros presentes, como fetos de lhamas. Casa da Moeda Também não deixe de conhecer a Casa de la Moneda, uma construção de paredes largas onde se cunhavam moedas com a prata extraÃda da mina. Hoje, o local que ocupa um quarteirão ao lado da praça principal foi transformado em museu. Mas use roupas quentes: as paredes de pedra, com mais de um metro de largura, tornam o local uma verdadeira geladeira. Entre as igrejas de Potosà é obrigatória a visita ao Convento de São Francisco, o mais velho da BolÃvia, construÃdo em 1547, dois anos depois da fundação da cidade. Suba nos telhados e terá uma linda vista. Quando 2050 chegar, sairá em procissão pela cidade uma imagem de Cristo deixada por um desconhecido na porta do convento, em 1550. Programe-se, porque a estátua é retirada do altar apenas a cada cem anos. A próxima vez pode ser a última. VEJA TAMBÉM: » Copacabana revela alma boliviana » Cochabamba tem vocação para o prazer » As muitas histórias de La Paz » GUIA
Agência Estado
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