Região de Mata Atlântica serve de refúgio
Ao longo de milhões de anos, as condições geográficas e climáticas foram variando e criaram nos continentes fluxos de migração de formas de vida que em alguns poucos pontos ficaram preservadas de cataclismos. Os 185 mil hectares do Parque Nacional de Foz de Iguaçu, no oeste do Paraná, são um desses refúgios, tão representativos para as florestas como os mangues da Juréia, no litoral de São Paulo e Paraná, o são para a vida marinha. O fato de estar num "corredor de vida", vizinho de áreas protegidas e pouco povoadas também no Paraguai e na Argentina, faz do parque um museu vivo da flora e da fauna do sul-americanas. Há cerca de 200 milhões de anos, a região era um inferno: esteve por oito vezes coberta de lavas vulcânicas expelidas perto de Curitiba. Com o passar do tempo, essas placas de basalto endurecido acabaram curvando-se e rachando, formando uma falha geológica na altura do Rio Paraná. Onda de terremotos - Provavelmente uma onda de terremotos se sucedeu, até que a falha, que avança pela Argentina, se estabilizasse - embora ainda hoje se manifeste mais a oeste do continente, como se pôde perceber este ano pelo terremoto numa região quase deserta da Argentina, que foi sentido em São Paulo. Os movimentos sísmicos alteraram a posição da rachadura por onde o Rio Iguaçu espraiado se despeja, deslocando-a cerca de 25 quilômetros até a posição atual. Hoje o rio, que se alarga quatro quilômetros antes das quedas, aperta-se logo depois num estreito cânion de 100 metros, com mais de 20 metros de profundidade que ele mesmo esculpiu. Toda essa movimentação, entretanto, é muito antiga, e tem permitido condições muito favoráveis para a vida há pelo menos 100 milhões de anos, o que explica a grande quantidade de achados arqueológicos e fósseis na região. Reserva de água - Foz do Iguaçu é também o local de afloramento da maior reserva subterrânea de água doce do mundo, o Aquífero de Bauru, que se estende desde São Paulo. A presença de grandes rios, como o Iguaçu e o Paraná, além de inúmeros menores, garante água o ano todo. A baixa altitude (170 metros) e a posição no interior do continente permitem grandes contrastes de temperatura entre o inverno e o verão, constituindo o clima subtropical chuvoso, que deu condições ao surgimento daquele tipo de floresta atlântica subtropical. Essa floresta caracteriza-se pelo grande número de espécies que perdem as folhas na estação fria (50% de suas árvores) e por grandes áreas de coníferas, como os pinheiros-do-paraná. Orquídeas e bromélias - As árvores, menores que as das florestas tropicais e equatoriais - como a Amazônica -, são típicas da Mata Atlântica, representada por espécies como embaúbas e palmeiras, além de vários tipos de fícus e mata-paus (árvores que crescem sobre outras e as sufocam), e cipós. Também existem muitas epífitas (plantas que vivem sobre árvores), como orquídeas e bromélias, filodendros (costelas-de-adão) e cactos de floresta, como damas-da-noite. A flor-de-outubro (com flores em forma de estrela), hoje vendida em floriculturas de todo o mundo, é nativa da região, onde hoje é rara. Por causa dos grandes rios, um mosaico de espécies de ecossistemas diferentes abrigou-se no parque. Além das plantas da Mata Atlântica, há espécies do Cerrado, como o açoita-cavalo e o branquilho, passando pelas laranjeiras-do-mato, que se asselvajaram a partir de laranjais trazidos da Pérsia pelos colonizadores portugueses e que hoje nascem espontaneamente naquela área. Também há muitas espécies nativas de bambu, algumas capazes de fornecer mais álcool que a cana-de-açúcar. Infinidade de animais - A fauna, variadíssima, inclui mais de 340 espécies de aves, como o macuco, o socó-boi-escuro, o gavião-de-cabeça-cinza, o gavião pomba-grande, além de espécies migratórias como o falcão-peregrino, o maçarico-de-perna-amarela e a andorinha-do-sul. Destacam-se os tucanos, com seus bicos coloridos, e os guachos, que fazem ninhos pendurados em palmeiras. Nas reentrâncias de pedra debaixo das cachoeiras vive um pequeno pássaro endêmico: o andorinhão-do-penhasco, que só existe lá e poderia ser extinto se as cataratas fossem iluminadas à noite. Esse passarinho marrom, que parece uma andorinha, faz os ninhos ali porque tem uma saliva pegajosa com a qual "cola" gravetos na rocha. Voador incansável, ele não pára um só momento: caça e até faz amor em pleno ar. Já os mamíferos são representados por mais de 40 espécies de morcego, onças-pintadas, jaguatiricas, macacos-pregos, quatis, catetos, queixadas, mucuras-de-quatro-olhos, antas, guaribas e outros. Isso sem falar nas mais de 60 espécies de répteis (jacarés, lagartos e serpentes) e tartarugas, nas 12 espécies de anfíbios, 18 de peixes e milhares de insetos (entre eles, mais de 700 borboletas) que ocorrem na região. Livro argentino - Quem visita o Parque Nacional da Argentina e lê em espanhol deve comprar, na lanchonete do parque, o livro Iguazú - Las Leyes de la Selva, escrito por Santiago G. de la Veja e ilustrado por Gustavo R. Carrizo, ambos biólogos. No formato de uma revista Seleções, a obra, impressa em quatro cores, divulga conceitos de botânica e zoologia como se fosse um livro de aventuras. Custa oito pesos (o equivalente a R$ 16). 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Jornal da Tarde
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