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Consumidor Periférico e a visão classista

5 jul 2023 - 09h52
(atualizado em 21/8/2023 às 15h33)
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Texto por: Wes (@ogumdoce)

Quando o senso comum se depara com pessoas periféricas, faveladas manifestando seu direito de consumo de produtos e serviços de marcas, surgem diversas opiniões que instantaneamente segmentam, enquadram as escolhas desse público. Há uma antiquada, uma velha compreensão de que a favela é igual em todos os lugares e que todos os favelados estão em situação contínua de escassez. 

Foto: AUR

Nessa lógica equivocada os hábitos do consumidor periférico não podem ser livres, devem simplesmente existir para garantir sua subsistência. Frases como essa que tirei aqui do LinkedIn sustentam esse pensamento que não condiz com a verdade:

"Uma galera que não tem onde cair morta, querendo pagar de riquinho sendo que nem compra roupa original"

 

"Pedalada financeira: Quando se destina o dinheiro do reboco, da pintura da casa e da meia furada, para outros fins, como roupas caras".

Nessa lógica chega a ser incompreensível um favelado comprando uma camiseta original da Lacoste, porque certamente com esse consumo a sua subsistência está sendo afetada.Existe também o entendimento de que pessoas faveladas quando acessam ou compram artigos, produtos e serviços de marca estão em busca projetar uma posição de classe elevada, projetar um upgrade social.

Porém, os contrastes e movimentos de consumo periféricos contam outras histórias, que fazem cair essas duas opiniões. Compreender favela como uma única coisa em todo o território brasileiro é o primeiro ponto de divergência nessa história. 

O entendimento de favela é plural

Existem nomenclaturas diferentes para cada território, como por exemplo, quebrada, periferia, morro, grota, entre tantas outras. E se os territórios são compreendidos de formas diferentes, as pessoas também são.

Acreditar que pessoas periféricas querem projetar um upgrade social ao consumir é desconsiderar que existem princípios maiores que norteiam as escolhas de consumo dentro das periferias. 

É novamente cair no mito de que pirâmides ou funis de tendências de consumo são úteis em um mundo hiperconectado e com múltiplos caminhos. O consumo de artigos de moda nas periferias do Brasil é construído em cima de um sistema de distinção que tem início no Brasil Colonial, responsável por marcar quem eram "senhores" e escravizados. 

Foto: AUR

Não bastava ser um homem ou mulher livre para conquistar a liberdade, era necessário possuir os códigos visuais, a ausência de um calçado, uma proteção nos pés por exemplo, marcava naquele período a ausência da liberdade e cidadania. 

Nas pesquisas que tenho feito, me deparo recorrentemente com frases do tipo:

 

"Favelado não pode sair de qualquer jeito na rua, se não logo acham que você é bandido."

 

Ou de maneira mais simples:

 

"Você vale o que tem".

Logo, o consumo de artigos de moda nas periferias é a estratégia recorrente de manutenção da dignidade e respeito, e acima de tudo marca a busca pelo direito à cidadania. Ainda hoje, comprar uma camiseta ou tênis de marca  continua sendo o caminho para manter ocorre do dia a dia vivo e construir possibilidades para ir além da subsistência.

Foto: AUR

Wes Xavier (@ogumdoce) é pesquisador, especialista em comportamentos de consumo periféricos.

AUR
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