Ela criou moda penitenciária ao visitar o marido preso: ‘Faturo mais do que em qualquer emprego’
Camilla Bez encontrou no momento mais difícil de sua vida uma chance de empreender na área da moda com as regras de vestimenta de presídios
Empresária Camilla Bezerra, de 32 anos, montou empreendimento para vender roupas de moda padrão para visitantes de presídios e agora tem mais de 20 mil seguidores no Instagram. Ela foi pioneira e já fatura mais do que todos os empregos anteriores que teve e tem como objetivo expandir o modelo de negócios ao redor do país.
Com mais de 20 mil seguidores no Instagram da sua empresa, Camilla Bezerra, 32, não imaginava que o seu novo cotidiano viraria sua principal fonte de renda. A paulista é empreendedora de uma marca de roupas de moda padrão para visitas em penitenciárias.
Aos 7 meses de vida da sua filha, Camilla se tornou mãe solo. Seu marido foi preso e enviado para o Centro de Detenção Provisória de Sorocaba (SP), a 88 km da capital paulista, onde Camilla vive com a pequena e tem sua loja física.
Em conversa com o Terra Você, Camilla conta que seu empreendedorismo começou sem pretensão durante um momento difícil da sua vida. Seu marido estava preso há 2 meses e a ideia inicial era usar o lucro das pequenas vendas para bancar suas viagens à detenção, alimentação e os itens que podia levar para o marido (esse conjunto de itens é chamado popularmente de jumbo).
“Comecei oferecendo leggings, camisetas e lingeries padrão sob encomendas para as meninas que visitavam na mesma unidade que eu. No início eu não tinha capital nenhum para investir”, lembra.
Não demorou para Camilla perceber que sua ideia tinha se tornado um negócio. Nas primeiras semanas de divulgação, ela recebeu diversos pedidos de roupas e lingeries padrão. Foi então que surgiu mais uma ideia: expandir o comércio nas redes sociais.
“Chegou um momento em que pensei: ‘Se está dando certo aqui, também vai dar nas redes sociais’. Comecei a divulgar meu trabalho no TikTok, Instagram e grupos de Facebook para atingir mulheres de outros lugares que poderiam se interessar”.
Regras de vestimenta
Em 2022, a Secretária da Administração Penitenciária de São Paulo (SAP) padronizou a vestimenta para visitantes em todas as unidades do estado, válidas inclusive para crianças. Camilla conta que atualmente as visitantes não passam mais por revista vexatória, e que a modelagem padrão de roupas leves facilita a revista no scanner corporal.
É permitido em todas as unidades prisionais da SAP:
- Uso de camisetas com manga, podendo ser curta ou longa, exceto nas cores azul marinho, branca, cáqui/marrom e preta;
- Uso de calça de moletom ou legging, sem botões metálicos, sem zíper e sem estampas, exceto nas cores azul marinho, branca, cáqui/marrom e preta;
- Às visitantes mulheres é possibilitado, ainda, o uso de saias com comprimento abaixo dos joelhos, do tipo “midi”;
- Uso de chinelos de dedo, de solado fino e tiras de borracha simples;
- Em dias de baixas temperaturas, o/a visitante poderá ingressar no estabelecimento penal trajando meias e blusa de moletom, desde que esta última não possua capuz, forros, bolsos, botões metálicos, zíper, exceto nas cores azul marinho, branca, cáqui/marrom e preta;
- Fica assegurado ao visitante LGBTQIA+ o uso de peças de vestuário, seguindo as regras, conforme sua identidade de gênero;
Quanto às roupas íntimas como lingeries, não é permitida a entrada com peças que contenham detalhes em metal, alças removíveis, aros de metal ou plástico/silicone.
Disposição e psicológico
Apesar de já conseguir enxergar o potencial da sua empresa, as coisas não foram fáceis. Camilla não podia pagar por cuidadoras e precisava levar sua filha no colo para fazer pedidos e receber encomendas.
“Precisei de muita disposição e psicológico para crescer. Por várias vezes ela ia comigo no canguru fazer as compras, envios por Correios e tudo que fosse necessário”.
Não ter capital para investir em sua marca também foi um dos grandes desafios que a empresária enfrentou. Pela falta de dinheiro, Camilla precisou ir todos os dias ao Brás, bairro comercial de São Paulo, buscar as encomendas de acordo com os pedidos que recebia.
Camilla ainda precisou convencer os fornecedores de que voltaria nos dias seguintes das compras e que compraria em grandes quantidades no futuro para conseguir preços melhores nas poucas peças que levava. “Tiveram mercadorias em que ganhei R$5 por não conseguir o valor de atacado, mas vendia mesmo assim para conquistar o cliente”, lembra.
Hoje em dia, a loja Bazar da Bez, que fica localizada na Avenida Thomas Edison, na Barra Funda, recebe mais do que familiares de presos e atende até pessoas que nunca pisaram em um presídio, mas gostaram da proposta de looks confortáveis e mais comportados para a prática de exercícios físicos.
“Muitas mulheres evangélicas compram com a gente pra treinar! Mas o maior público é o de esposas de presos, creio que por ser com quem fazemos uma abordagem maior e quase exclusiva nas redes sociais”, conta a empresária.
O “Kit Visita Básico” é a composição mais vendida da loja que conta com propostas de inverno e até personagens de desenhos animados. Camilla acredita que o sucesso do “básico” é ser aceito em todas as unidades prisionais do estado. As leggings e camisetas estampadas dependem das regras do diretor de cada unidade.
O futuro
Atravessando preconceitos e comentários negativos, a empresária fatura com a loja física e digital mais do que ganhou nos empregos que já teve nas diversas áreas de comércio em São Paulo.
“Faturo mais do que em todos os empregos que tive. Já fui colorista em salões de beleza de alto padrão, já trabalhei como ambulante no Brás, como vendedora comissionada, já tive minha própria confecção de biquínis, mas sem dúvidas faturo mais atualmente”.
O sonho de Camilla é expandir a marca proporcionando conforto e estilo na vida de mulheres que precisam visitar as pessoas que elas amam em detenções e presídios de todos os estados do Brasil.
“Tenho vontade de acrescentar aos produtos da loja cores e peças que entrem nos presídios de estados que ainda não atingimos, boa parte usa o mesmo padrão do estado de SP, mas alguns seguem outros padrões. Estamos estudando isso!”