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Estilista chinesa sobre estampas de Mao Tsé-Tung: "perguntavam se era meu pai"

Vivienne Tam desfilou sua coleção no último domingo (8), na semana de moda de Nova York, e falou com o Terra sobre suas influências

11 set 2013 - 15h55
(atualizado às 16h00)
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Foto: Marina Massote / Especial para Terra

Em entrevista exclusiva para o Terra, a estilista chinesa Vivienne Tam fala sobre sua vida e apresenta detalhes de sua nova coleção primavera 2014, um dos destaques da semana de moda de Nova York. 

Para essa nova linha, ela optou por uma releitura das meninas dos calendários de Shangai dos anos 30, com novas silhuetas e estampas em cores e bordados diferentes.

Vivienne cresceu em uma China com forte influência britânica e se mudou para Nova York "com o intuito de mostrar o meu mundo para o ocidente". Em 1994, ainda em Hong Kong, criou uma coleção com estampas de Mao Tsé-Tung, e ouviu muitas negativas de fábricas que não queriam imprimir as imagens. A coleção acabou saindo e deu tão certo que Vivienne teve a oportunidade de levá-la para os Estados Unidos. "As pessoas me perguntavam: 'quem é esse homem? É o seu pai?'".

Confira a entrevista completa.

Terra - Você cresceu e estudou em Hong Kong, tendo vindo para Nova York apenas após terminar a universidade. Como foi viver em Hong Kong, quando a região ainda era colônia britânica, cercada pela China?

Vivienne Tam -

Era muito interessante porque, em Hong Kong, nós tínhamos as duas culturas. Era o lugar onde a cultura ocidental encontrava a oriental. Eu e minha família íamos ao templo budista, comíamos comida chinesa e conversávamos em cantonês, ao mesmo tempo em que eu frequentava uma escola britânica, falava em inglês com meus amigos e lia a Bíblia. Nós tínhamos feriados chineses e feriados britânicos, como, por exemplo, o aniversário da rainha. Eu adorava. 

Ter crescido nesse mix de culturas me fez quem eu sou hoje. Na China não há, até hoje, uma grande liberdade de imprensa, mas em Hong Kong é diferente, já que foi possível manter o isolamento de uma colônia. É como uma Cidade-Estado.

Terra - Por que você resolveu se mudar para Nova York?

V.T. -

Porque todo o mundo da moda é virado para o ocidente, todas as marcas famosas são do mundo ocidental. Seja da Europa ou dos Estados Unidos. Nem mesmo dentro da China há um foco nas marcas chinesas. Eu senti que era minha responsabilidade tentar mudar isso.

Eu amo a minha cultura e nunca entendi por que deveríamos focar apenas no ocidente se a cultura chinesa oferece mais de cinco mil anos de história, herança, artefatos e tecidos para estudar. Então, eu me mudei pra cá para ser conhecida e ter destaque, com o intuito de mostrar o meu mundo para o ocidente.

Terra - E por que você decidiu fazer uma coleção sobre o Mao Tsé-Tung?

V.T. -

A coleção sobre o Mao foi a minha segunda coleção, em 1994. Eu já morava em Nova York, mas dividia meu tempo entre aqui e Hong Kong, onde as minhas peças eram fabricadas.

A China estava se abrindo para o mundo ocidental e eu queria fazer com que as pessoas soubessem que a China estava crescendo e apresentar um outro lado do país. Pensei, então, que aquele ícone do Mao cheio de seriedade poderia ser também trabalhado de uma forma divertida.

Fazer os prints (com a estampa de Mao Tsé-Tung) foi muito difícil. As pessoas com quem eu conversava se mostravam realmente preocupadas com a coleção, me falavam para desistir, porque foi pouquíssimo tempo antes da reunificação de Hong Kong com a China (em 1997). As fábricas não queriam imprimir as imagens, com medo de algum problema com o governo. Até que o amigo de um amigo disse que poderia fazer as impressões, desde que eu assinasse um papel dizendo que a responsabilidade pelas peças era toda minha.

Eu me lembro que a gente tinha de esconder muito bem as peças para que ninguém visse o que estávamos fazendo, principalmente no caminho entre a fábrica e o meu ateliê.

Quando eu finalmente lancei a coleção em uma loja de Hong Kong, coloquei as estampas em uma vitrine e as vendedoras ficaram morrendo de medo de que a loja fosse invadida, ou que houvesse alguma retaliação por parte do governo chinês.

Mas, no final, a coleção acabou super bem aceita. Em Hong Kong, era possível ver cópias por todos os lados. As vendas foram um sucesso, teve uma repercussão muito grande. É claro que também teve muita polêmica, discussões entre políticos e pessoas do mundo da moda. Acabou sendo muito interessante.

O mais engraçado foi quando eu comecei a mostrar a minha coleção aqui nos Estados Unidos. As pessoas me perguntavam: "Quem é esse homem? É o seu pai?".

Terra - E depois da coleção do Mao você apresentou outra figura importante para a cultura chinesa, o Buda. Por quê?

V.T. - Eu já tinha feito uma coleção sobre a política na China, achei, então, que era hora de mostrar para o ocidente um pouco da nossa religião. Eu ia, e ainda vou, com muita frequência a templos budistas e sempre vejo essas imagens e figuras muito bonitas, que o ocidente não tem muito contato. Resolvi apresentar essas figuras com as minhas roupas.

E, assim como na coleção do Mao, ao ver uma estampa de Guanyin, as pessoas me perguntavam: "De quem é este rosto lindo?". Eu respondia: "É da deusa da misericórdia". E as pessoas corriam para a enciclopédia para entender que era essa deusa. Eu gosto de usar o meu trabalho como uma expressão da minha cultura para o mundo.

Terra - Depois de tanto anos você ainda busca inspiração no seu país de origem? Sobre o que é a sua nova coleção?

V.T. - Sim, busco. Nessa nova coleção, eu tive como inspiração as meninas dos calendários de Shangai dos anos 30. Todas usavam o mesmo cabelo preso, o mesmo corte de vestido - só que com estampas diferentes. Era um uniforme.

Hoje, a nova geração é muito diferente, não quer mais vestir uniformes. Elas querem cortes e formas. Por isso, eu chamo esta coleção de "as novas meninas de Shangai".  

Eu preservei os cortes em diagonal usados no passado, mas também apresento uma silhueta nova, moderna, com estampas semelhantes às daquele período, mas com outras cores e bordados. Tentei fazer uma coleção para as mulheres que viajam o mundo e podem usar as peças a qualquer hora do dia e da noite. É o conceito de pegar algo do passado e transformá-lo em moderno, novo.  

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Fonte: Especial para Terra
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