“Estão com ciúme da moda”, diz fundador da Ellus sobre Lei Rouanet
Nelson Alvarenga é presidente do Conselho da InBrands, que detém a marca Alexandre Hechcovitch; Ronaldo Fraga diz que dicussão mostra preconceito contra o setor
"Esta história mostrou como as pessoas têm preconceito contra a moda." A frase de Ronaldo Fraga se refere ao assunto que deu pano para manga: projetos da área de moda contemplados com Lei Rouanet, de renúncia fiscal. Para Nelson Alvarenga, presidente do conselho da InBrands, detentora da marca Ellus e Alexandre Herchcovitch, entre outras, o que existe é ciúme da moda.
Mesmo no meio fashion, há quem seja a favor e contra. Para Ronaldo, o problema é ainda mais profundo e não passa apenas pelo Ministério da Cultura. Segundo o estilista mineiro, entre os principais entraves do setor está a tributação exagerada, que chega a 48% de impostos diretos. “Meu consultor financeiro disse que, com impostos indiretos, pode variar de 52% a 60%. A porta do Ministério da Cultura é a entrada para se estabelecer um diálogo interministerial, que deve chegar ao da Economia”, disse ao Terra.
A estilista Raquel Davidowicz, da grife Uma, que mostrou seu desfile com 24 bailarinos, não é a favor do incentivo da lei para desfiles. “Nunca propus nem vou propor algum projeto para a Lei Rouanet para desfiles, por mais que a moda divulgue o Brasil, tem um fim comercial, que é a venda. Mesmo se tem algo como arte, no fundo é promover a marca e vender a roupa”, afirmou.
Ciúme
O impasse da questão está justamente no fato de que a moda é um produto que vai às lojas para ser consumido de forma comercial. “Isso é ciúme de quem tem incentivo e pode perder com a entrada de outros setores. A roupa vende, mas um livro, um quadro, uma peça de teatro também não são feitos com o objetivo final de vender? É medo”, disse Nelson Alvarenga ao Terra.
Alexandre Herchcovitch, da InBrands, foi agraciado com o valor de R$ 2,6 milhões para apresentar o projeto Mostra de Moda em São Paulo e Nova York: Herchcovitch fala de Antropofagia Americana. Os desfiles têm de ser 50% aberto ao público e as peças desfiladas serão doadas a museus brasileiros. “Agora vou atrás de patrocínio. E se não conseguir dentro do prazo de um ano, vou mudar o projeto”. O desfile apresentado na cúpula do Theatro Municipal não teve este tema.
O estilista Pedro Lourenço, contemplado com R$ 2,8 milhões, foi um dos mais atingidos pelas críticas, principalmente por ser novo e apresentar suas coleções em Paris. Ele mostrou, nesta quinta-feira (31), durante o SPFW, peças inspiradas no tema proposto ao Ministério da Cultura, que era Carmen Miranda. O jovem, de 23 anos, porém, se recusa a falar sobre o assunto. Nas entrevistas, avisou que apenas falaria sobre sua coleção.
Ronaldo Fraga trouxe ao SPFW o trabalho inspirado na proposta apresentada ao Ministério da Cultura, que tem Mário de Andrade, João Cabral de Melo Neto e o artesão Espedito Seleiro como pontos centrais para desenvolver as referências do semiárido brasileiro. Ele não recebeu incentivo para o projeto. “Eu já recebi incentivo para outros, como para a exposição sobre o Rio São Francisco, mas na época, tive de tirar todas as referências sobre moda. Agora mudou, mas não houve tempo hábil para conseguir recursos.” O estilista disse que usou matéria-prima 100% nacional, sendo que 90% da coleção era de couro.
Cultura
Que moda é cultura, porém, é quase unanimidade dentro do mundo fashion. Paulo Borges, CEO da Luminosidade, empresa que faz o SPFW, é enfático. “Nesse ponto eu brigo, não pode haver discussão. A moda é arte, é estética, cria desejos nas pessoas. Hoje, as exposições mais vistas do mundo estão ligadas à moda. Isso é cultura”, afirmou ao Terra. Ronaldo acredita também que toda essa história foi boa para mostrar que a Lei Rouanet precisa ser repensada. “Há cerca de 15 empresas no Brasil que fazem a renúncia fiscal. Muitas abraçam projetos apenas das regiões Sul e Sudeste, onde estão sediadas.”
Ele acrescenta que o bom, nisso tudo, é que o assunto moda veio à tona. “E o setor tem de ser visto como um dos únicos que dialoga com outras expressões culturais e artísticas, como arquitetura, design, gastronomia e artesanato”, completou. A Lei Rouanet de Incentivo à Cultura aprova projetos após avaliação de seus conselheiros, ligados ao Ministério da Cultura. Após publicado no Diário Oficial, os contemplados têm um ano para buscar empresas que topem apoiá-los em troca de renúncia fiscal. Os três projetos de moda foram publicados no começo de setembro.
Terra transmite desfiles do SPFW
O Terra, a maior empresa latino-americana de mídia digital, transmite ao vivo e com exclusividade para web os desfiles da coleção de inverno 2014 do São Paulo Fashion Week, entre 28 de outubro e 1º de novembro. As transmissões acontecem em parceria com o FFW, do Grupo Luminosidade e responsável pelos principais eventos de moda do Brasil.