Chumbo na gasolina causou crise de saúde mental à geração X, diz estudo
Estudo norte-americano mostra como a exposição gerou alta de condições psiquiátricas
Pesquisadores vêm alertando, há anos, sobre os efeitos nocivos do chumbo, presente em tintas, encanamentos e outros produtos. Mas, durante anos, a gasolina foi uma importante fonte de exposição ao chumbo no mundo todo.
Um estudo publicado nesta quarta-feira (4) sugere que as pessoas nascidas entre anos anos de 1960 até o fim dos anos de 1970 - a Geração X - viveram uma epidemia de condições como depressão, ansiedade, TDAH e comportamentos neuróticos devido à exposição à gasolina com chumbo na infância.
As conclusões, publicadas no Journal of Child Psychology and Psychiatry, são um exemplo de como fatores ambientais podem ter impacto na saúde e no comportamento das pessoas.
Geração X é "geração do chumbo"
A gasolina com chumbo foi proibida nos Estados Unidos em 1996. No Brasil, em 1992. Utilizado para melhorar o desempenho dos motores, o chumbo na gasolina teve seu pico entre meados da década de 1960 e até 1986.
Pesquisadores dizem que muitos dos indivíduos que eram crianças nesse período desenvolveram sintomas de saúde mental por causa dessa exposição, bem como dificuldades para manter a concentração ou organizar pensamentos.
"Eu costumo pensar na Geração X como a 'geração do chumbo'", disse Aaron Reuben, coautor do estudo e professor assistente de neuropsicologia clínica na Universidade da Virgínia, conforme reportagem do USA Today.
"Sabemos que eles foram mais expostos e estimamos que apresentem taxas mais altas de condições internalizantes como ansiedade, depressão e sintomas de transtorno de déficit de atenção com hiperatividade."
Efeitos da exposição ao chumbo
Reuben e pesquisadores da Universidade Estadual da Flórida analisaram dados de pesquisas de saúde e do consumo nacional de gasolina para estimar a quantidade de chumbo em pessoas de 1940 a 2015. Eles usaram esses dados para estimar os efeitos na saúde mental dessa exposição.
Os pesquisadores atribuíram a exposição ao chumbo a cerca de 151 milhões de "transtornos mentais em excesso" nos Estados Unidos ao longo de um período de 75 anos. As estimativas devem ser consideradas "conservadoras", pois se baseiam principalmente na gasolina e não na exposição ao chumbo presente em tintas e encanamentos, afirmou Reuben.
Embora a tinta com chumbo tenha sido proibida em 1978, ainda pode ser encontrada em casas antigas, representando riscos para crianças que ingerem lascas de tinta, por exemplo. A Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA) divulga um guia para alertar os pais de crianças que vivem em casas antigas para ficarem atentos a áreas de alto uso, como peitoris de janelas, portas, batentes, escadas, corrimãos e varandas.
O chumbo pode interromper o desenvolvimento cerebral, habilidades motoras finas e emoções das crianças. Níveis baixos podem causar problemas comportamentais, perda de QI e transtornos de déficit de atenção.
Faixas etárias com maior risco
Os sintomas de doenças mentais atribuídos à exposição ao chumbo variaram significativamente entre as faixas etárias. Aqueles nascidos em 1940 (antes do uso do chumbo na gasolina) ou em 2015 (bem depois da proibição) apresentaram alguns dos níveis mais baixos de exposição, segundo o estudo norte-americano.
Vale lembrar que muitos países de baixa renda só eliminaram o metal pesado da gasolina anos depois - a ONU (Organização das Nações Unidas) anunciou o fim "oficial" da era da gasolina com chumbo somente em 2021, com a eliminação do uso na Argélia.
Problemas psiquiátricos e delinquência juvenil
O estudo afirmou que o pico de uso de chumbo coincidiu com uma maior demanda por cuidados psiquiátricos e taxas mais altas de delinquência juvenil. Ele citou pesquisas anteriores detalhando a "hipótese chumbo-crime", que sugerem que a redução do uso de chumbo pode ter contribuído para a diminuição das taxas de homicídio dos anos 1990 aos 2010.
Nos EUA, as crianças são rotineiramente examinadas para verificar altos níveis de chumbo no sangue e tratadas se os níveis forem preocupantes."Nos anos 60, 70 e 80, as pessoas andavam por aí com níveis médios de chumbo no sangue que, hoje, desencadeariam acompanhamento clínico," disse Reuben.
Ainda que o estudo tenha feito uma correlação entre a exposição ao chumbo da gasolina e casos de transtornos mentais, é importante interpretar os resultados com cuidado. Afinal, comportamentos neuróticos e transtornos mentais são condições multifatoriais, ou seja, não dependem apenas de um único fator, como a exposição ambiental.