Como o racismo no futebol compromete a saúde mental dos jogadores
A discriminação gera hostilidades e violências que comprometem o bem-estar psíquico das vítimas.
Casos recentes de racismo no futebol evidenciam os impactos que o preconceito pode ter na saúde mental dos atletas. No último domingo, durante uma partida entre Deportivo Fabril e Rayo Cantabria, pela quarta divisão da Espanha, o jogador senegalês Alioune Mané foi alvo de insultos racistas por parte de um adversário. O incidente desencadeou uma crise de ansiedade em Mané, que precisou ser hospitalizado após o ocorrido.
Na semana passada, Luighi, jovem atacante de 18 anos do Palmeiras, sofreu ofensas racistas de torcedores do clube Cerro Porteño durante uma partida da Libertadores sub-20, no Paraguai. O jogador chorou muito no banco de reservas e desabafou nas redes sociais: “O que fizeram foi um crime”.
Outro exemplo marcante é o de Vinícius Júnior, atacante do Real Madrid, que tem sido alvo recorrente de manifestações racistas na Espanha. Vini Jr. tem trazido à tona a discussão sobre a tolerância ao racismo no futebol espanhol.
O racismo não afeta apenas a carreira e o desempenho dos jogadores, mas também sua saúde mental. Estudos e pesquisas mostram que as vítimas do racismo podem desenvolver uma série de sintomas que prejudicam de maneira importante sua autoestima, bem-estar e qualidade de vida.
Entenda alguns dos impactos do racismo na saúde mental dos atletas:
1. Ansiedade e crises de ansiedade – Vítimas de racismo podem desenvolver um estado de alerta constante, com medo de novos episódios de discriminação, o que pode causar crises agudas de ansiedade, como a que enfrentou Mané, e transtorno de ansiedade generalizada.
2. Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) – Um episódio de racismo pode se tornar um evento traumático para a pessoa, causando sintomas como flashbacks, insônia, irritabilidade, hipervigilância e dificuldade de concentração.
3. Depressão e sintomas depressivos – O racismo pode comprometer a autoestima, criar desesperança em relação ao futuro e desmotivação, aumentando o risco de transtornos depressivos.
4. Baixa autoestima – A discriminação pode fazer a pessoa duvidar de seu próprio valor e capacidade, internalizando estereótipos negativos.
5. Fadiga racial – O impacto emocional do racismo crônico pode levar à exaustão psicológica, causando cansaço mental, estresse constante e sensação de sobrecarga emocional.
6. Isolamento social – O medo de novas experiências de discriminação pode levar a um afastamento da vida social, abandono do trabalho e dificuldades em criar laços afetivos.
7. Raiva reprimida e explosões emocionais – O racismo pode gerar frustração e impotência, que podem levar a explosões emocionais ou comportamentos autodestrutivos.
8. Abuso de substâncias – Algumas vítimas podem recorrer ao álcool ou drogas como uma forma de lidar com o racismo.
9. Ideação suicida – O racismo pode aumentar o risco de pensamentos suicidas, especialmente em pessoas que enfrentam discriminação sistemática e não encontram suporte social ou psicológico.
10. Dificuldade de concentração e queda no desempenho – O estresse pode afetar a capacidade de aprendizado, produtividade e desempenho esportivo ou acadêmico.
É claro que os impactos do racismos não se restringem aos esportistas. A discriminação gera hostilidades e violências que comprometem o bem-estar psíquico das vítimas.
Ambientes que promovem a inclusão, diversidade e combatem ativamente os preconceito são mais saudáveis. No contexto corporativo, empresas que adotam essas políticas percebem colaboradores mais felizes, confiantes, satisfeitos e engajados.
Da mesma forma, competições esportivas e estádios que implementem medidas efetivas contra o racismo e outras formas de discriminação proporcionam uma experiência mais positiva para atletas e torcedores.
Insultos racistas, dentro ou fora do campo, são inaceitáveis, desumanos e não devem ser tolerados, de forma alguma. É essencial que os clubes, os atletas, as associações e a população como um todo se posicionem firmemente contra o racismo e punam os culpados pelos crimes cometidos. E racismo é crime sim, como bem apontou o jovem Luighi e como tem reafirmado nos últimos anos o fantástico Vini Jr.
Para avançar como sociedade é essencial promover a educação sobre diversidade, implementar políticas de tolerância zero ao preconceito e oferecer suporte às vítimas. Somente assim poderemos construir um mundo justo para todos.
Jairo Bouer é médico psiquiatra e escreve semanalmente no Terra