Gay, hétero ou bi: a orientação sexual pode mudar ao longo da vida?
Você já parou para pensar que a forma como as pessoas encaram sua orientação sexual pode ser menos estática do que se imagina e, ainda, que
Um novo estudo revelou que 1 em cada 15 pessoas mudou a forma como define sua orientação sexual em um período de seis anos. O trabalho foi feito no Reino Unido, com maiores de 16 anos, e publicado recentemente no periódico "Demography".
Foram entrevistadas quase 23 mil pessoas em 2011-2013 e, depois, novamente em 2017-2019. 6.6% delas mudaram sua orientação sexual nesse intervalo. A questão da maior fluidez da sexualidade não é uma discussão nova, mas esse trabalho atual aponta melhor como as variações podem acontecer em diferentes grupos demográficos.
Jovens e idosos
A mobilidade de orientação sexual foi maior nos jovens de 16 a 24 anos e na população com mais de 65 anos. Também foi mais frequente nas mulheres do que nos homens, e três vezes mais comum em minorias étnicas do que em pessoas que identificam como brancas. Bissexuais e quem têm outras identidades também tiveram maior variação do que heterossexuais, gays e lésbicas.
O trabalho desafia o conceito de que a mobilidade de orientação sexual diminui ao longo da vida, mostrando que ela pode acontecer em qualquer faixa de idade, inclusive crescendo após os 65, talvez um momento em que a pessoa se sinta mais tranquila em finalmente aceitar e revelar sua orientação.
Não acaba na adolescência
Uma outra pesquisa de 2021, publicado no periódico Journal of Sex Research já apontava que mudanças na forma como as pessoas enxergavam sua orientação sexual iam muito além da adolescência, podendo chegar até o final da terceira década de vida. Os pesquisadores entrevistaram 12 mil estudantes nos EUA aos 16 anos e, depois, quando eles estavam próximos aos 30 anos.
Baseado nas respostas desses estudantes, os pesquisadores sugerem que ao invés das três classificações clássicas de orientação sexual (homo, hétero e bi), existe um espectro muito mais amplo, que poderia ter ao menos nove possibilidades de categorias. Entre os homens, cerca de 13% se encaixariam em outras classificações que não na de exclusivamente heterossexuais. Entre as mulheres, esse número seria de 26%.
Novo relacionamento pode definir a mudança
As causas da mudança na forma como a pessoa enxerga sua orientação sexual não foram exploradas nessa pesquisa do Reino Unido, mas apesar de haver possibilidades múltiplas e complexas, o fato da pessoa se engajar em um relacionamento afetivo com uma pessoa do mesmo sexo teria um peso importante nessa equação.
As informações de ambos os trabalhos podem ajudar na elaboração de políticas na área de saúde publica e programas de bem-estar social que passem a levar em conta essa maior fluidez. O fato de que as minorias sexuais não são estáticas e que as parcerias podem mudar ao logo da vida devem ser focos de atenção.
Colher as informações populacionais em relação à sexualidade de forma mais sistemática, como no Censo, como já fazem os EUA desde 2022 e o Reino Unido desde 2021, podem ser oportunidades de quantificar melhor essas populações e de poder pensar em políticas que possam dar conta de atendar às suas demandas específicas.
No Brasil, quem sabe a gente consegue incorporar essas informações no próximo Censo ou, ainda, em recortes das demais pesquisas do IBGE e demais instâncias públicas?
* Jairo Bouer é médico psiquiatra, comunicador e publica suas colunas no Terra às quintas-feiras.