Como identificamos o TDAH, Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade?
Psiquiatra, Dra. Jéssica Martani descreve o que é o TDAH, seus principais sintomas e como funciona o diagnóstico clínico
Vivemos em um mundo repleto de diversos estímulos, onde cada vez mais enfrentamos dificuldades para pegar um livro de papel e ler. Nossas conversas com os colegas são interrompidas por notificações do celular a cada minuto e não é incomum sair de um cômodo da casa, chegar ao outro e se perguntar: "Nossa, o que eu vim fazer aqui?".
E assim seguimos, com cada vez menos atenção, cada vez mais esquecidos, cada vez mais distraídos. Mas até onde isso pode ser considerado normal? Ou será que são características do TDAH?
O que é TDAH?
TDAH significa Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade. É uma doença do neurodesenvolvimento, ou seja, ela surge desde a infância, ou seja, não dá para "pegar TDAH" na idade adulta. A grande maioria dos casos de desatenção que aparecem no meu consultório não são TDAH.
A principal alteração é um desenvolvimento alterado do córtex pré-frontal, local super importante para:
- Tomada de decisão;
- Controle de impulsos;
- Regulação emocional;
- Planejamento e organização;
- Atenção sustentada
Postula-se que haja uma alteração nos lobos frontais, a região frontal da cabeça responsável por atividades como regulação das emoções, regulação dos impulsos e organização.
Além disso, as principais teorias sugerem uma desregulação da dopamina, um neurotransmissor que tem diversas funções, como desempenho da cognição, manutenção da atenção, tomada de decisões, regulação do comportamento e recompensas, coordenação motora, entre outros.
Os sintomas ocorrem devido às desregulações. A pessoa com TDAH apresenta dificuldade no controle e regulação de emoções e estímulos. Têm foco em muitas coisas ao seu redor, como barulhos e movimentos, e não conseguem ter um foco único. Isso faz com que ela não consiga ter uma atenção sustentada.
As alterações dos centros de recompensa dopaminérgicos fazem com que o tédio seja tão grande a ponto de não conseguir submeter-se a eventos tediosos, e assim a pessoa prefere atividades que possam propor uma recompensa imediata. Essa dificuldade de cumprir atividades mais maçantes, que terão recompensa posteriormente, levam à procrastinação, sensação de tédio iminente e insatisfação, não sendo incomum uma busca incansável por novidades.
O Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é um fenômeno complexo que se manifesta geralmente por volta dos sete anos, já que antes disso o cérebro ainda é imaturo. Por isso, toda a criança abaixo dessa idade, as quais o cérebro ainda não está totalmente formado e que tenha sintomas parecidos com o do TDAH não possuem o diagnóstico.
A fisiopatologia do TDAH é amplamente influenciada por fatores genéticos, respondendo por cerca de 80% dos casos. O cérebro dos afetados apresenta anormalidades no neurodesenvolvimento do córtex frontal, como o rápido aumento e subsequente eliminação de sinapses por volta dos seis anos.
Há alterações em genes receptores, como os alfa adrenérgicos, dopaminérgicos e noradrenérgicos, ocasionando modificações e alterações de neurotransmissores importantes na regulação da atenção, do humor e da impulsividade.
O TDAH ainda é uma doença que traz muita frustração no indivíduo, que acaba não conseguindo realizar as suas atividades, ocasionando alteração da autoimagem e queda de autoestima, além da sensação de pertencimento. Com isso, 3/4 dos indivíduos com TDAH enfrentam comorbidades, sendo a depressão (20%-55%), bipolaridade (10%), tabagismo (dobro da população normal dos EUA) e ansiedade as mais comuns. Outros problemas como dificuldade para dormir e o uso de drogas também são frequentemente observados.
Em um cenário mais amplo, 20% daqueles com distúrbios psiquiátricos apresentam TDAH, com destaque para a associação significativa com transtorno bipolar (20%) e borderline (35%).
O diagnóstico do TDAH
O diagnóstico do TDAH requer a observação frequente de sintomas, como esquecimento, quando acontece pelo menos uma vez por semana. Diferenciar o TDAH de outras condições é crucial, especialmente em crianças, onde a impulsividade e hiperatividade são comuns nessa faixa etária.
O diagnóstico em adultos também pode ser desafiador, pois os sintomas de desatenção se tornam mais proeminentes. E não é incomum que muitos sintomas do TDAH estejam em outras doenças como transtornos da ansiedade, transtornos depressivos, transtorno de personalidade, entre outros.
É muito importante a avaliação de um médico psiquiatra para fazer o diagnóstico, muitas vezes são necessários questionários e utilização de outros testes, como QB teste, com 80% de acurácia, bem como o teste neuropsicológico.
Os sintomas do TDAH
Os sintomas do TDAH variam entre desatenção, hiperatividade, impulsividade e flutuações de humor. O tratamento visa aliviar esses sintomas e melhorar a qualidade de vida.
É importante dizer que existem tipos de TDAH, sendo um deles do tipo hiperativo, predominando os sintomas de hiperatividade, do tipo desatento e é possível haver a combinação de sintomas, já que o TDAH é caracterizado por uma variedade de sintomas que afetam significativamente a vida cotidiana.
Os principais sintomas incluem:
1. Desatenção:
- Dificuldade de concentração e alta distração;
- Desorganização em tarefas cotidianas;
- Tendência a estar sempre atrasado;
- Propensão a esquecimentos frequentes;
- Dificuldade em tomar decisões, muitas vezes procrastinando.
2. Hiperatividade:
- Dificuldade em relaxar e descansar;
- Sensação frequente de tensão;
- Constantemente ocupado, buscando atividades estimulantes;
- Tendência a falar excessivamente;
- Predisposição a envolver-se em atividade física em excesso;
- Inquietude.
3. Impulsividade:
- Tomada de decisões impulsivas, agindo antes de pensar;
- Impaciência em situações que exigem espera;
- Dificuldade em esperar a vez em atividades em grupo;
- Tendência a não conseguir se manter focado em uma tarefa ou serviço;
- Possibilidade de apresentar alterações alimentares, como compulsão alimentar.
4. Flutuações de Humor:
- Variações frequentes no humor ao longo do dia;
- Manifestação de crises de raiva, ocorrendo até cinco vezes por dia.
Esses sintomas manifestam-se de maneira única em cada indivíduo e contribuem para desafios significativos em diversas áreas da vida. O diagnóstico precoce e a intervenção adequada são cruciais para minimizar o impacto do TDAH na vida cotidiana.
O tratamento pode envolver abordagens multifacetadas, apoio psicológico, e, em alguns casos, medicação, sendo sempre importante o cuidado das comorbidades primeiro. No entanto, é fundamental que o tratamento seja personalizado, considerando as necessidades específicas de cada indivíduo.
Compreender a complexidade do TDAH e seus efeitos não apenas no indivíduo, mas também em seu ambiente social, é essencial para promover a empatia e o suporte necessários.
A educação sobre o TDAH desempenha um papel vital na redução do estigma associado à condição, promovendo uma compreensão mais profunda e aceitação da diversidade neuro cognitiva.
E se você se identificou com os sintomas, não deixe de buscar ajuda.