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Dia das Crianças: Autora escreve livro 'As Princesas Encaracoladas' para empoderar suas filhas

Claudia Kalhoefer criou a história depois que Agatha sofreu bullying na escola, aos 4 anos, por não ter o cabelo liso

12 out 2021 - 06h11
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Quando uma mãe reconhece no seu filho uma dor - especialmente uma dor que já viveu ou ainda vive, como o preconceito -, seu instinto é fazer de tudo para afastar esse sentimento. Claudia Kalhoefer usou a arma que tinha, a escrita, para empoderar sua filha, que sofreu bullying na escola por causa dos cabelos enrolados. Assim nasceu o livro As Princesas Encaracoladas e, junto com ele, mãe e filhas orgulhosas de sua aparência.

Agatha, na época com 4 anos e meio, chegou da escola e perguntou para Claudia: "Mamãe, porque eu tenho o cabelo cacheado?". A mãe achou a pergunta estranha: "Foi até o jeito que ela perguntou, ela estava com o olhinho cheio de lágrima e o tom da voz dela...", lembra com tristeza. Ela explicou que é "uma mistura do cabelo da mamãe, que é enrolado, com o cabelo do papai, que é liso". E foi então que veio a resposta que fez Claudia refletir: "Mas você não tem o cabelo cacheado", contestou Agatha.

Na época, a escritora usava escova progressiva. "Eu fui escrava da escova por mais de 30 anos, na cabecinha dela meu cabelo era liso. Então como surgiu o cabelo dela cacheado? Como que eu vou falar pra minha filha que o cabelo dela é lindo, que os cachos são lindos, sendo que eu não gosto do meu cabelo e eu não me aceito como eu sou. Já veio uma bandeira vermelha, um sinal de alerta pra mim".

Depois de muita conversa, Agatha revelou: "Eu não quero ter os cabelos cacheados. A minha amiguinha falou que eu não posso ser princesa porque eu não tenho o cabelo liso e loiro", disse a pequena chorando. Ela chegou a pegar a tesoura escondida dos pais e cortar um pedaço do cabelo.

Claudia não podia se conformar que a sua filha, aos 4 anos, estivesse se sentindo inferior, com baixa autoestima, por causa de sua aparência. Ela não podia permitir que Agatha e Alice, a sua caçula, passassem pelo trauma que ela enfrentou na infância e carregou a vida toda, até precisar enfrentá-lo pelas suas filhas.

"Quando eu estava na fase pré-escolar, aconteceu a mesma coisa comigo, os amiguinhos riam do meu cabelo, falavam que era feio, 'cabelo bombril', 'nega do cabelo duro', coisas assim. Naquela época, eu me sentia tão inferior que um dia cheguei pra minha mãe e disse: 'mãe, por favor, alisa o meu cabelo que não aguento mais'. E a minha mãe, infelizmente naquela época, não soube o que fazer, e, vendo o meu sofrimento, alisou o meu cabelo. Eu tinha seis anos de idade", contou Claudia.

O cotidiano das princesas encaracoladas

Colunista, blogueira e coautora de livros sobre maternidade, a brasileira que vive nos Estados Unidos resolveu se aventurar na literatura infantil para ajudar sua filha a enfrentar o preconceito e se aceitar. "Em As Princesas Encaracoladas eu conto o dia a dia dela com os irmãos, mostro a nossa família, ela indo na escola, no balé, brincando. Escrevi um livro empoderando as minhas filhas. Os vestidos que elas gostam, o laço no cabelo. Tem os cremes que elas usam para pentear e hidratar os cachos, e ela se olha no espelho e se acha linda", conta Claudia, que também é mãe de Noah, 8.

As pequenas não sabiam do livro e foi uma surpresa quando se viram ilustradas em um conto de fadas. "Quando a Agatha viu as ilustrações, a história, foi uma felicidade tão grande. Ela dizia: 'Olha mamãe, sou eu! Eu sou uma princesa de cabelos encaracolados'", conta a mãe orgulhosa.

Hoje Agatha tem 6 anos e gosta de seus cabelos. "Eu me sinto uma verdadeira princesa. Quando eu crescer, eu quero ser uma bailarina que toca três instrumentos: violino, harpa e piano", diz ela, mostrando a parte do livro que dança balé e toca violino.

Alice, 4, também contou o que mais gosta da história: "Eu sou Alice e eu tenho os cabelos cacheados. Esse é o meu livro As Princesas Encaracoladas. E as partes que eu mais gosto do livro são essas: a da minha família e a que eu e a Agatha somos princesas, a Bela e a Branca de Neve, e a minha mamãe gosta de ser a Princesa Tiana".

Educação pelo exemplo

Claudia decidiu que, além de escrever o livro, precisava dar o exemplo e parar de alisar o cabelo. Ela conta que foi muito difícil superar o receio de mostrar sua aparência natural. "Eu não deixava ninguém me ver com o cabelo molhado. Eu ia para a piscina, para a praia, meu marido entrava na água, se divertindo com as crianças e eu simplesmente fazia de tudo pra não molhar o cabelo. Eu nem me divertia por causa disso. Até mesmo em casa, com a minha família, eu saía do banho e corria para fazer escova", lamenta.

A transição capilar foi demorada, mas depois de um longo processo os cachos voltaram. "Cheguei em casa com medo da reação dos meus filhos. O primeiro que me viu foi o Noah: 'mamãe, como você está linda'. A Alice é a que tem mais cachos e é toda empoderada, falou assim: 'mamãe, você tem o cabelo igual ao meu!', começou a pegar meu cabelo, me abraçava, me beijava. Aí a Agatha veio… foi uma felicidade tão grande. Eu fiz isso pela minha filha e eu acabei me aceitando", se emocionou a autora.

Ela reforça que seu livro não é só para crianças que têm cabelos crespos e cacheados, mas para todas as crianças. A mensagem principal do livro é a questão do respeito e da diversidade, que somos diferentes, que todos os cabelos são bonitos. "Eu recebo mensagens todo dia, de mães do mundo todo, relatando que os filhos sofrem bullying. O preconceito está em todo lugar, em todas as classes sociais", analisa Claudia.

Mais do que isso, a publicação é também para os adultos curarem os efeitos das experiências emocionais negativas que tiveram na infância. "Escrever esse livro, pra mim, foi um processo de cura, porque eu realmente não me aceitava. Eu recebo mensagens de mães dizendo: 'como eu queria que tivesse um livro assim quando eu era criança'. Eu também queria. Que bom que hoje a gente tem, eu vejo vários livros e sempre compro pros meus filhos."

Repercussão positiva

Kalhoefer tem feito lives sobre o livro As Princesas Encaracoladas em escolas pelo Brasil: Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Minas Gerais e Bahia, onde o livro foi sucesso de vendas em Salvador. As princesas e seus cachos também chegaram na Holanda e outros países da Europa, e Claudia ganhou um prêmio de Melhor Escritora Brasileira categoria infanto-juvenil nos EUA.

"Tenho recebido relatos de crianças que tinham vergonha do cabelo, deixavam preso, e depois de ver a história querem usar igual ao das princesas: penteado, solto com o laço. Eu agradeço a Deus por ter escrito esse livro", comemora a autora.

Claudia acredita que o sucesso da publicação se deve também ao fato de ser uma história real, contar o cotidiano das irmãs, que além de estarem ilustradas nas páginas de As Princesas Encaracoladas, podem ser vistas em vídeos e fotos no perfil oficial do Instagram.

A história também ganhou duas músicas tema - uma em inglês e outra em português - e bonecas amigurumi (técnica japonesa em crochê ou tricô). Em breve, terá também a versão em audiolivro.

Ao escrever um livro para empoderar suas filhas, Claudia não imaginava que estaria ajudando outras crianças a se aceitarem. Seu conto fomenta o que toda mãe quer para os seus filhos: respeito, aceitação e empatia.

Capa do livro 'As Princesas Encaracoladas'
Capa do livro 'As Princesas Encaracoladas'
Foto: Reprodução / Estadão

Conheça outros títulos infantis para ensinar sobre diversidade e empoderar as crianças:

  • O Pequeno Grande Alfaiate, Isabel Cintra
  • A Princesa e o Espelho, Isabel Cintra
  • Amor de Cabelo, Matthew A. Cherry
  • O Pente Penteia, Olegário Alfredo
  • O Cabelo de Cora, Ana Zarco Camara
  • Meu Crespo é de Rainha, Bell Hooks
  • O Pequeno Príncipe Preto, Rodrigo França
  • Sulwe, Lupita Nyong'o
  • Amoras, Emicida
  • E foi assim que eu e a escuridão ficamos amigas, Emicida
  • Sinto o que sinto: e a incrível história de Asta e Jaser, Lázaro Ramos
  • Todos são bem-vindos, Alexandra Penfold
  • Meninas negras, Madu Costa
  • Princesas Negras, Edileuza Penha de Souza
  • Flávia e o bolo de chocolate, Míriam Leitão
  • Ana Curiosa e as formas, Diane Lizst e Maryana Ahlert
Estadão
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