"É mulher que não acaba mais", diz usuário de aplicativo para paquera
A cada dia, número de usuários de aplicativos como Grindr e Tinder cresce cerca de 5% no Brasil
O trânsito é motivo de reclamação de quase 100% das pessoas que vivem em cidades grandes, mas, para Carla Cristina, uma tarde parada por causa de um congestionamento na rodovia Anchieta, em São Paulo, trouxe um motivo para comemorar: foi quando ela conheceu o atual namorado, Felipe. “Eu estava entediada, já tinha visto todas as atualizações do Instagram e redes sociais, aí decidi entrar no Blender. Vi que ele estava a uns 100 metros de mim, olhei a foto e o perfil, achei interessante e mandei uma mensagem. Ele respondeu, me adicionou no Facebook e começamos a conversar. Descobri que ele trabalha a cinco minutos da minha casa”, contou. Desde então, foram duas semanas de conversas via internet, seguidas de um almoço, e logo engataram o namoro. “Foi muita sorte tê-lo encontrado”, conta.
Carla é apenas um exemplo entre os milhões que usam aplicativos para celulares e tablets capazes de rastrear pessoas que estão por perto e têm o perfil de acordo com as especificações do usuário. Entre os heterossexuais, o uso destes artifícios ainda é menos popular do que entre os gays, mas a situação vem mudando, de acordo com Justin Mateen, co-fundador do Tinder, aplicativo que surgiu em setembro de 2012. “Não sabemos dizer o número de usuários, mas podemos afimar que são milhões e que eles crescem cerca de 5% a cada dia no Brasil”.
O jornalista Guilherme se surpreendeu com o volume de possibilidades quando se cadastrou no aplicativo. “O que mais chama atenção é a quantidade de gente que usa. Era mulher que não acabava mais”, diz. E tanto sucesso se justifica com várias facilidades. “É uma maneira diferente de conhecer pessoas porque cada um especifica o que quer e esse comportamento é correspondido por outros”, explica Thiago de Almeida, psicólogo especializado nas dificuldades do relacionamento amoroso.
Grindr: o preferido dos gays
“Se quer encontro casual, é o lugar certo. É direto e rápido. No dia a dia, onde você vai encontrar outro cara gay sem ser na noite, no bar? Com o aplicativo você pode encontrar numa biblioteca, restaurante, shopping”, conta o produtor Lucas, de 21 anos, que tem seu perfil online no Grindr há cerca de quatro anos, logo que este tipo de produto começou a ser utilizado.
O Grindr foi criado em 2009, conta com uma versão gratuita e outra paga, e é o preferido dos gays. Os números não deixam dúvidas: o aplicativo está disponível em 192 países, nos quais mais de 7 milhões de pessoas estão cadastradas. Nos Estados Unidos, são 2 milhões de usuários e, no Brasil, mais de 240 mil pessoas. “Como todos os outros gays, eu estava muito curioso para saber quem ao meu redor também era gay, porque você não tem como saber isso em lugares comuns, a não ser em bares, baladas e locais específicos para este público”, diz Joel Simkhai, CEO e fundador do Grindr.
O objetivo inicial é quase sempre conseguir possíveis encontros, parceiros e relacionamentos duradouros, mas ter uma companhia durante uma viagem, fazer amigos e contatos profissionais também estão na lista de benefícios do aplicativo. “Três pessoas que conheci pelo Grindr viraram melhores amigos. Tem até um deles que é meu vizinho e só fiquei sabendo que ele era gay pelo aplicativo”, comenta Lucas. Desde que usa o Grindr, Lucas teve centenas de conversas e encontrou pessoalmente cerca de 40 pessoas. “Se fico cinco minutos com o aplicativo ligado, umas cinco, 10 pessoas vêm falar comigo, ainda mais se for em algum lugar movimentado”.
Para o estudante Guilherme, de 20 anos, o aplicativo é uma ajuda e tanto para os jovens gays que ainda não se assumiram para a família e têm dificuldades para encontrar amigos e parceiros. “Eles ajudam muito as pessoas mais tímidas ou até quem não se assumiu e não pode sair para encontros gays, como baladas. Facilita muito o acesso para conhecer pessoas”. Os homossexuais também usam outros aplicativos, como o O Scruff, Hornet, Recon, Growlr e Manhunt
Quem usa
Os usuários de aplicativos como o Tinder e o Grindr têm intenções bem claras: estão dispostos a novas possibilidades, curiosos por novos encontros e abertos às relações. “A diferença para a paquera convencional é que no Tinder já houve recíproca. Os dois já se acharam bonitos. É só encaixar a ideia”, comenta o jornalista Guilherme. E encaixar a ideia é justamente o que fez Carla encontrar Felipe no trânsito. “Ele é de um círculo completamente diferente do meu e eu tinha preconceito com caras como ele, rato de academia, que eu achava meio vazios, mas ele é um gênio. Se eu o visse em uma balada, eu diria que é bonito, mas nunca chegaria nele, nem ele em mim”.
Na vida real
Apesar dos pontos positivos, trazer estes relacionamentos para o mundo real é de extrema importância e é algo que deve ser feito de maneira rápida, segundo Marina Vasconcellos, psicóloga da PUC-SP, especialista em terapia familiar e de casal pela Unifesp. “O problema é que você tem que conhecer a pessoa e logo e sair do papo virtual porque, pela internet, você não sabe quem está do outro lado. Qualquer pessoa pode se passar por qualquer coisa”, explica. Por isso, ter alguns cuidados com a segurança é importante. Escolher locais locais seguros e movimentados para encontrar a pessoa e avisar algum amigo ou familiar de onde vai estar é imprescindível. “Tem que tomar cuidado com a exposição”, explica a psicóloga.