Proibição do uso do celular nas escolas: tudo que precisa saber
O presidente Lula sanciona o Projeto de Lei nº 4.932/2024, que restringe o uso de celular e outros aparelhos eletrônicos portáteis em escolas públicas e privadas por todo o país. Inclusive no recreio e no intervalo entre as aulas.A medida segue a recomendação de um relatório publicado em julho pela Organização das Nações Unidas para […]
O presidente Lula sanciona o Projeto de Lei nº 4.932/2024, que restringe o uso de celular e outros aparelhos eletrônicos portáteis em escolas públicas e privadas por todo o país. Inclusive no recreio e no intervalo entre as aulas.
A medida segue a recomendação de um relatório publicado em julho pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), que sugere o banimento de celulares nas escolas. Países como França, EUA, Finlândia, Itália, Espanha, Portugal, Holanda, Canadá, Suíça e México já adotam restrições similares.
Obsessão dos jovens pelo celular
Segundo a pesquisa da Common Sense Media de 2021, adolescentes entre 13 e 18 anos passam, em média, 7 horas e 22 minutos por dia em dispositivos móveis, excluindo atividades escolares. Crianças entre 8 e 12 anos, por sua vez, gastam cerca de 4 horas e 44 minutos diários. No Brasil, a TIC Kids Online Brasil 2021 revela que 89% dos jovens entre 9 e 17 anos acessam a internet diariamente. Sendo que 85% utilizam o celular como principal meio de conexão.
O uso prolongado de celulares tem sido associado a dificuldades de concentração e redução da capacidade de memorização. Pesquisas da American Academy of Pediatrics apontam que a exposição excessiva às telas durante a infância e adolescência pode comprometer o desenvolvimento de funções executivas, essenciais para a resolução de problemas e tomada de decisões. Além disso, o uso constante de aplicativos de redes sociais, jogos e vídeos, que oferecem gratificações rápidas, pode reduzir a paciência e dificultar o foco em atividades mais longas e complexas, como leitura e estudos.
A saúde mental também sofre
O uso excessivo de celulares também está ligado a problemas de saúde mental, como ansiedade e depressão. A última pesquisa da UNICEF revela que adolescentes que passam mais tempo em redes sociais apresentam maiores níveis de solidão e insatisfação com a própria vida. O ciclo de comparação constante em plataformas digitais, associado à busca incessante por curtidas e comentários, afeta diretamente a autoestima desses jovens.
Outro aspecto preocupante é a interferência no desenvolvimento das habilidades sociais. Crianças e adolescentes estão trocando interações presenciais por conversas via mensagens de texto ou redes sociais. O que pode enfraquecer a capacidade de construir relacionamentos saudáveis. O uso excessivo de celulares pode gerar isolamento social, dificuldades de comunicação verbal e menor empatia nas interações humanas, prejudicando a construção de laços afetivos com familiares e amigos.
Opinião dos especialistas:
"Devemos considerar que o desafio não está na tecnologia, mas sim na forma como a utilizamos. Ao explorarmos as diversas ferramentas disponíveis, como a musicalização, apps de leitura, jogos que estimulam o desenvolvimento cognitivo e até mesmo o aprendizado de idiomas, percebemos que a tecnologia, quando empregada de forma eficaz, favorece um crescimento saudável na infância", explicou a psicóloga Renata Santana de Moura.
"Para a Primeira Infância já possuímos pesquisas que indicam que uso de telas de forma não regulada impacta negativamente para o desenvolvimento cognitivo e social das crianças pequenas. Professores da Educação Infantil podem tirar vantagem dessa nossa regulamentação para propor em sua maioria, atividades que não as utilizem, privilegiando o Brincar livre, o educar da criatividade e o educar da realidade. O uso das telas, não deixa de ser importante quando precisam trazer referências formativas, tais como a ampliação da cultura. Como por exemplo, aproximar as crianças da Artes Visuais quando acessam uma apresentação de ballet de repertório, uma visita virtual para apreciar obras de artes que fazem parte da coleção de um museu no exterior. O importante, como sempre enfatizo, é a formação da equipe pedagógica para que saiba usar com sabedoria essa nova regulamentação, em benefício da formação dessas crianças organizando uma boa proposta pedagógica."
- Roberta Cassará Scalzaretto é especialista na formação de professores voltada para a primeira infância. Com formação em Magistério, Pedagogia e Psicopedagogia, possui vasta experiência em atender tanto crianças com dificuldades de aprendizagem quanto aquelas com altas habilidades intelectuais. Profundamente apaixonada pela educação, foi a idealizadora do projeto "Brinquedoteca: um olhar para o brincar", no colégio Porto Seguro Panamby. Sua carreira foi dedicada a capacitar educadores para atuarem na Educação Infantil e no Ensino Fundamental I, preparando-os para lidar com a diversidade de perfis e necessidades de aprendizado.
Iniciativa Rede Daltro:
Teresa Daltro - diretora da Rede Daltro
"A escola pretende adotar uma abordagem educativa para conscientizar os alunos sobre os benefícios do decreto. Realizaremos palestras e oficinas sobre a importância de manter o foco nas atividades escolares e de desenvolver a interação social dentro do ambiente escolar. Além disso, serão distribuídos comunicados e materiais informativos, explicando de forma clara e objetiva os motivos da proibição e seus benefícios para o aprendizado. A escola também envolverá as famílias nesse processo, promovendo reuniões e encontros para que todos compreendam e apoiem a nova medida.
Se os alunos levarem os celulares, a escola manterá uma postura de acolhimento e orientação, sempre alinhada às regras estabelecidas. Inicialmente, os alunos serão orientados a deixar os aparelhos desligados e guardados, no porta celular em na sala de aula, até o final das atividades escolares. Caso algum aluno utilize o aparelho durante o horário de aula, ele será orientado individualmente. E, se necessário, faremos contato com os responsáveis para alinharmos um acompanhamento conjunto.
Essas ações são pensadas para que todos compreendam o propósito da nova norma e como ela contribuirá para um ambiente de aprendizagem mais focado e saudável".
Iniciativa da Rio Christian School
Preocupada com esses impactos, a Rio Christian School, colégio bilíngue, implementou o programa Desconect Moment para reduzir o uso de celulares entre os alunos, incentivando práticas fora do ambiente digital. A escola criou um sistema de participação e competições mensais entre salas para premiar quem usar menos os aparelhos. Os estudantes guardam seus celulares em lockers e só podem usá-los em casos de emergência. A iniciativa, que conta com apoio pedagógico e psicológico, também aborda sintomas de dependência tecnológica, promovendo uma educação digital mais consciente e equilibrada.
A psicóloga da Rio Christian School, Esther Frozi, está à frente do acompanhamento desses jovens e destaca que muitos deles têm dificuldade em se desvincular das telas, mostrando sinais de dependência tecnológica. "A transição para uma rotina com menos celular é desafiadora para muitos adolescentes. Temos alunos que se sentem perdidos sem o aparelho e demonstram sintomas semelhantes aos de abstinência. Nesses casos, trabalhamos não só com orientação, mas com um acompanhamento psicológico mais próximo. Buscando ajudar os jovens a desenvolverem um relacionamento mais saudável com a tecnologia," afirma Esther.
Trabalho de formiguinha
Ela reforça ainda que o trabalho de conscientização está sendo feito de maneira integrada. Com aulas específicas voltadas para a educação digital e rodas de conversa, onde os alunos são incentivados a compartilhar suas experiências e dificuldades. "A proposta é que eles entendam que o uso do celular deve ser equilibrado. E que existem momentos adequados para desconectar e viver experiências mais reais e significativas," conclui a psicóloga.
Com essas iniciativas, a expectativa é que as crianças e adolescentes sejam incentivados a usar a tecnologia de forma mais consciente. Equilibrando o aprendizado conectado com práticas que promovam seu desenvolvimento pleno. "Nosso objetivo é formar cidadãos preparados para o futuro. E isso envolve ensinar os alunos a encontrar um equilíbrio saudável no uso da tecnologia," conclui Gabriel Frozi.
Nem tudo é positivo, a proibição pode gerar retrocesso:
Uma pesquisa recente lançada pela Mobile Time em colaboração com a Opinion Box revelou dados surpreendentes sobre o uso de smartphones por crianças. De acordo com o estudo denominado "Crianças e Adolescentes com Smartphones no Brasil", aproximadamente 26% das crianças com idades entre 4 e 6 anos já possuem seu próprio aparelho. Mas o dado que mais chama atenção é que, mesmo entre os pequenos de 0 a 3 anos, 7% já têm seu próprio smartphone.
Diante dessas estatísticas, é tentador cair na armadilha de encarar a tecnologia como uma ameaça ao desenvolvimento infantil, algo a ser evitado ou restringido. No entanto, é fundamental ressaltar que essas gerações já nasceram em um mundo dominado pela tecnologia. Para elas, o uso de aparelhos digitais é uma parte integrante do cotidiano desde muito cedo. Diante desse cenário, os pais são incentivados a refletir: como podemos aproveitar a familiaridade das crianças com a tecnologia de maneira construtiva?
É preciso equilibrar o uso do celular
Para os pais preocupados com o impacto da tecnologia na vida de seus filhos, vale a pena lembrar que o estímulo positivo é tudo e investir em uma educação que promova o uso consciente e criativo da tecnologia pode ser a chave para prepará-los para os desafios do século XXI. Marco Giroto, fundador da SuperGeeks, rede de escolas especializadas em competências para o futuro, ressalta que é fundamental entendermos que a tecnologia não é apenas uma ferramenta de entretenimento. Mas sim uma oportunidade de preparar nossas crianças para o futuro. "Acreditamos que os pais podem aproveitar a aptidão natural que as crianças têm pela tecnologia para incentivá-las a desenvolver habilidades que são essenciais em um mundo cada vez mais digitalizado".
Fundada por Marco Giroto, a proposta da SuperGeeks vai além de apenas ensinar programação ou robótica. Os cursos oferecidos são completos e práticos, voltados para capacitar as crianças e estimular a criatividade. Durante as aulas os alunos aprendem desde habilidades básicas de programação até o desenvolvimento de jogos e aplicativos, adquirindo conhecimentos que serão fundamentais para o futuro.
Podemos ver que com a orientação adequada, o uso consciente e criativo da tecnologia pode se tornar uma ferramenta poderosa para o crescimento e aprendizado das crianças. "Na era digital em que vivemos, não se trata apenas de acompanhar a tecnologia, mas sim de estar à frente dela", conclui Giroto.
Personagem:
Kaísa Romagnoli 38 anos, Lorenzo Romagnoli 7 anos e Kethelyn Romagnoli 15 anos
"Em relação aos meus filhos, eu tenho um menino de 7 anos e uma menina de 15 anos, eu acho totalmente inviável para o meu filho de 7 anos utilizar o celular. Mesmo porque ele não vai utilizar para estudar, ele vai utilizar para brincar, ele vai utilizar para essas coisas. Então é totalmente inviável ele ter celular na escola, é inútil, ainda mais que ele está em meio de alfabetização. Eu sou totalmente a favor dessa proibição, porém ela deve ser feita com um certo cuidado."
"Por exemplo, a minha filha de 15 anos, ela estuda numa escola do governo, na escola do governo. Durante o período da aula, caso ela precise fazer alguma consulta na internet, alguma coisa, eles disponibilizam um tablet para acesso à internet. Inclusive, ela faz as provas com esse tablet, então aí a tecnologia e o uso do telefone. Porque muitas vezes algum tablet não está funcionando, ela usa o celular, então a tecnologia e o uso do telefone, porque muitas vezes algum tablet não está funcionando. No próprio telefone, aí sim ajuda, certo?"
"Então ele é usado de uma forma pedagógica, porém seu uso deve ser proibido em sala de aula sim, exceto para essa questão pedagógica. Por quê? Durante a aula, o aluno, principalmente o adolescente, como a minha filha com 15 anos, ele perde totalmente o foco, ele não vai utilizar o telefone para poder fazer pesquisa, muito raramente, não vai acontecer isso."
Uso indevido do celular
O telefone ali vai ser para postar um videozinho no TikTok, para acessar o Instagram, para criar uma rivalidade como já aconteceu. Criar uma rivalidade nos grupos que os jovens criam, um falando da sala do outro, mandando fotos de uma sala. Então o uso do celular de forma pedagógica na escola ele não acontece, ele não acontece mesmo. Porém eu também não acho que o que deve ser proibido assim não precisa. Não vai nem levar o telefone, não, pode levar o telefone, porém utiliza na hora do intervalo. A escola deve fiscalizar esse uso de uma forma mais complexa para o aluno não utilizar em sala."
"Qual seria a minha opinião sobre essa fiscalização na escola? Eu acredito que quando o aluno chegue na sala de aula, ele deveria deixar o celular na mesa do professor, dentro de uma caixa, etiquetadinho, e só utilizar ali em casos de emergências. Quais são os casos de emergências? Eu preciso de falar com a minha mãe porque eu estou passando mal, eu preciso de alguma coisa de extrema urgência, eu preciso pegar um dado no meu telefone ali, eu preciso acessar um documento, porque hoje até os nossos documentos, como identidade, etc., são tudo virtuais, eu vou pegar ali no meu celular com o conhecimento do professor, não ele ficar com o aparelho para ele."
"Inclusive, pode-se, eu acredito que deve-se mandar uma autorização aos pais para que os pais autorizem o professor a fazer. Essa, vamos dizer assim, essa coleta desse celular no período de aula. Eu acho super viável nesse sentido. Agora, deixar o aluno decidir se ele pode ou não usar e como ele deve usar, totalmente equivocado."
Sarah Monteiro - mãe da Maria Helena - 12 anos
"Eu acredito ser um retrocesso. As crianças deveriam aprender a usar a tecnologia a nosso favor. E não uma proibição. Retirar o aparelho não é a solução. Medidas educativas, campanhas de conscientização seriam mais proveitosas e ensinariam os limites entre o que é saudável e o que não é. O celular para mim é também uma maneira de saber se minha filha está bem, para emergências e comunicação".