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Sabe como identificar um psicopata? Especialistas dão dicas

Série ‘Dupla Identidade’, protagonizada por Bruno Gagliasso, reacende discussão sobre o que se passa nas mentes dos assassinos em série

19 set 2014 - 18h44
(atualizado às 18h45)
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Não se deixe seduzir pelos olhos azuis de Bruno Gagliasso. Na série global Dupla Identidade , que estreia nesta sexta-feira (19), seu magnético olhar será um dos artifícios usados pelo serial killer Eduardo Borges para conquistar mocinhas indefesas e cometer uma série de assassinatos mantendo sua imagem acima de qualquer suspeita. Nos 13 episódios da trama de Glória Perez, ele usará armas como sedução, beleza e inteligência para sustentar uma vida paralela sem despertar desconfiança, chegando ao limite da perversidade humana.

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Essa, claro, não é primeira vez que a ardilosa mente dos psicopatas inspira obras de ficção. Quem não se lembra da incrível habilidade de manipulação de personagens como Dexter, Patrick Bateman, de American Psycho, Hannibal e Norman Bates? Mas não se deixe enganar: embora tamanha crueldade pareça inimaginável, há muitos deles espalhados por aí na vida real, perfeitamente encaixados no cotidiano social. O motoboy Francisco Assis Pereira, por exemplo, era um simpático instrutor de patins, muito querido pelas crianças. Seduzia as mulheres com a falsa promessa de ser caça-talentos de uma agência de modelos e acabou entrando para a história como o Maníaco do Parque, autor de 12 assassinatos.

Já Jack, o Estripador, que aterrorizou Londres nos em 1888, conseguiu manter sua identidade em segredo mesmo após a morte. Inspirou filmes, séries, livros e até roteiros turísticos pelos locais de seus crimes. Só agora, 126 anos depois, um exame de DNA que cruzou o material genético de descendentes dos suspeitos com vestígios de sangue encontrados no xale de uma de suas vítimas pôs fim ao mistério: o lendário assassino de prostitutas era o imigrante polonês Adam Kosminski. A descoberta é o tema do livro Naming Jack the Ripper , lançado no último dia 09.

Mas como identificar um psicopata em meio ao círculo de amigos? A psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, autora do livro Mentes Perigosas – O Psicopata Mora ao Lado , dá o alerta: “Eles estão infiltrados em todos os meios sociais, credos, culturas, e são capazes de passar por cima de qualquer pessoa apenas para satisfazer seus sórdidos interesses. Podem arruinar empresas, destruir lares, dar ‘rasteiras’ nos colegas de trabalho, promover-se às custas dos outros, e continuarem acima de qualquer suspeita”.

Tudo isso é culpa do cérebro. Após mapear os de psicopatas, o neuropsiquiatra Ricardo de Oliveira-Souza e o neurologista Jorge Moll atentaram a um detalhe determinante para justificar tal padrão de comportamento: nas áreas cerebrais onde há julgamento moral, a atividade não é igual à de uma pessoa comum, sem transtorno de conduta. Com exame de neuroimagem (ressonância magnética funcional), é possível determinar as falhas nessas partes e no sistema límbico, responsável pelas emoções. Os psicopatas, portanto, jamais saberão a diferença entre estar ou não prejudicando o outro. Em suas cabeças, sempre estão certos e, principalmente, acima do bem e do mal.

A classificação norte-americana de transtornos mentais aponta que 4% da população mundial têm essas características. Do total, 75% são homens e 25%, mulheres. E não há explicação sobre a diferença entre os gêneros. A boa notícia em relação a essa estatística é que o grupo que apresenta psicopatias leves é maioria. Já a má é que a minoria pode estar inserida em sua equipe de trabalho ou até mesmo entre os seus familiares. Por isso, vale se precaver e saber distinguir as diferenças entre um psicótico e um psicopata de fato. A psicoterapeuta Maura de Albanesi esclarece as principais dúvidas a seguir. Confira.

1. Quais as diferenças entre psicose e psicopatia?

A psicose é uma condição psicopatológica clássica, na qual se verifica certa perda de contato com a realidade. Nos momentos de crises mais intensos, podem ocorrer alucinações ou delírios, pensamento desorganizado e/ou paranoide, acentuada inquietude psicomotora, sensações de angústia intensa e de opressão, além de insônia acentuada. Surgem, também, nos momentos de crise, dificuldades de interação social e de cumprir as atividades do dia a dia. Já a psicopatia, também chamada sem distinção de sociopatia, é um transtorno de personalidade que descreve um padrão de comportamento antissocial crônico. O psicopata define-se por uma procura contínua de gratificação psicológica. Em outras palavras, sente satisfação através dos seus comportamentos antissociais, associados a uma falta de consciência. A psicopatia é frequentemente co-mórbida, com outros distúrbios psicológicos (especialmente transtorno de personalidade narcísico).

2.  O que causa?

A psicose acontece devido à falta de um limite na estrutura psíquica que permita que o ego consiga se articular com o superego. Desde a mais tenra idade há a dificuldade de perceber o que sou eu e o que é o outro. Dizemos em psicanálise que o neurótico é aquele que busca o objeto perdido no mundo (este objeto pode ser a perda da placenta no útero materno, por exemplo) e que o psicótico é o que tem esse objeto no bolso, o que aparece no desencadeamento do sentimento de perseguição, de grandeza até a falta de interesse pelo outro.

3. Há doenças cerebrais ou drogas que podem desencadear um quadro psicótico?

Em pessoas com predisposição, o abuso de drogas pode desencadear um quadro de psicose. Se pegarmos, por exemplo, a maconha, quando consumida em exagero, ela pode ser um fator desencadeador. Entretanto, é impossível estabelecer um quadro de consequência causal no qual somente o consumo de maconha levaria ao desencadeamento de uma psicose. Além disso, há dois princípios ativos na maconha: o THC e o CBD, que tem efeitos contrários com relação à psicose. Por isso é importante saber os compostos contidos na maconha. Se ela tem mais THC, favorece o desencadeamento. Entretanto, se possui mais CBD, funciona como um antipsicótico.

4. Quais os principais sintomas da psicose? E as principais características da psicopatia?

Os principais sintomas da psicose são um discurso desarticulado; fala e pensamentos desorganizados e confusos, sem embasamento da realidade, o que constitui os delírios; escutar, ver ou sentir coisas inexistentes (alucinações). Já o psicopata é inteligente, articulado, simpático e sedutor. Sabe manipular as pessoas, é aproveitador, mente com maestria e é totalmente desprovido de empatia ou de emoções morais (como arrependimento, culpa, piedade e vergonha). A característica comum a todo psicopata é a falta do sentimento de culpa, a não preocupação com as consequências de seus atos ao outro ou à sociedade, visando apenas a satisfação de suas vontades.

5. Há formas de tratamento? Quais?

Para as psicoses, sim: medicamentos antipsicóticos e muita terapia.

6.  É possível conseguir a cura completa ou essas pessoas estão fadadas a viverem sob constante suspeita?

A cura, no sentido de não serem mais psicóticos, não é possível, pois uma estrutura não se muda. Todo o tratamento visa capacitar a pessoa a lidar de forma saudável com a sua dificuldade.

7.  Qual a diferença entre um psicopata, um sociopata e um simples neurótico?

Dentro da psicanálise existem três estruturas psíquicas possíveis: a neurose, a psicose e a perversão. A estrutura perversa do psicopata exclui todo e qualquer sentimento e emoções, principalmente a culpa, que nos remete a perceber que fizemos algo de errado. Esta percepção no psicopata não existe, mas ele tem total consciência da realidade e, por não se envolver em sentimentos, manipula os sentimentos dos outros facilmente. O psicopata relaciona-se apenas consigo. O outro é um joguete para suas conquistas. Já a neurose é uma estrutura que, a partir do complexo de édipo, teve o desenvolvimento “normal”, ou seja, a superação do complexo de édipo resultando na estruturação das três instâncias psíquicas (id, ego e superego).

O neurótico é capaz de se perceber e perceber o outro, a culpa está muito presente, e o conflito estabelecido se dá por desejar o que não se pode ter (por exemplo, desejo de roubar um banco ou de ter o marido da amiga), e só este querer gera culpa pelas normas e valores introjetados. É exatamente isso que não ocorre em um psicopata. Para ele tudo é possível. O sociopata se assemelha ao psicopata na infração das regras e normas sociais, na falta do sentimento de culpa e de empatia. Mas, diferentemente do psicopata, o sociopata vai apresentar uma aversão à sociedade.

8. O psicopata tem mesmo a capacidade de manipular todos à volta, como ocorrem com os vilões de filmes e novelas?

A falta de empatia presente no psicopata faz com que ele não tenha compaixão com aqueles à sua volta, enxergando somente suas próprias vontades, sem medir as consequências no outro. Por isso, a questão da manipulação entra em seu comportamento como uma ferramenta para alcançar aquilo que quer. O objetivo do psicopata na manipulação não é necessariamente fazer mal ao outro, mas se isso for preciso para alcançar seu real objetivo, ele não verá o porquê de não fazer.

<p>O motoboy Francisco Assis Pereira, mais conhecido como Maníaco do Parque</p>
O motoboy Francisco Assis Pereira, mais conhecido como Maníaco do Parque
Foto: Wikimedia

9. Há vários casos de serial killers da vida real que entraram para a história, como Jack O Estripador, o Maníaco do Parque e tantos outros... Todos eles podem ser considerados psicopatas?

Como dito anteriormente, existem três tipos de estruturas psíquicas e todas estão sujeitas a conflitos. Não é possível dizer que todos aqueles que cometem algum tipo de assassinato ou violência contra o outro seja um psicopata. Dentre os psicopatas, há uma parcela que se torna serial killer, mas não são todos.

10. Como se precaver quando há suspeita de estar diante de um psicopata?

Quando suspeita estar diante de um, é importante realmente avaliar o que está implicado nessa sua suspeita. Muitas vezes pode se tratar de rejeições e angústias pessoais que acabamos transferindo ao outro. Caso não seja uma projeção de seus próprios sentimentos, o mais aconselhável é se afastar dessa pessoa. 

11. Por causa do apelo midiático, muita gente associa o termo “psicopata” com assassinos em série ou pessoas desprovidas de sentimentos. Isso está correto? Todo psicopata representa, de fato, um perigo à sociedade?

Os seriais killers representam um perigo à sociedade, entretanto ser um psicopata não implica ser um serial killer. Há características do psicopata que podem ser utilizadas positivamente pela sociedade, como sua organização, sua percepção ao detalhe e mesmo sua capacidade de manipulação, se esta for usada com outros objetivos.

12. A próxima série da Rede Globo, Dupla Identidade , voltará a abordar o tema. O termo “dupla identidade” se encaixa bem aos casos de psicopatia ou nem todo mundo que apresenta transtorno de dupla personalidade é necessariamente um psicopata e vice-versa?

Duas faces se encaixariam melhor a um caso de psicopatia, porque como dizemos comumente, duas faces é aquela pessoa que tem consciência dos dois papéis que ocupa e os ocupa para seu próprio benefício. Entretanto, no caso da dupla personalidade, estamos falando de uma psicose e não de uma perversão (como é a psicopatia). Isso quer dizer que a pessoa com dupla personalidade não tem consciência que muda de papéis. É como se sua mente fosse realmente dividida em dois, e que um mesmo corpo tivesse duas consciências. Quando uma está ativa, a outra está desligada e vice-versa.

13. Na trama da Rede Globo, Débora Falabella interpretará uma portadora da síndrome de Borderline que acabará virando um álibi para o serial killer. O que é o Borderline e o que o difere das psicoses em geral?

O Borderline é uma estrutura que se encontra no limite da neurose para a psicose, é viver em um extremo. Imagine uma pessoa à beira de um precipício, do qual não sabemos se ela vai pular ou não e qual vai ser o fator desencadeador: este pode ser tanto um vento forte (alguma circunstância do meio que a envolva) ou o desejo de pular (algum conflito interno). O Borderline ainda tem a capacidade de refletir sobre suas próprias ações e reconhece aquilo que é real e aquilo que é imaginário. Entretanto, muitas vezes o imaginário invade o real, principalmente o real do corpo. O Borderline é a fronteira limítrofe que difere entre um estado de irritabilidade considerado normal diante de uma situação e esse estado extremamente exagerado, que não condiz com a situação em si. Por exemplo, se uma pessoa pisa em seu pé, você tem um ataque de fúria e quase a enforca. O fato desencadeante da fúria não é justificável, podendo levar a uma crise.

14.  É comum o psicopata (viciado em manipulação, controle e poder) buscar mulheres com baixa estima e personalidade fluida, daquelas que só conseguem construir uma identidade através de um vínculo afetivo? Por quê?

As pessoas que possuem uma baixa autoestima e que são bastante vulneráveis à avaliação do outro costumam ser mais facilmente manipuláveis porque, na busca de serem amadas, acabam se envolvendo mais facilmente em chantagens emocionais. Ao perceber essa fraqueza no outro, o psicopata a enxerga como uma ferramenta a ser manuseada.

Fonte: Ponto a Ponto Ideias Ponto a Ponto Ideias
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