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Saiba como personalidades podem driblar a cultura do cancelamento na internet

Respostas rápidas e que abordem a polêmica de forma esclarecedora são alguns caminhos

8 out 2020 - 13h05
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"Não adianta chorar pelo leite derramado". Essa expressão popular amplamente conhecida expressa a tristeza por algo que já ocorreu e que não adianta mais se lamentar. Muitas personalidades foram 'canceladas' na internet desde 2019, quando o termo começou a ganhar mais notoriedade. Algumas se arrependeram de ter omitido opinião nas redes sociais.

O cancelamento é a ação de deslegitimar a presença de pessoas ou organizações no debate público, seja por causa de um erro cometido ou de algo que tenha gerado reação negativa.

Subentende-se que não é aceitável que determinada parte reivindique espaço para se posicionar, como no caso em que o youtuber e empresário Felipe Neto sugeriu que Neymar deveria se manifestar sobre o assassinato de George Floyd, que originou o movimento Vidas Negras Importam.

Após as ameaças de cancelamento, ele argumentou: "Apaguei o tweet sobre o silêncio do Neymar após mensagens de integrantes do movimento negro, mostrando que um branco não deve cobrar de um negro sobre pautas racistas. De fato, não é meu papel cobrar o Neymar sobre isso. Vou seguir tentando ajudar, aprendendo e corrigindo quando errar". Apesar disso, Felipe Neto acrescentou: "Isso não muda o fato de eu condenar o silêncio do jogador, que é, disparado, o maior influenciador digital brasileiro no mundo, mas que se silencia a respeito de quase todas as pautas humanitárias e sociais que assolam seu país de origem e se espalham pelo planeta".

No Twitter, o influenciador digital Felipe Neto falou sobre racismo e quase foi 'cancelado'
No Twitter, o influenciador digital Felipe Neto falou sobre racismo e quase foi 'cancelado'
Foto: Twitter/@felipeneto / Estadão
Felipe Neto argumentou que não tem lugar de fala quando o assunto é racismo
Felipe Neto argumentou que não tem lugar de fala quando o assunto é racismo
Foto: Twitter/@felipeneto / Estadão

Depois da polêmica, Neymar acabou se posicionando a respeito do movimento antiracista.

Em julho, a chef de cozinha Paola Carosella foi acusada de gordofobia ao criticar um nugget feito por uma impressora 3D. A jurada do MasterChef afirmou que é preciso priorizar a alimentação saudável e que alimentos ultraprocessados causam obesidade. A internauta Fernanda Imamura rebateu a chef, dizendo que não se pode associar maus hábitos alimentares à pessoas gordas.

Paola Carosella, jurada do 'MasterChef', falou sobre polêmica a respeito da obesidade e gordofobia
Paola Carosella, jurada do 'MasterChef', falou sobre polêmica a respeito da obesidade e gordofobia
Foto: Twitter/@PaolaCarosella / Estadão

Para tentar entender a situação e driblar o cancelamento, Paola Carosella chamou a pesquisadora Beatriz Klimeck, doutoranda em Saúde Coletiva no Programa de Pós-Graduação do Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), para falar sobre a relação que envolve os conceitos de obesidade e gordofobia.

Ao dar espaço para o debate depois de ser duramente criticada, Paola recebeu diversos elogios. "É uma estratégia que busca dar uma resposta imediata a partir de uma ação efetiva de reparação do erro. Os elogios que recebeu são provas de um resultado positivo, mas o público se manterá vigilante por algum tempo, então, será necessário evidenciar uma mudança de atitude ao longo do tempo", avalia o professor Eric Messa, coordenador do Núcleo de Mídia Digital da FAAP.

Assista ao vídeo:

O humor, obviamente, não escapa da cultura de cancelamento também. O programa Porta dos Fundos, cuja origem é cibernética, foi alvo de críticas por associar pessoas gordas à doenças. Um vídeo, intitulado 'Teste do covid', foi ocultado pelo grupo após receber críticas por ser considerado gordofóbico. Nas imagens, o ator Fábio de Luca aparece comendo sem parar e dando a entender que 'nem o coronavírus gostaria de viver em um organismo podre'.

Como uma forma de explicar o processo criativo e pedir desculpas para quem se sentiu ofendido, Fábio Porchat conversou, em uma live, com a influenciadora digital Bianca Barroca. "Todos nós fizemos a leitura dos roteiros. E o mais curioso é que passou por todo mundo e não pensamos que seria gordofóbico. No texto inicial, não tem indicação nenhuma de ator, se era gordo ou magro. Era um vídeo onde a piada central do vídeo era uma pessoa que o organismo está 'tão podre' que o coronavírus não quer ficar lá dentro (...) O importante é conversar com as pessoas. Vamos conversar com as pessoas, aprender com os erros", afirmou Porchat.

Será que conversar com as partes ofendidas pode fazer com que a personalidade repare o dano à imagem após o cancelamento? Na opinião de Viviane Vicente, consultora de Comportamento Organizacional e Competência Cultural, é uma ótima estratégia, mas tem um porém: "Desde que reflita um sentimento sincero em reavaliar a conduta adotada, sim. Alguém, cuja influência seja tão ampla, deve usar sua plataforma também para provocar discussões abertas e respeitosas sobre o tema", diz.

Assista ao vídeo:

Como driblar a cultura do cancelamento e promover reflexões

Dar espaço a opiniões diversas, consultar estudiosos e ouvir os que foram diretamente ofendidos pelo ato, pode ajudar a demonstrar a seriedade de quem errou - afinal, todos erramos em algum momento da vida. Esses são alguns dos elementos fundamentais para tentar driblar a cultura do cancelamento.

"A disposição em aprender mais sobre como o nosso comportamento afeta os outros é um sinal de maturidade emocional e profissional. Essa - ou qualquer outra estratégia - pode não reverter a opinião de todos os "canceladores", mas esse é um risco que atinge a todos; o importante é fazer a coisa certa, ainda que nem todos estejam dispostos a dar uma segunda chance", considera a consultora de Comportamento Organizacional e Competência Cultural Viviane Vicente.

A reconstrução da imagem de uma personalidade é possível e depende inicialmente de uma resposta rápida com o possível reconhecimento do erro cometido e posteriormente a capacidade de evidenciar uma nova atitude, para Eric Messa, coordenador do Núcleo de Mídia Digital da FAAP: "Evidenciar um posicionamento em relação às diversas questões do mundo é uma forma que encontramos de construção de identidade, assim, uma figura pública pode utilizar-se dessa estratégia para determinar o seu lugar e evidenciar sua imagem frente ao seu público".

Apesar disso, o professor ressalta que é preciso cuidado, pois o posicionamento demanda certo conhecimento sobre o assunto tratado. "Se for o caso, é mais proveitoso reconhecer a falta de intimidade com o assunto e sua atitude para mudar, como foi o caso da Anitta ao convidar Gabriela Prioli para discutir política, em resposta à cobrança do seu público para que ela se posicionasse sobre temas da política", lembra.

Estadão
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