Com bom humor, guru do sexo de 90 anos faz sucesso na Índia
Em 50 anos de carreira, colunista acredita que já respondeu mais de 35 mil perguntas
O país que deu ao mundo o Kama Sutra aprende sobre sexo com um senhor de 90 anos. A coluna diária de Mahinder Watsa, franca e engraçada, tornou-se um cult na Índia, onde a educação sexual é um assunto polêmico. "Sexo é uma coisa alegre", diz Watsa "mas alguns escritores lidam com isso de forma médica e séria."
Como colunista nos últimos 50 anos, Watsa deixa o leitor à vontade, em vez de ir pelo caminho científico ou moral. Suas respostas são curtas e vão direto ao ponto - ocasionalmente agressivas, muitas vezes hilárias. "Estou falando a língua deles."
Um leitor pergunta. "Há dois dias, eu tive relações sexuais sem proteção com minha namorada. Compramos uma "pílula do dia seguinte" mas, no calor do momento, eu tomei no lugar dela. Isso pode me causar complicações?". Responde o colunista. "Da próxima vez, por favor, use camisinha e certifique-se que você não vai engolir isso também".
Um outro disse: "depois de fazer sexo quatro vezes por dia, fico fraco no dia seguinte. Por cerca de cinco minutos, minha visão fica branca e não consigo ver nada. Por favor, ajude-me.". Watsa rebate: "o que você esperava? Gritos de 'Viva' e 'Eu sou um campeão' por toda a cidade?".
Em uma questão, o leitor pergunta se é seguro dormir com o pênis dentro da vagina. "Normalmente, quando o pênis retorna ao estado flácido, desliza para fora da vagina. Mesmo se não o fizer, fique tranquilo, que a vagina não vai comê-lo de café da manhã", devolveu o colunista.
Virgindade
Watsa recebe cerca de 60 cartas e e-mails por dia e responde a todas. Acha que já respondeu a mais de 35 mil perguntas.
Ele foi convidado a escrever uma coluna estilo "Querido Doutor" nos anos 1960 por uma revista feminina (Trend). Tinha quase 40 anos e se formara recentemente como médico. "Não tinha muita experiência, confesso."
Nos primeiros meses, as perguntas eram de medicina em geral – sobre pediatria e coisas do tipo - mas começaram a chegar cartas de jovens mulheres de locais distantes com problemas.
Contavam que um tio ou um alguém mais velho havia abusado delas quando eram adolescentes e temiam não se casarem por terem perdido a virgindade. "Muitas sugeriam que cometeriam suicídio", disse Watsa. "Um hímem intacto é muito importante nessa parte do mundo."
Tudo que ele podia fazer era aconselhá-las a não entrar em pânico no dia do casamento. "Não se preocupe, seu marido não vai perceber."
Hoje em dia, Watsa é bem mais direto. Ele explica que o hímen pode romper ao fazer o exercício físico ou com masturbação, o que não podia fazer na época.
O especialista percebeu que muitos dos problemas dos leitores decorriam de falta de educação sexual, o que acabou tornando a conscientização sobre o sexo um objetivo de sua vida, primeiro por meio da Associação de Planejamento Familiar da Índia (FPAI, sigla em inglês) e, posteriormente, da sua própria organização, o Conselho Internacional de Educação Sexual e Familiar (CSEPI, sigla em inglês). Enquanto isso, continuava escrevendo.
Recebe cartas sobre hímen rompido até hoje. "Infelizmente, o tema ainda é muito forte." Os homens que escrevem para lançar dúvidas sobre a virgindade da sua parceira recebem pouca atenção.
Um leitor questiona: "minha namorada e eu temos 22 anos de idade. Tivemos relações sexuais há alguns meses, pela primeira vez, mas ela não sangrou. Como posso identificar se ela é virgem?". Watsa respondeu de forma direta: "é dessa maneira que você ama sua namorada? Você é uma pessoa suspeita. Você nunca ouviu falar que existem várias outras maneiras pelas quais o hímen pode romper, como ao praticar um esporte?".
Watsa tampouco tem papas na língua com aqueles mais preocupados com o tamanho do seu órgão sexual. "Tenho um pênis pequeno e não consigo satisfazer minha namorada. Meu astrólogo me aconselhou a puxá-lo todo dia por 15 minutos, enquanto faço uma oração. Venho fazendo isso há um mês e não tem ajudado. O que devo fazer?", questinoou um homem. "Se isto fosse correto, a maioria dos homens teria o pênis no joelho. Deus não ajuda homens ingênuos, bobos. Vá a um especialista em sexualidade que lhe ensine a arte de fazer amor", rebateu o colunista.
'Obscenidade'
Por anos, Watsa escreveu para revistas femininas e masculinas e websites, mas em nenhuma publicação seus escritos fizeram mais sucesso que no Mumbai Mirror.
Há dez anos, quando tinha 80 anos de idade, ele iniciou a coluna Pergunte ao Sexpert, a primeira coluna diária em um jornal indiano que abordou as inquietações sexuais dos leitores. "Até começarmos a coluna, a mídia indiana raramente usava palavras como pênis e vagina", diz Meenal Baghel, editora do jornal. A iniciativa imediatamente atraiu muita atenção, e nem sempre positiva.
Baghel teve de lidar com acusações de obscenidade e ações e mensagens de ódio, mas achava que os benefícios de publicar a coluna valiam a pena. "Ele é, sem dúvida, a estrela do jornal", diz a editora.
Ela sabe de cor a sua resposta favorita de Watsa a um leitor. "Alguém perguntou a ele se o pênis pode encolher devido à masturbação repetida. Sua resposta foi: você fala muito, sua língua encolheu?"
Com criatividade e paciência infinitas, Watsa encontra novas maneiras de responder às mesmas perguntas feitas há décadas.
Muito de seu trabalho envolve algo conhecido como 'dar permissão'- tranquilizar as pessoas de que seu comportamento sexual é normal e inofensivo. "O problema ainda é masturbação", diz Watsa.
Homens ansiosos questionam se a masturbação vai levá-los a perder a força, o cabelo ou a capacidade de ter filhos. A ideia de que a perda de sêmen é prejudicial para a saúde de um homem é reforçada por sistemas de crenças tradicionais.
Ele também testemunhou grandes mudanças. "Há trinta anos, poucas mulheres me escreviam. Agora, são muitas." E elas não têm apenas questões práticas sobre como engravidar ou não: nos últimos anos, começaram a perguntar sobre satisfação sexual e masturbação. Ele responde com o mesmo humor.
Uma delas, levantou a questão de uma colega. "Minha amiga acha que seus seios estão ficando maiores por causa da masturbação. Isso é possível?". O especialista respondeu, com bom humor: "não. Ela acha que o clitóris é uma bomba de ar?".
Apesar destes sinais de emancipação das mulheres, Watsa diz que ainda fica ocasionalmente chocado com o que suas leitoras aguentam. "Quando elas escrevem sobre o abuso sexual, tortura e o que seus maridos fazem com elas quando estão bêbados eu me preocupo", diz.
Watsa também lamenta o fim das grandes famílias onde várias gerações viviam sob o mesmo teto. "Havia sempre tias ou avós que poderiam explicar as coisas para os casais mais jovens", diz ele. "Agora ninguém está lá para explicar como funciona o sexo. Ouço falar de um monte de casamentos não consumados."
Casamentos arranjados entre pessoas que não se conhecem ainda são comuns, diz Watsa. "Eles esperam consumar um casamento de imediato, mas no Kama Sutra há uma parte que diz que se leva de quatro a cinco dias para fazer amigos e entender uns aos outros", diz.
Para um estudo acadêmico, a ginecologista e militante Suchitra Dalvie analisou mais de 500 cartas recebidas por Watsa em um período de quatro meses. Quando ela apresentou as suas conclusões em uma conferência em Pequim, o público ficou fascinado pelas contradições da Índia.
Todos conheciam o país como a "terra mística do Kama Sutra" - o antigo texto sânscrito sobre a arte do amor e do prazer sensual - e ficaram surpresos ao saber sobre o nível rudimentar de educação sexual ou mesmo sobre a discussão clara sobre sexo no país.
A coluna de Watsa é um dos tratamentos mais francos sobre o assunto há 2 mil anos.