"Pressa é a grande inimiga da carne saborosa", diz Francis Mallmann
Quando o assunto é futebol, a rivalidade entre Brasil e Argentina pode virar motivo de briga séria. Mas se estamos falando de churrasco, sempre é bom ouvir um especialista 'hermano'. Nascido na Patagônia, o chef Francis Mallmann é considerado um dos melhores do mundo em preparar uma boa carne. Seja na grelha, no forno a lenha ou no fogão, ele é adepto do modo rústico de fazer comida, que foge de molhos elaborados e ingredientes requintados, mas traz um estilo típico argentino que agrada desde clientes a especialistas e celebridades. “O segredo para o churrasco perfeito é ter muita paciência e tempo para prepará-lo. A pressa é a grande inimiga da carne saborosa”, garante.
Filho de pai argentino e mãe uruguaia, Mallmann se interessou por gastronomia desde jovem. Começou trabalhando em um restaurante em Bariloche, mudou-se para Paris para aperfeiçoar seus métodos na cozinha e voltou à Argentina anos depois para criar receitas com a cara da cultura andina, inspirada nos gaúchos, na fronteira e nos índios. Tudo de um jeito simples e bem saboroso.
Seguindo essa ideia, ele abriu quatro restaurantes fixos (Patagonia Sur, em Buenos Aires; 1984, em Mendoza; Los Negros, em Punta del Leste; e Garzón, no Uruguai) e um temporário em Trancoso, na Bahia. Mas a relação com o Brasil não para por aí. Em visita recente a São Paulo para divulgar o menu do seu próximo restaurante, Siete Fuegos, que será inaugurado no início de 2013 em Mendoza, ele elogiou a tradicional feijoada brasileira e contou ter uma “forte ligação” com o País. “Fazer churrasco está no sangue dos brasileiros, principalmente dos gaúchos", disse.
Além de chef e empresário, ele também é apresentador de TV e autor do livro Sete Fogos – Churrasco ao estilo Argentino, que foi lançado no Brasil em 2011 com mais de 100 receitas, e ganhou o prêmio de Melhor Melhor Livro de Churrasco do Mundo, do Gourmand Cookbook Award. O título faz referência aos tipos de fogos usados por Mallmann no preparo de alimentos, desde grelha ao barro.
Em entrevista para o Terra, ele falou sobre o sucesso das parrillas (grelhas móveis) argentinas por aqui, a paixão dos brasileiros por churrascos e os segredos para preparar uma boa carne. Confira a seguir.
Terra: Como surgiu seu primeiro contato com a gastronomia? Quando decidiu ser chef?
Francis Mallmann: Me interessei por gastronomia desde muito jovem. Aos 20 anos, trabalhei em um restaurante em Bariloche e, com o tempo, decidi morar na França para aprimorar meus conhecimentos e aprender com grandes chefs. Dois anos depois, voltei para a Argentina. Como sempre me encantei pelo fogo e preparei alimentos grelhados e assados, resolvi escrever um livro, o Sete Fogos, que traz receitas com carne, frango, peixe e legumes.
Terra: Você veio a São Paulo apresentar o menu do Sete Fogos, que será inaugurado em Mendoza no ano que vem. Por que escolheu o Brasil para divulgar o restaurante?
FM: Porque eu tenho uma relação muito forte com o Brasil e porque brasileiro gosta de churrasco. Antes de vir a São Paulo, também apresentei o cardápio em Nova York e São Francisco.
Terra: A que você atribui esse sucesso recente das parrillas argentinas por aqui?
FM: Fazer churrasco está no sangue dos brasileiros, principalmente dos gaúchos. A pampa começa no Rio Grande do Sul, se estende por todo o Uruguai e termina na Argentina, o que quer dizer que existe o mesmo pasto para todos os países, o que muda é a maneira de preparar a carne.
Terra: Quais são as principais contribuições que a cozinha argentina traz para o Brasil?
FM: Acredito que a parrilla e o chimichurri.
Terra: Tem algum prato brasileiro que você mais gosta?
FM: Sou um admirador da cozinha brasileira. Gosto muito de feijoada e arroz branco, mas não costumo preparar. Como apenas quando estou em Trancoso (na Bahia) ou em São Paulo.
Terra: Você já cozinhou para celebridades como Madonna e Ralph Lauren e seu livro foi considerado o melhor do mundo em churrasco. Como você lida com esse sucesso?
FM: Eu não me importo com prêmios. Acredito que o caminho que leva ao sucesso é o mesmo que leva ao fracasso. São dois impostores. Por isso, não vejo esse reconhecimento como uma coisa grandiosa.
Terra: A carne argentina é considerada uma das melhores do mundo. Para você, quais são os passos para fazer um autêntico churrasco argentino?
FM: O segredo para o churrasco perfeito é ter muita paciência e tempo para prepará-lo. A pressa é a grande inimiga da carne saborosa. Meu conselho é acender o fogo duas horas antes de começar o churrasco, assar os pedaços de carne espaçadamente e depois de pronta, deixar a peça descansar por 15 minutos antes de cortá-la. No final, comer com o tradicional chimichurri argentino.
Terra: Ainda tem tempo para fazer churrasco por “lazer”?
FM: Sim, claro. Do mesmo jeito que preparei churrasco em São Paulo, Nova York e São Francisco, também faço em casa.
Terra: Para você, qual é o melhor acompanhamento para uma boa carne?
FM: Batata e salada. Não precisa de mais nada.
Terra: Há um corte de carne que você tenha eleito como seu preferido?
FM: Tapa de ojo de bife (contrafilé).
Terra: Há também algum corte de carne brasileira que você aprecie?
FM: A picanha.
Terra: Como é o seu processo para criar novos pratos e montar um menu?
FM: Sempre levo em consideração a aceitação das pessoas de cada região, produtos disponíveis e época dos alimentos. Em Trancoso, por exemplo, gosto muito de usar pescados para preparar os pratos, como o peixe vermelho, de Porto Seguro. Em Mendoza, usamos animais das montanhas e em Buenos Aires pescadas do Mar del Plata. O menu varia de acordo com a cultura de cada lugar e com a sazonalidade dos alimentos.
Terra: Em casa, no dia a dia, você também prepara pratos elaborados?
FM: Em casa, normalmente eu como com meus filhos - tenho seis. Nós costumamos fazer algo mais simples, como macarrão com limão e uma salada de repolho colorado.
Terra: Se você pudesse escolher um prato argentino imperdível, que todo o mundo precisa conhecer, qual seria?
FM: Nhoque de batata e ovos gramajo (servido em tiras).