Médico faz dieta à base de carne para investigar riscos
Pesquisadores concluíram que um consumo de "baixas quantidades de carne – mas não zero – pode ser benéfico à saúde"
O risco de se comer carne já foi tema de muitas reportagens, mas ele é justificado? O médico britânico Michael Mosley tem investigado a verdade por trás das manchetes sobre o assunto para o programa BBC Horizon.
Mosley se submeteu a uma dieta à base de carne para entender melhor os riscos. Confira abaixo seu depoimento:
"Eu gosto de comer carne, mas o que era um prazer inocente agora é uma atividade que gera culpa. Se você acredita nas manchetes, entregar-se regularmente a um bife ou a um sanduíche com bacon aumenta as chances de sofrer de doenças do coração e câncer. Os jornais e revistas dizem que a ameaça à saúde não vem do consumo de carne branca, como frango, mas de carne vermelha e processada.
Apesar das manchetes negativas, em média os britânicos ainda comem 70 gramas de carne vermelha e processada por dia – sendo que um quarto dos homens come o dobro disso.
Minha mulher, Clare, tem tentado por muitos anos cortar o consumo de carne vermelha e processada na família. Eu, porém, sempre resistia. Então nós dois ficamos entusiasmados quando o BBC Horizon se propôs a investigar quais são os verdadeiros riscos desse comportamento.
Eu visitei numerosos especialistas e perguntei o que eles costumavam comer. Também decidi adotar uma dieta rica em carnes para verificar os efeitos de dobrar meu consumo de carne para cerca de 130 gramas por dia.
Gorduras
Há muitas coisas boas na carne vermelha. Ela é uma grande fonte de proteínas e nutrientes essenciais, como o ferro e a vitamina B12, que são essenciais para a saúde.
O lado negativo, porém, é que a carne vermelha e processada tende a ter mais gorduras saturadas. Bacon e salsichas têm 16 vezes mais gordura saturada que o tofu. E se você é um vegetariano que come queijo, não ache que você está em situação melhor. Isso porque o queijo é uma fonte ainda maior de gordura saturada que os hambúrgueres.
Mas por que isso importa?
Uma das melhores maneiras de medir o impacto de um alimento em particular em nossa saúde é fazer estudos com grandes grupos de pessoas com dietas variadas. É preciso descobrir o que elas comem e monitorá-las por muitos anos para descobrir quais doenças elas desenvolvem.
Mortalidade
O professor Walter Willett, da Escola de Saúde Pública da Universidade de Harvord, lidera uma equipe que vem monitorando a dieta de milhares de pessoas por muitos anos.
"Nós descobrimos que pessoas que consumiram grandes quantidades de carne vermelha tiveram um risco total mais alto de mortalidade e incidência de câncer e doenças cardiovasculares", ele me disse em um restaurante em Harvard onde eu comia um grande bife.
Baseado em um de seus estudos, ele estima que o consumo regular de uma pequena quantidade de carne não processada (85 g) está associado a uma elevação de 13% no risco de mortalidade. Já a ingestão de uma quantia similar de carne processada (um cachorro quente ou duas fatias de bacon) está associado a uma elevação do risco em 20%. Não é surpreendente que ele nunca coma carne.
O pesquisador tem argumentos extremamente convincentes, mas eu descobri que suas descobertas não batem com os resultados de um estudo europeu de 2013 publicado na publicação médica BMC Medicine.
Os pesquisadores do Epic (sigla do estudo Investigação Europeia Prospectiva em Câncer e Nutrição) seguiram meio milhão de pessoas em dez países por mais de 12 anos.
Eles descobriram que comer quantidades moderadas de carne vermelha não causa efeitos na mortalidade. Os menores índices de mortalidade incidiram sobre as pessoas que consumiam cerca de 80 g de carne por dia.
Apesar de ter havido um pequeno aumento de risco geral para aqueles que comem mais de 160 g, o estudo também apontou uma taxa de morte (por todas as causas) semelhante entre aqueles que não comiam carne.
Os pesquisadores concluíram que um consumo de "baixas quantidades de carne – mas não zero – pode ser benéfico à saúde. Isso é compreensível na medida em que a carne é uma importante fonte de nutrientes, como proteína, ferro, zinco, diversas vitaminas B assim como a vitamina A e ácidos graxos".
Riscos da carne processada
Antes que os comedores de carne comecem a festejar é preciso dizer que há um porém. O estudo Epic, assim como muitos outros, mostrou que comer carne processada, como bacon, presunto ou salame, traz um efeito negativo sobre a saúde. Qualquer quantidade acima de 40 gramas faz a taxa de mortalidade aumentar.
Mas a ciência está longe de se consolidar. Os especialistas que eu encontrei têm diferentes opiniões, que se refletem no que eles mesmos comem. Neste BBC Horizon nós tentamos apresentar os fatos, mas só você pode decidir onde está a verdade.
Comer mais carne processada certamente teve um efeito negativo em meu corpo. Depois de um mês comendo sanduíches de bacon e hambúrgueres eu tive um aumento de peso, pressão sanguínea e colesterol.
Eu voltei para a minha velha dieta, comendo ocasionalmente bife e carne de porco. Mas com certeza comerei menos hambúrgueres e salsichas nos churrascos deste ano."