Carne de cação é feita de tubarão? Descubra o que você come
Segundo especialista, legislação permite que a carne de diversas espécies de tubarão seja vendida como “cação”.
É bem possível que você não saiba, mas ao fazer um prato com a carne de cação comprada na peixaria ou no mercado, na verdade você está colocando tubarão na sua mesa, sem ao menos saber de qual espécie ele é.
Cação é um termo genérico que se refere a vários tipos de tubarão. André Medeiros, professor universitário da Universidade Santa Úrsula e da Universidade Iguaçu (RJ) e pesquisador na área de pescado, explica que tubarão é o nome dado para o animal vivo, enquanto comercialmente o termo utilizado é “cação”, isso vale para qualquer parte dele que for usada na alimentação ou na indústria farmacêutica.
A palavra cação é derivada do nome em espanhol, cazón, que era atribuído a uma espécie específica de tubarão. “É permitido pela legislação brasileira chamar a carne de tubarão de cação. A gente tem uma lei, a portaria MAPA n. 570 de 2023, super recente, que atualizou uma lei que já existia, mas isso já é permitido há muito tempo. O problema é que trás uma grande confusão para o consumidor”, explica o professor.
Desinformação sobre o assunto é grande
Segundo uma pesquisa feita pela Blend Research e a Sea Shepherd Brasil em 2021, 69% dos brasileiros não associam o tubarão ao cação. O que mostra que a desinformação é grande e o nome diz pouca coisa para o consumidor.
“Sempre falo na sala de aula: cação é o que você come e tubarão é o que come você. Por que é apenas uma questão de nomenclatura. As pessoas não sabem o que estão comendo”, diz.
Há quem diga que para ser cação tem que ser filhote ou ter menos de 1m20, porém, isso não é verdade. De acordo com o especialista, essa falta de informação confunde a cabeça do consumidor e dificulta a gestão dos níveis de conservação, já que não é possível saber qual espécie está sendo vendida com o nome de cação.
Impactos ambientais
Muitas organizações ambientais alertam para o fato de que a pesca de tubarões tem impactos significativos nos ecossistemas marinhos. Os tubarões são importantes predadores que ajudam a manter o equilíbrio das cadeias alimentares marinhas, controlando a população de outras espécies e garantindo a saúde dos ecossistemas.
Além disso, muitas espécies de tubarão são ameaçadas de extinção devido à pesca excessiva e à degradação dos habitats marinhos. Estima-se que cerca de um quarto das espécies de tubarão estejam atualmente em risco de extinção.
Por esse motivo, muitos ativistas defendem o boicote à carne de cação e a adoção de práticas de pesca sustentáveis que respeitem os limites dos ecossistemas marinhos. Um bom exemplo é o trabalho da Sea Shepherd Brasil com sua campanha “Cação é tubarão”, que tem como objetivo alertar a sociedade sobre a questão.
Afinal, posso comer carne de tubarão?
Muito se fala sobre não poder comer a carne de tubarão por conta das substâncias nocivas que ele acumula. Porém, André explica que o consumo pode ser feito com equilíbrio. “Não é recomendado comer no café da manhã, almoço e janta, sete dias na semana, é preciso fazer o consumo equilibradamente”.
Vamos à explicação. Como eles estão no topo da cadeia alimentar, um processo chamado “bioacumulação” ocorre.
“Imagina assim, o plâncton tem um pouquinho de metal tóxico, vem um peixe e come esse plâncton, aí o peixe vai ter o metal tóxico do ambiente e do plâncton, vem outro peixe e come ele. Quando chega no tubarão, ele tem a tendência a ter maior bioacumulação desses metais tóxicos, até porque, vive mais que outros animais”.
Então sim, é verdade que os tubarões podem acumular mais metais tóxicos, como o mercúrio, porém, qualquer animal que faça parte do topo da cadeia alimentar, ou seja, um peixe carnívoro e predador, passará pelo mesmo processo, como o peixe-espada e o atum.
Exatamente por isso o professor recomenda que a carne não seja consumida com frequência, porém, é possível que uma vez ou outra ela faça parte da sua alimentação.
Além disso, ele informa que os tubarões fazem parte do grupo elasmobrânquios, composto por peixes cartilaginosos, que não possuem esqueleto ósseo. Esses animais possuem grande quantidade de ureia no sangue, “isso acontece para que possam fazer o equilíbrio osmótico em relação ao sal da água do mar”.
Isso faz com que o tubarão viva bem, porém, na hora do abate é necessário que seja realizada uma sangria imediata no animal.
“Se o sangue não for retirado o quanto antes e começar o processo de deterioração dessa carne, a ureia pode se impregnar na musculatura dele e quando essas bactérias crescerem vão transformar a ureia em formato de amônia, aí você vai ter uma carne com cheiro e gosto de amônia, xixi”, explica.
“Por conta dessa história”, conta André, “é uma carne barata perante as outras carnes de peixe”.
Se você quiser se aprofundar ainda mais sobre o assunto, André Medeiros indica seu livro digital Qualidade e Segurança do Pescado - Coletânea de artigos técnicos.