Dry aged: carne com aspecto de estragada vira febre em restaurantes
Para ficar com esse aspecto e macia, carne é curada por até 90 dias antes do consumo; peça pode custar até R$ 900
Uma carne escura com aspecto de estragada - conhecida como dry aged, devido a técnica de maturação, que dura de 15 a 90 dias - tem feito sucesso em churrascarias e é considerada nobre e cara.
A peça da carne perde parte a umidade nesse processo que inclui mudanças de temperaturas e variações de ventilação e passa por reações naturais que realçam o seu sabor, a tornam mais macia e tenra.
"A técnica surgiu há cerca de 80 anos, nos Estados Unidos. Os açougueiros perceberam que deixar a carne em um gancho entre 15 e 30 dias deixava a carne com um gosto e maciez melhor. Com o tempo, adaptaram a técnica e acabou se disseminando pelas churrascarias", explicou em entrevista ao jornal O Globo István Wessel, líder de uma empresa especializada na técnica no Brasil.
Como essa carne é feita?
Para realizar esse processo de forma segura, as peças são penduradas em câmaras refrigeradas, entre -1°C e 4°C, com umidade de 75% a 85%. O tempo vai de acordo com o gosto. Quanto mais dias na maturação a seco, mais ela perde líquidos e o sabor fica mais apurado e a maciez da carne é maior.
Wessel explicou à reportagem que um dos segredos é usar peças com osso, como a bisteca ou costela ribeye, ou se for usar sem osso, o filet mignon, e é preciso ficar atento ao tempo de maturação, pois secam mais rapidamente. Para que não estraguem, é muito importante que exista um espaço entre elas para que ocorra a circulação correta do ar em todas as partes.
Com a técnica, peça desenvolve uma crosta escura, com um aspecto de "podre", que é removida para revelar uma carne maturada com coloração, maciez, cor e aroma intensos. As carnes maturadas ficam com o aspecto de amanteigadas ou até amendoadas.
É perigoso consumir essa carne?
Apesar do aspecto da carne crua ser estranho após esse processo, o dry aged é seguro de ser consumido se a maturação for feita em local controlado e correto.
Na mesma reportagem ao jornal, a doutora em Ciência e Tecnologia de Alimentos Denise Perdomo explicou que o processo é uma reação natural. "É algo que acontece na própria carne a partir do "rigor mortis". O animal morre, aquelas enzimas que estão ali, dentro das células, são liberadas e aí elas começam a agir sobre a fibra muscular. Então, há um processo enzimático entre enzimas proteolíticas (que quebram proteínas) e lipolíticas (que quebram gordura)", disse ela, destacando a importância de saber a procedência da carne e explicando que pode ser perigoso testar a técnica em casa.
"Qualquer umidade acima do parâmetro estabelecido para você manter esse ar seco pode proporcionar a multiplicação de bolores. Os bolores são produtores de micotoxinas, que não têm um efeito agudo à saúde. Ou seja, eu não vou comer algo com micotoxina e imediatamente já desenvolver uma doença, mas elas têm um efeito crônico, a longo prazo na saúde humana. E essas micotoxinas são tóxicas, cancerígenas para o rim e para o fígado".
Com controle rígido do processo, tempo de maturação longo e a seleção das peças com cortes nobres, essas carnes são bem mais caras do que as mesmas peças normais, e, dependendo do tempo em maturação pode custar até R$ 900.