Há 30 anos no Terraço Itália, sommelier conta trajetória "com orgulho"
Quando deixou o Ceará e chegou a São Paulo, Francisco Everardo de Freitas, conhecido apenas como Freitas, tinha apenas 14 anos. Ainda garoto ouviu falar da boca de um cliente de um grande restaurante chamado Terraço Itália. “Ouvia uma rádio que passava propaganda do terraço e pensava ‘um dia eu ainda vou trabalhar aí’”, contou. Hoje ele é sommelier e um dos funcionários mais antigos da casa, que neste sábado (29) completa 45 anos, dos quais Freitas participou de 30.
Além de organizar a carta de vinhos de um dos restaurantes mais tradicionais e famosos de São Paulo, ele também trabalha como maître (supervisor dos garçons). Nesse tempo todo já atendeu muitas personalidades do mundo artístico e político e presenciou diversas cenas românticas também, afinal, com uma vista privilegiada para a cidade, muitos noivados acontecem ali. Mas para ele nada bate a emoção de casar o filho no restaurante. “Entrei aqui solteiro, depois me casei e construí minha família. Então, celebrar o casamento do meu filho no Terraço Itália foi muito marcante. Isso é algo que eu jamais esquecerei. Para mim, foi uma das festas mais bonitas que aconteceram”, relatou.
Em entrevista ao Terra, o sommelier falou sobre sua carreira no Terraço Itália, celebridades que já passaram pela casa e a vida dentro de um dos cartões postais da cidade. “Tenho muito orgulho de ter feito parte desses 45 anos de história e espero ficar mais 45”, afirmou.
Para comemorar o aniversário, o restaurante organizou um menu especial de degustação elaborado pelo chef Toscano Pasquale Mancini, por R$ 178, que incluí receitas típicas da gastronomia italiana.
Confira a entrevista completa com o sommelier do Terraço Itália:
Terra - Há quanto tempo você é maître?
Freitas -
Na verdade eu entrei aqui em 1982, em uma função que hoje não existe mais, eu era desembarace, é o ajudante do ajudante do garçom. Passei a cumin, que é o ajudante do garçom, e depois a garçom em pouco tempo. Mais tarde virei maître e logo me tornei sommelier também e passei a cuidar da carta de vinhos e estou até hoje. Então, meu crescimento profissional dentro do Terraço Itália foi muito importante. Eu tive essa oportunidade e é claro que sempre estudei e li muito sobre vinhos, fiz alguns estágios na cozinha, então isso me ajudou bastante a conseguir essas promoções rapidamente.
T - Onde você trabalhava antes de vir para o Terraço Itália?
F -
Eu sou cearense, de um lugar chamado Quixadá, mas hoje já me considero um paulista de verdade. Vim para São Paulo com 14 anos e tive alguns serviços sem registro quando era menor de idade, mas tive três empregos mesmo antes de vir para o Terraço. O primeiro foi em um Bar e Restaurante Silvio em Ermelino Matarazzo e eu sempre ouvia falar do Terraço Itália. Tinha um cliente que ia lá e falava “olha, você tem que trabalhar no Terraço Itália”, mas eu nem sabia o que era o Terraço. Depois trabalhei em um lugar chamado Bar e Restaurante Massalândia e sempre pensando no Terraço Itália. Mas sabia que para entrar aqui teria que fazer um curso ou alguma coisa, então fui fazer o curso de garçom no Senac. Mesmo assim não consegui entrar de imediato, então fui para um hotel chamado Solar Paulista. Lá sempre ouvia uma rádio que passava propaganda do Terraço Itália e isso me fascinava mais ainda. Eu pensava ‘um dia eu ainda vou trabalhar aí’. Depois de uns dois anos lá, finalmente surgiu a oportunidade no Terraço. Vim, fiz uma entrevista e consegui entrar.
T - Foi muito difícil entrar no Terraço Itália?
F -
Graças a Deus foi até fácil, porque eu já tinha me preparado para isso. Nessa época já estava fazendo curso de inglês, isso realmente foi muito importante para mim. E não parei por aí, até hoje faço cursos. Tento me aperfeiçoar sempre o máximo para acompanhar a evolução do restaurante.
T - Atualmente você é o funcionário mais antigo da casa?
F -
Um dos mais antigos. Tem um maître que está há 32 e outro há 34, se não me engano. O Terraço é um lugar muito bom de trabalhar, porque dá oportunidade para você crescer profissionalmente. É claro que para isso você também tem que se interessar, correr atrás, estar sempre estudando, sempre se lapidando. Mesmo sendo uma casa tradicional, a direção do terraço se preocupa muito com investimentos, investe em tecnologia, em treinamentos. Isso faz com que a gente fique na casa porque sente que está sempre evoluindo, nunca estabiliza, sempre tem um incentivo novo. Essa é uma casa que realmente investe muito no funcionário e a gente fica muito feliz com isso.
T - Você disse que já era um sonho seu trabalhar aqui. Você lembre como foi seu primeiro dia de trabalho? Quantos anos você tinha?
F -
É difícil, no começo sempre tem que acostumar. Mas sempre tive pessoas legais trabalhando comigo e eu gosto muito de observar e de aprender. Depois que eu peguei o sistema da casa mesmo, a coisa foi mais fácil. Sempre tentei ter conhecimentos além, explorar a casa mesmo, ia para a cozinha. Às vezes até o chefe até me enchia ‘o que esse cara está fazendo aqui?’, mas o interesse era meu de aprender. Sempre fui muito voltado para cozinha, bar, vinho. Cheguei aqui quando tinha acabado de completar 20 anos.
T - Você sempre se interessou pela área de vinhos?
F -
Sim, eu tive, graças a Deus, grandes profissionais do meu lado. Aqui mesmo no Terraço Itália trabalhei com o seu Mário, que era uma pessoa maravilhosa e me ensinou bastante. Nessa época, o vinho ainda não tinha esse glamour que é hoje, mas eu sempre estava com ele. Degustava com ele quando tinha oportunidade e ele me ensinava muito. Isso me incentivou a mexer com vinhos, a estudar sobre o assunto. Fiz o curso na ABS, o que foi um passo enorme. Daí fiz algumas viagens também. Hoje posso dizer que conheço todos os países que são grandes produtores de vinhos. Isso dá um grande conhecimento, porque às vezes não é só uma questão de escola. Além do curso você tem que degustar bastante e ler bastante, conhecer vinícolas, que é superimportante.
T - Quantos maîtres a casa tem ao todo?
F -
Nossa equipe é de seis maîtres. Eu cuido mais do vinho, faço a carta, seleciono os produtos. E cada salão tem um maitre responsável. Tem um do salão nobre, do salão panorama, o maître de eventos, um que fica na recepção, tem sempre um por sala.
T - Como é organizada a carta de vinho?
F -
Hoje nós trabalhamos com 230 rótulos na nossa carta, com vinhos do mundo todo. Temos uma adega no subsolo do prédio que comporta 12 mil garrafas e temos mais duas adegas aqui no próprio restaurante, uma para 780 e outra 600 garrafas. Todos os vinhos que entram na carta passam por degustação aqui na casa. Temos uma equipe de degustadores, porque gosto sempre de ouvir a opinião dos maîtres e outras pessoas. Acho superimportante dividir essa responsabilidade com pessoas que conhecem também. Tenho muito orgulho de cuidar da carta de vinhos, ela é realmente muito boa. Bons vinhos, com um bom custo-benefício, produtos que agradam mesmo.
T - Qual é o vinho que mais sai atualmente?
F -
Os vinhos que mais saem são os italianos, em especial da região da Toscana. Na nossa carta temos vinhos do mundo inteiro, mas focamos mais os italianos. Isso serve também para as harmonizações, os cardápios fechados. Os italianos são os preferidos dos clientes da casa.
T - Qual é seu prato preferido do menu?
F -
Nossa cozinha tem pratos que são carros-chefes e que a gente recomenda com muita segurança. Mas meu prato predileto da cozinha do terraço é o filé grelhado com lascas de trufas negras e risoto à parmegiana. Para mim esse prato é o ‘the best’ mesmo.
T - O Terraço Itália é um restaurante muito tradicional e famoso de São Paulo e isso sempre atrai gente famosa e importante para a casa. Você já serviu muitas personalidades conhecidas?
F -
Realmente o Terraço, por ser um cartão postal da cidade de São Paulo, atende pessoas do mundo inteiro, artistas, personalidades políticas. Então, a gente tem esse privilégio de atender grandes personalidade mesmo.
T - Já atendeu alguém que já fosse seu ídolo?
F -
Dentre as pessoas que eu já atendi, uma que eu realmente sou fã, foi o (cantor italiano) Pepino Di Capri. Nós também tínhamos uma pessoa que apreciava muito o Terraço Itália e toda vez que vinha ao Brasil fazia questão de vir aqui que é o (músico americano) Ray Conniff. Eu sou muito fã dele! E tiveram muitos outros, personalidades brasileiras também. O Terraço é uma caixinha de surpresas, a gente sempre está atendendo pessoas do mundo artístico, político, do mundo todo.
T - Você já presenciou muitas coisas nesses anos. Teve alguma história que marcou você de alguma forma especial?
F -
O que nos deixa sempre muito contente é ver as pessoas que vêm no Terraço Itália pela primeira vez. Realmente você percebe que a pessoa fica fascinada com o lugar. Mas também tiveram muitas cenas interessantes, foram muitas coisas legais. Temos aqui uma tradição bacana, pois as pessoas gostam de vir ao Terraço Itália para fazer pedidos de casamento. Aconteceu um caso em que um moço quis ficar noivo aqui e trouxe um aquário com um peixinho. O anel estava dentro do aquário e o bacana é que eu tive que cuidar do peixinho até o momento do pedido. Foi uma coisa muito bacana, foi um momento que me marcou.
T - O Terraço Itália realmente é conhecido por ser um restaurante muito romântico. Qual foi a maior cena de amor que você já presenciou?
F -
Já vi muita coisa! No pedido de casamento, por exemplo, tem muita gente que faz loucuras. Teve uma pessoa que trouxe três quilos de pétalas de rosas e pediu para colocar envolta e em cima da mesa. Diversas coisas assim. Teve um rapaz um dia, que realmente estava muito apaixonado e ao pedir a moça em casamento de repente tirou o sapado dela, colocou champanhe lá e tomou a champanhe no sapato. Eu achei uma prova de amor muito forte.
T - Você já trouxe sua esposa ou alguém da sua família para um jantar especial no Terraço Itália?
F -
Teve um acontecimento muito especial para mim: conseguir fazer o casamento do meu filho aqui. Eu consegui reunir familiares, amigos e me senti muito realizado em conseguir fazer essa festa. Eu entrei aqui solteiro, depois me casei e construí minha família. Então, celebrar o casamento do meu filho no Terraço Itália para mim foi muito marcante. Isso é algo que eu jamais esquecerei. E para mim foi uma das festas mais bonitas que aconteceram. Meu filho sonhava em casar aqui e eu contei com muito carinho da direção do Terraço e isso me proporcionou mais alegria ainda. Esse foi um dos momentos mais importantes da minha vida.
T - O que as pessoas costumam perguntar para você quando descobrem que você trabalha aqui?
F -
Eu fico muito contente e orgulhoso de trabalhar no Terraço. Às vezes eu vou a lugares e me identifico como funcionário daqui e as pessoas falam “nossa, você trabalha no Terraço Itália! Como é lá? Tenho o sonho de conhecer”. Então, é muito glamoroso. Fico muito feliz de trabalhar em um lugar que é um ícone. Sempre tem muita curiosidade.
T - A vista de São Paulo aqui do Terraço Itália nunca enjoa?
F -
Nunca! Daqui de cima do Terraço a gente vê tudo. A cidade tem sempre alguma coisa nova, um prédio de uma cor diferente, um prédio sendo construído e a gente acompanha todas essas mudanças.
T - O Terraço Itália está completando 45 anos este sábado (29) e você está na equipe há 30 anos. Como você se sente em fazer parte dessa história?
F -
Para começar é uma honra muito grande fazer parte da equipe do Terraço Itália. Como falei, uma casa que investe e valoriza os funcionários e uma equipe voltada a sempre atender bem e dar o melhor para a cidade de São Paulo. Meu maior crescimento profissional foi aqui, então eu tenho que ter muito carinho e amor pelo Terraço, porque foi aqui que fiz minha vida. Sempre tento me dedicar o máximo ao meu trabalho porque é uma casa que merece isso. Tenho muito orgulho de ter feito parte desses 45 anos de história e espero ficar mais 45.
Serviço Terraço Itália
Endereço:
Avenida Ipiranga, 344, 41º andar, Centro – São Paulo
Telefone: (11) 2189-2929
Horário de funcionamento: de segunda a quinta, das 12h às 24h; sexta e sábado, das 12h à 1h; e domingo, das 12h às 23h
Menu degustação: Bresaola della Valtellina (carne bovina maturada italiana da região de Lombardia), Agnolotti al castelmagno (agnolotti recheado com queijo piemontês Castelmagno), Costolette di cinghiale al Morellino di Scansano con polenta (carré de javali ao Morellino di Scansano típico da região Toscana com polenta cremosa), Pastiera di Grano con gelato artigianale (torta recheada com grãos de trigo e ricota típica da região Campania), e Cantucci con vin Santo (biscoito típico italiano acompanhado de Vin Santo).