IA: O futuro da psicoterapia?

A Inteligência Artificial é o futuro em praticamente todas as profissões. Entretanto, em algumas delas, a chegada da IA representa também dilemas éticos e profissionais. Uma dessas profissões é a psicologia, onde chatbots como WYSA e Character.ai são utilizados, principalmente por jovens, para oferecer suporte emocional e psicológico, teoricamente com qualidade similar à de um profissional qualificado. Eles superam um desafio comum aos terapeutas: a confiança do paciente no profissional, já que muitas pessoas têm dificuldade de se abrir para um desconhecido.

Mas é claro que nada é assim tão simples. Enquanto profissionais da psicologia seguem um código de ética, entre as 'terapeutas IAs', as garantias relacionadas a um assunto tão recente são uma verdadeira bagunça. E nos EUA, a empresa desenvolvedora do Character.ai já enfrenta na Justiça a acusação de ter colaborado para o suicídio de um adolescente na Flórida.

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Mas esse não é o único questionamento: em uma sociedade cada vez mais solitária do ponto de vista emocional, embora hiperconectada pelas redes sociais, até que ponto promover um programa de computador como 'a solução para problemas psíquicos' é uma atitude moral? E, além disso, o que acontece com a classe profissional dos psicólogos, que estudaram anos até serem considerados aptos a tratar a saúde mental das pessoas? Os estudos de eficácia da terapia com IA seguem em desenvolvimento. Mas enquanto a ciência não chega a conclusões concretas, a Mente Afiada conversou com o neuropsicólogo Aslan Alves sobre tudo o que se sabe sobre a terapia com Inteligência Artificial.

O quão recorrentes estão sendo as terapias com o uso de IA?

"As terapias que utilizam inteligência artificial têm sido mais recorrentes entre membros da Geração Z e entre indivíduos que enfrentam dificuldades financeiras para realizar acompanhamento com um profissional humano. É importante destacar que, embora a inteligência artificial seja capaz de simular comportamentos humanos, ela não possui empatia genuína ou a habilidade de realizar uma escuta sem julgamentos, características fundamentais da relação terapêutica."

Quais são as implicações éticas do uso de inteligência artificial na terapia?

"As implicações éticas do uso de IA na terapia incluem preocupações com a segurança e a privacidade dos dados pessoais e íntimos dos usuários. Uma questão crítica é como e onde esses dados são armazenados. No caso da terapia conduzida por profissionais registrados, o Conselho Regional de Psicologia (CRP) e o Conselho Federal de Psicologia (CFP) estabelecem normas claras para o registro e armazenamento seguro de prontuários. Bem como para a destruição desses arquivos ao longo dos anos, garantindo a proteção das informações dos pacientes. Em relação às soluções baseadas em IA, ainda há pouca clareza sobre como esses padrões são aplicados."

Quais seriam os prós e contras da terapia com IA?

"Considero que podem ser vistas como prós, a acessibilidade para indivíduos que enfrentam barreiras financeiras ou geográficas, a disponibilidade imediata para desabafos e apoio em situações pontuais e a capacidade de fornecer informações ou orientações objetivas em questões específicas. Em contrapartida, a terapia com IA traz a incapacidade de compreender a subjetividade humana e os contextos emocionais que influenciam comportamentos. Além do risco de interpretações errôneas ou respostas inadequadas, devido à falta de empatia e compreensão contextual. Além disso, temos as preocupações éticas sobre a privacidade e o armazenamento dos dados pessoais dos usuários."

Como a privacidade e a segurança dos dados dos pacientes são garantidas durante as sessões de terapia com inteligência artificial?

"Atualmente, não há informações suficientes para afirmar como a privacidade e a segurança dos dados são garantidas nas sessões conduzidas por IA. É essencial que os desenvolvedores dessas tecnologias implementem e comuniquem claramente políticas de segurança que estejam em conformidade com legislações de proteção de dados."

É possível que a terapia com IA seja segura e positiva?

"Embora a terapia com IA possa oferecer benefícios em termos de acessibilidade e rapidez de resposta, ela é limitada pela sua natureza programática. A psicoterapia conduzida por humanos auxilia os pacientes a construírem suas próprias respostas e reflexões, promovendo uma compreensão mais profunda e um crescimento pessoal sustentável. Por outro lado, a IA tende a fornecer respostas prontas e menos adaptadas à singularidade de cada indivíduo, o que pode comprometer o valor terapêutico do processo."

Você consideraria a terapia por IA uma desvalorização do trabalho dos terapeutas e psicólogos?

"Acredito que a utilização de IA na área da saúde mental seja uma tendência passageira. Embora possa atrair muitos usuários inicialmente, não substitui o papel essencial do psicólogo humano, cuja habilidade de compreender a subjetividade e a pluralidade das experiências humanas é insubstituível. A IA pode complementar, mas dificilmente substituirá a atuação de um terapeuta humano."

Quem se responsabiliza pela inteligência artificial se ela cometer um erro? 

"Um diagnóstico em saúde mental deve ser realizado exclusivamente por profissionais de saúde qualificados. Algumas soluções de IA já orientam os usuários a buscarem um profissional adequado para confirmação de diagnósticos ou para o tratamento. O que se sabe atualmente é que a responsabilidade por erros de diagnóstico em ferramentas de IA ainda é uma área nebulosa e que exige regulações específicas para proteger os usuários."

Há preocupações sobre a desumanização do cuidado em saúde mental com a IA?

"Sim, a introdução da IA na saúde mental levanta preocupações significativas sobre a desumanização do cuidado. A saúde mental é profundamente enraizada na experiência humana e exige um nível de compreensão e empatia que somente um humano pode oferecer. Substituir completamente o cuidado humano por soluções automatizadas pode comprometer a qualidade e a eficiência do atendimento."

Embora seja uma facilitadora, a IA também acumula problemas, desde danos ambientais até discussões éticas. Do ponto de vista da psicologia, acha que ela tem futuro nessa área ou é uma moda passageira?

"Do ponto de vista da psicologia, a IA tem potencial para crescer significativamente, especialmente como ferramenta de apoio em pesquisas e no desenvolvimento de soluções que complementem a prática clínica. No entanto, quando aplicada diretamente à saúde mental, a IA é mais provavelmente uma tendência passageira. A singularidade e a profundidade da experiência humana são aspectos que uma máquina não consegue replicar de forma satisfatória."