A tristeza profunda de criar meninas no Brasil de hoje
Tomei café da manhã contando (mais uma vez) para Elisa e Manu sobre Malala. É que na noite anterior havia assistido ao episódio do programa do David Letterman, no Netflix, em que ela era a convidada.
Assisti emocionada, aliás, emocionada não, arrasada porque enquanto via aquela menina aparentemente frágil, mas tão incrivelmente corajosa, pensava em quantas mulheres são agredidas, caladas e mortas "apenas" por defenderem causas fundamentais para o mundo. E naquele café da manhã com as minhas filhas falei de Malala, mas queria mesmo era ter contado sobre Marielle.
Me faltou coragem, confesso.
Como elas são pequenas, apenas ouvem ou lêem aquilo que selecionamos (claro, na medida do possível) e não ficaram sabendo da Marielle. Como??? Eu sei que você pode me condenar, dizer que estou criando filhas numa bolha, fingindo que o mundo é apenas formado por pessoas do bem e que papo é esse de mostrar uma referência internacional quando a gente acaba de ter um caso dilacerante aqui, bem no nosso quintal.
Mas até agora não sei como explicar para Elisa e Manu que elas vivem num país apodrecido pela corrupção (sim, estou generalizando), onde mulheres são assassinadas porque incomodam, porque denunciam, porque são indignadas, porque não se acomodam, não se acovardam e porque fazem boa parte daquilo que ensino todos os dias para as minhas meninas. Façam o bem
Sejam honestas
Sejam valentes
Não se calem diante de situações que te façam mal
Se defendam e defendam os outros
Não permitam que injustiças sejam cometidas na frente de vocês. Contem para nós, chamem a professora, o bedel no recreio!
Ladrões devem ser presos porque o mal precisa ser combatido
Pessoas do bem são valorizadas e mais felizes
Nunca devemos pensar apenas no que é bom pra gente e sim para todos
Como dizer que Marielle foi a quinta candidata mais votada do Rio de Janeiro e mesmo assim tenha sido morta? Como dizer que suspeitam que a munição usada para assassinar Marielle tenha sido desviada da polícia? Como dizer que ela não foi a única vítima? Como contar que Anderson seu motorista foi morto enquanto trabalhava? Como dizer que mesmo defendendo pessoas você pode terminar executada por outras?
Não encontrei um jeito até agora.