De onde vem a ansiedade? É preciso tratar com remédio sempre?
Psiquiatra explica diferenças entre sintomas comuns e os transtornos que essa emoção, que está brilhando em 'Divertida Mente 2', pode causar
A ansiedade é uma resposta natural do corpo ao estresse, caracterizada por sentimentos de tensão, preocupação e mudanças físicas, como aumento da pressão arterial. O sentimento está chamando a atenção de crianças, jovens e adultos em todo o mundo após ser apresentado como uma das novas emoções na animação da Disney Pixar, “Divertida Mente 2”.
Na trama, a personagem principal, Riley, “recebe” a nova emoção aos 13 anos de idade, em meio a tensões da rotina de uma adolescente. Embora todos experimentem a ansiedade em algum momento da vida, quando esses sentimentos se tornam persistentes e interferem nas atividades diárias, podem ser indicativos de um problema maior.
Em entrevista ao Terra Você, a médica psiquiatra Cíntia Braga conta que a ansiedade é a manifestação de um medo e as reações físicas que o acompanham, de algo que não está posto, algo hipotético.
“Até certo ponto, é uma reação evolutiva, que nos protege: leva a ação e reação mais rápidos. Entretanto, em alguns casos, ela pode ser uma resposta patológica a estímulos que não são ameaçadores.”
Braga explica que muitas pessoas no seu processo de neurodesenvolvimento podem apresentar essa resposta disfuncional desde a infância. Outras, podem adquirir esse padrão de resposta ao longo da vida, frente a dificuldades, a traumas ou mesmo ao estresse crônico.
Ansiedade saudável ou transtorno de ansiedade?
A médica explica que a resposta de luta ou fuga, que envolve uma hiperativação de determinados centros cerebrais, que podemos interpretar no corpo e na mente como sensação de ansiedade é "normal", ou seja, fisiológica, quando ela surge frente alguma hipótese de ameaça, mesmo que hipotética, como por exemplo:
- Será que trouxe o passaporte?
- Será que vou lembrar do que preciso falar na reunião?
- Será que essa roupa é adequada?
“Ela é autolimitada e não nos paralisa, não nos causa desconforto extremo ou não nos impede de fazer nada. Ou seja, ela vem, a gente pensa, age e reage mais rápido, ela termina e a vida segue”, exemplifica a psiquiatra.
No entanto, quando essa resposta se perpetua por horas, dias, semanas chegando a impedir e atrapalhar a pessoa de desenvolver as suas atividades ou é desproporcional à ameaça, provavelmente, pode ser um transtorno.
Tipos mais comuns
A profissional conta que o tipo mais comum de transtorno é a ansiedade leve. O transtorno misto de ansiedade e depressão também é muito frequente. Depois, tem o TAG (transtorno de ansiedade generalizada) e mais raramente o transtorno de pânico - que não é caracterizado por um episódio isolado de ansiedade extrema, mas pela recorrência deles por um determinado período.
“Certo grau de ansiedade tem sido cada vez mais companheiro do brasileiro. Aliás, lideramos o ranking de ansiedade no mundo. E lembrando que em psiquiatria, leve não é sinônimo de pouco sofrimento - mas diz respeito ao grau de disfuncionalidade”, ressalta a médica.
Uso de medicamentos
O tratamento medicamentoso deve ser instituído quando as medidas não medicamentosas falharem, entre elas:
- Atividade física;
- Acompanhamento nutricional;
- Técnicas de respiração;
- Acompanhamento psicoterápico.
A médica destaca que é importante que as pessoas que sofrem com a ansiedade desenvolvam estratégias para lidar com os sintomas. Apesar da medicação ajudar, modificações no padrão de comportamento e de processos de pensamento são fundamentais para o tratamento e resolução, não apenas para uma ação paliativa.
“A automedicação aqui é um risco que pode perpetuar e agravar os sintomas. O acompanhamento psicoterápico também é essencial, mesmo quando a medicação se faz necessária”, diz a psiquiatra.
Tratamento
Para a profissional, o ideal é que o tratamento seja breve e envolva a menor quantidade de medicação possível, o mínimo necessário para tratar. Entretanto, em casos mais graves, o tratamento de longo prazo pode ser necessário e a administração medicamentosa só é danosa quando não é indicada.
“Se existe um processo de adoecimento, a manutenção do tratamento é fundamental. O que não quer dizer que medidas não medicamentosas são dispensáveis, pelo contrário, são essenciais para a melhora e para a manutenção e estabilidade dessa melhora”, explica a especialista.
O acompanhamento multidisciplinar vai auxiliar no processo de elaboração e de desenvolvimento de ferramentas para lidar com situações ansiogênicas e de enfrentamento das crises e sintomas associados. “O treinamento de respiração e de habilidades de atenção plena, por exemplo, são indicados e conseguem amplificar a resposta ao tratamento”, conclui a médica.