Alain Delon aquece debate sobre legalização do suicídio assistido
Henderson Fürst, presidente da comissão de bioética, e Uiara Ribeio, médica paliativista, analisam panorama brasileiro em torno do assunto
O ator Alain Delon, de 86 anos, anunciou na última semana que pretende se submeter ao suicídio assistido. A informação ganhou destaque na imprensa internacional e levantou debate em torno da prática, que é proibida no Brasil, mas permitida em diferentes países do mundo, como na Suíça, onde o artista mora.
A informação do suicídio assistido veio a público a partir do filho de Alain Delon, Anthony, que revelou a decisão dos pais nas redes sociais. O astro francês convive com as dores e sequelas de um acidente vascular cerebral (AVC) desde 2019.
O suicídio assistido acontece quando o paciente aplica em si mesmo, no momento que achar oportuno, um remédio em dose letal. De acordo com Uiara Ribeiro, médica geriatra, especialista em cuidados paliativos e professora na PUC-PR, a substância é fundamentalmente prescrita por um profissional da saúde. Em nações onde o ato é legal, o pedido deve ser feito pela pessoa ainda lúcida para que seja legitimado pelas autoridades.
A prática é diferente da eutanásia voluntária, normalmente cogitada por pacientes com doença crônica ou em estágio terminal. Nessa situação, a pessoa pede a um profissional de saúde que aplique o medicamento em dose letal para abreviar sua vida quando acreditar estar em nível crítico de dor e sem esperança de melhora.
Prática é ilegal no Brasil
Tanto o suicídio assistido quanto a eutanásia voluntária são proibidas no Brasil, com pena de 6 a 20 anos de reclusão. Todos que auxiliarem um paciente a realizar qualquer procedimento neste sentido também podem ser responsabilizados por diversos crimes contra a vida.
"No Brasil, a eutanásia é equivocadamente equiparada ao homicídio doloso ou ao suporte na realização de suicídio, condutas criminalizadas. Não deveria ser visto assim, mas como acolhimento ao sofrimento de quem não possui outra solução", argumenta Henderson Fürst, presidente da Comissão Especial de Bioética da OAB-SP e advogado da área da saúde.
Apesar de ambas as práticas não serem permitidas no Brasil, a legislação prevê que as pessoas possam ter dignidade na vida, assim como na morte. A paliativista Uiara Ribeiro defende que se fale mais sobre a morte para que deixe de ser um tabu, mas pondera: "Não podemos abreviar a vida do paciente, mas o que pudermos fazer para tornar aquele fim mais confortável e digno, fazemos".
Um exemplo é o caso de um paciente que esteja em suporte mecânico. Se a permanência nessa condição apenas estenda sua dor, sem perspectiva de melhora, a aplicação de medicamentos para alívio de dores e o desligamento de maquinário são vistos como auxílio para um fim digno. A decisão, reforça Uiara, depende do consentimento da família do paciente.
Comunidade médica debate
Para a médica Uiara Ribeiro, tanto o suicídio assistido quanto a eutanásia voluntária têm espaço para serem debatidos no Brasil. Entretanto, antes de pensar na morte, é necessário pensar em equidade de acesso à saúde. Isso porque a diferença social impede que as pessoas recebam, de forma equivalente, tratamento médico de qualidade e esgotem as tentativas de amenizar suas respectivas dores.
"Ser a favor é respeitar a vontade individual da pessoa. Porém, é também abrir precedentes para: 'será que esse paciente esgotou mesmo todas as chances de amenizar o sofrimento?'", reflete.
O advogado Henderson Fürst reforça: "O enquadramento brasileiro atual condena pacientes ao sofrimento insolúvel indesejado".