Análise: Caso de Itajaí mostra como combate à pandemia é marcado por negacionismo da ciência
Por todo o país, adotam-se soluções milagrosas, remédios sem comprovação de eficácia - ou comprovadamente ineficazes
O negacionismo da ciência tem sido um marco do combate à pandemia do coronavírus no Brasil. Por todo o País, adotam-se soluções milagrosas, remédios sem comprovação de eficácia - ou comprovadamente ineficazes - vitaminas, suplementos e até antibióticos, distribuídos ilegalmente sem prescrição. Uma cidade em particular, contudo, destaca-se no desprezo pela evidência científica.
A prefeitura de Itajaí (SC), desde o início da pandemia, voltou-se para soluções mágicas, ignorando a ciência, apostando recursos públicos, a esperança e a saúde da população, em práticas sustentadas não por pesquisa sólida, mas por ideologia e conveniência política. Essa escolha traz um duplo prejuízo: além de consumir recursos que poderiam ser empregados em práticas e insumos realmente necessários, provoca uma ilusão de segurança que pode levar ao relaxamento das medidas preventivas e a um aumento do número de casos e óbitos.
O prefeito primeiro apostou em homeopatia; adotou, em seguida, o protocolo de uso "precoce" de hidroxicloroquina e ivermectina, e recentemente, talvez frustrado ao se deparar com a óbvia ineficácia de todas essas intervenções, em vez de voltar-se para a ciência, tenta ainda mais uma prática sem embasamento científico: a ozonioterapia.
Ahomeopatia foi amplamente refutada pela comunidade científica internacional. Encontra-se banida já das redes de saúde da Austrália, Reino Unido e França. A cloroquina falhou em todos os testes de boa qualidade a que foi submetida contra a covid-19. A ivermectina tem baixa plausibilidade biológica para atuar contra vírus e sequer foi testada em humanos. A novidade da vez, a ozonioterapia, é uma prática sem comprovação, potencialmente perigosa, proibida nos Estados Unidos.
O prefeito de Itajaí parece construir políticas públicas de saúde com base em modismos de rede social e teorias de conspiração. O efeito é desperdício de recursos, com impacto devastador. Um custo que se traduz em mortes que poderiam ter sido evitadas com boa ciência e boas práticas médicas.
*Natalia Pasternak é doutora em microbiologia e presidente do Instituto Questão de Ciência