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Após suspensão da Coronavac, ministros do STF avançam com processos que envolvem vacinação

Ministro Ricardo Lewandowski pediu explicações à Anvisa sobre paralisação dos testes da Coronavac; ministro Barroso liberou para julgamento no plenário ação de uma família que solicita não vacinar o filho

10 nov 2020 - 22h12
(atualizado em 11/11/2020 às 01h23)
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BRASÍLIA - Um dia após a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) suspender os testes da vacina Coronavac, em produção pelo laboratório chinês Sinovac com o Instituto Butantã para covid-19, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) deram andamento aos casos que discutem a possibilidade de o poder público impor a vacinação de cidadãos.

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski.
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil / Estadão

Além do ministro Ricardo Lewandowski pedir explicações em até 48 horas à Anvisa, que suspendeu o teste em razão da morte de um voluntário, o ministro Luís Roberto Barroso liberou para julgamento no plenário uma ação em que uma família solicita o direito de não vacinar um filho. Está nas mãos do presidente do tribunal, Luiz Fux, definir quando o plenário julgará esta ação, que dará um norte sobre o entendimento que os ministros devem adotar quando houver, de fato, uma vacina testada e aprovada contra o novo coronavírus.

A suspensão dos testes da Coronavac foi determinada pela Anvisa na noite dessa segunda, 9, e provocou mal-estar com o governo de São Paulo. Nesta terça, 10, o presidente Jair Bolsonaro, que politizou o tema da vacinação de covid-19, comemorou como se fosse uma vitória pessoal. "Morte, invalidez, anomalia. Esta é a vacina que o Doria (João Doria, governador de São Paulo, do PSDB) queria obrigar a todos os paulistanos tomá-la. O Presidente disse que a vacina jamais poderia ser obrigatória. Mais uma que Jair Bolsonaro ganha", publicou o presidente em uma rede social. Mais tarde, ele disse que o Brasil "tem de deixar de ser um país de maricas" por causa da covid-19.

O diretor-presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres, indicado por Bolsonaro, afirmou que a decisão foi "técnica" e tomada após ser informado sobre 'evento adverso grave' com um dos pacientes que participa dos testes da vacina. Segundo o governo de São Paulo, porém, não há relação entre os testes e a morte voluntário - a causa provável é suicídio. A Coronavac está em fase três de testes, com humanos, a mais avançada no desenvolvimento desse tipo de produto.

Lewandowski solicitou que a Anvisa informe os "critérios utilizados para proceder nos estudos e experimentos concernentes" à Coronavac e "o estágio de aprovação desta e demais vacinas contra a covid-19". Nos bastidores do Supremo, o pedido de informações de Lewandowski foi visto como uma demonstração de preocupação com a suspensão abrupta dos testes.

O ministro havia indicado que não concederá liminar nas ações que tratam de vacinação de covid-19, e sim levaria ao plenário da Corte. No entanto, a leitura entre interlocutores do ministro é que, a depender dos desdobramentos envolvendo o processo de preparação das vacinas, pode vir a ser necessário tomar alguma medida.

A obrigatoriedade da aplicação de vacinas contra a covid-19, quando estiverem prontas e testadas, entrou no horizonte do tribunal por causa de quatro ações, movidas por partidos em outubro, após declarações de Jair Bolsonaro de que não iria comprar a Coronavac mesmo que estivesse aprovada e que era contra a vacinação compulsória. "Vacina não será obrigatória e ponto final", disse o presidente, apoiador do movimento antivacina, que ganha espaço entre conservadores radicais em todo o planeta.

Antes da pandemia, pais foram à Justiça pedir permissão para não imunizar criança

Antes de eessas ações chegarem à corte, no entanto, já havia o recurso de uma família que pede permissão para não aplicar nos filhos vacinas que fazem parte do calendário oficial de vacinação definido pelas autoridades sanitárias, inclusive, a Anvisa. O relator, Barroso, já se preparava para liberar a ação para julgamento no plenário do Supremo, mas o fez justamente no dia seguinte à suspensão dos testes da covid-19. A definição desse caso servirá de regra geral para casos semelhantes no País.

Segundo o Estadão apurou, a tendência é que o tribunal afirme que a família deve, sim, submeter o filho à vacina. "Não posso antecipar meu voto, mas a minha visão é de valorização da ciência e do conhecimento técnico", disse Barroso, ao comentar o assunto em outubro.

Como o Estadão mostrou, a família autora do recurso no Supremo agora admite "a necessidade de padronizar a obrigação vacinal em um País grande e desigual como o Brasil". Se perder a ação, o casal disse que vai imunizar o filho, hoje com 5 anos, desde que as doses não sejam exigidas de uma só vez e que haja garantia de acompanhamento médico para possíveis efeitos adversos.

O ponto em comum entre os julgamentos das ações sob relatoria de Lewandowski e Barroso é o embate entre o direito coletivo à saúde e a liberdade individual de não se submeterem à vacinação. Na contraposição desses princípios, a composição atual do STF inclina-se a privilegiar o bem coletivo, ou seja, a vacinação obrigatória.

Além da discussão sobre liberdades versus direito à saúde, um dos aspectos que podem ser antecipados no julgamento que discute a obrigatoriedade de vacina de uma criança - e que pode voltar no processo sobre vacinação contra a covid-19 - é a politização do tema, tendo em conta o crescimento do movimento antivacina no Brasil, especialmente após a pandemia. Esse julgamento da ação de relatoria do ministro Barroso, portanto, trará sinalizações importantes sobre a legalidade de o Estado impor ou não a vacinação obrigatória contra o vírus da pandemia.

Atenções se voltam para presidente do Supremo

Agora, com a liberação da ação para o plenário, as atenções estão voltadas para o presidente do tribunal, Luiz Fux. Até agora, o principal comentário dele sobre o tema foi feito no dia 24 de outubro, quando disse que a judicialização sobre a vacinação contra covid-19 inevitavelmente chegaria à corte e que seria importante e necessário que o judiciário se manifestasse. Já para Bolsonaro, "não pode um juiz decidir se você vai ou não tomar a vacina, isso não existe'.

Interlocutores de Fux dizem que o ministro não tem pressa para pautar a discussão sobre covid-19, uma vez que ainda não existe vacina pronta. O ministro tem procurado preservar a competência do Legislativo e do Executivo para definir sobre o tema, em entendimento semelhante ao do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-DF).

No cenário atual, a tendência é que Fux só marque o julgamento a curto prazo se houver movimento dos ministros solicitando. Enquanto isso, os olhares do Supremo estão atentos para novos desdobramentos na condução que o governo federal está dando ao tema.

Estadão
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