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Bilionário que assumirá chefia na Saúde contraria pesquisas e defende cloroquina para a covid-19

Posição sobre uso 'preventivo' do medicamento contraria os próprios técnicos da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE), que ele vai comandar

18 jun 2020 - 19h18
(atualizado às 19h55)
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BRASÍLIA - De malas prontas para assumir um cargo no Ministério da Saúde, o empresário Carlos Wizard defende o uso de coquetel de medicamentos, incluindo a cloroquina, para pacientes como forma de prevenir o novo coronavírus, antes mesmo de a pessoa ter qualquer sintoma. Em entrevista ao Estadão, ele cita o exemplo da cidade de Porto Feliz, no interior de São Paulo, que passou a distribuir um "kit covid-19" à população.

"Precisa ter mais evidência do que uma cidade com 75 mil habitantes, com mais de 500 infectados e sem nenhum óbito?", disse ele. Boletim epidemiológico mais recente do governo de São Paulo, no entanto, mostra que há 45 casos confirmados e 3 óbitos no município. O discurso do empresário está alinhado ao que prega o presidente Jair Bolsonaro, que também defende o uso amplo do medicamento.

A posição de Wizard de uso "preventivo" da cloroquina contraria os próprios técnicos da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE), que ele vai comandar. Diariamente, a equipe da pasta produz análises sobre pesquisas de tratamentos contra a pandemia, que até hoje não comprovaram a eficácia da droga no combate ao coronavírus. O futuro secretário do Ministério da Saúde contraria também manifestações da comunidade médica, como a Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB), a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) e a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), que rejeitam o uso do medicamento para conter a pandemia.

O empresário, que é formado em Ciência e Tecnologia pela universidade Brigham Young, dos Estados Unidos, rebate os questionamentos sobre a eficácia da cloroquina ao afirmar que estudos em "centenas de países" já comprovaram a sua eficácia logo nos primeiros sinais da doença. Questionado sobre quais destas análises foram divulgadas em revistas científicas, Wizard disse que a sua assessoria enviaria um "calhamaço" de pelo menos cem documentos à reportagem, o que não ocorreu até a publicação desta entrevista.

Um novo estudo, divulgado nesta quarta-feira, 3, na revista científica 'The News England Journal of Medicine', não encontrou prova da eficácia da cloroquina na prevenção da covid-19. Os pesquisadores analisaram os resultados em mais de 800 pacientes dos EUA e Canadá.

Como o senhor pretende contribuir para o enfrentamento da pandemia?

Comecei a fazer primeiras reuniões com principais diretores da secretaria. São 600 funcionários, entre servidores, bolsistas e consultores. E um orçamento de R$ 20 bilhões. O Ministério da Saúde não trabalha sozinho. Trabalhamos diretamente ligados aos secretários de cada Estado e município. A comunidade internacional está muito preocupada em oferecer vacina a covid-19. Estamos já em contatos avançados com universidade de Oxford. Pretendemos, ainda nestes próximos 30 dias, fazer a testagem inicial com 2 mil voluntários, selecionados entre profissionais da saúde. O Brasil desponta como um dos líderes. Um dos cinco pioneiros a oferecer essa vacina.

Qual a sua visão sobre o uso da cloroquina como tratamento da covid-19?

Qual nossa orientação, em nota técnica distribuída a secretários de Estados e municípios? Baseado em estudos feitos no Brasil, como internacionalmente, em centenas de países, que comprovadamente indicaram que a cloroquina e a hidroxicloroquina preserva a vida, na "fase 1" da covid-19, logo que paciente demonstra primeiros sinais. Os resultados são muito satisfatórios. No ministério antigo, no tempo do Mandetta, diziam: se você está com febre leve, fica em casa. E as pessoas ficavam. Essa conduta trouxe milhares de pessoas a óbito. Elas ficavam em casa, não recebiam tratamento. A doença evolui. Milhares foram a óbito. Com essa nova orientação técnica estamos conseguindo salvar vidas.

Já há dados que mostram melhores resultados após divulgação da mais recente orientação do ministério sobre cloroquina?

Acredito que em 30 dias vai ter uma comparação muito nítida. Do que era, e qual está sendo resposta.

Em relatórios diários, técnicos da SCTIE não apontam benefício da cloroquina contra a covid-19. Quais estudos comprovam a eficiência? Eles estão publicados em revistas científicas ou são apenas observações empíricas?

Não trabalhamos com observações empíricas. O Ministério da Saúde só toma suas decisões, normativas, baseado em estudos científicos, publicados em revistas especializadas na área médica internacional. Estamos trabalhando com vidas. Não podemos correr risco.

Caso você queira, especificamente, vou pedir para a assessora mandar um calhamaço de pelo menos 100 estudos comprovados internacionalmente de eficácia.

Pretende ampliar a orientação do ministério sobre cloroquina ao uso preventivo (profilático)?

Vamos combinar. Você não vai colocar cloroquina, chame de coquetel, conjunto, grupo de vários fármacos que preconizamos. A resposta é sim. Se um pai de família é diagnosticado, quando volta para casa também recomendamos tratamento profilático para esposa, sogra, filhos, quem estiver no núcleo familiar. Profilaticamente falando, já recomendamos sob orientação médica. Precisa ter mais evidência do que uma cidade com 75 mil habitantes, com mais de 500 infectados, sem nenhum óbito (Wizard refere-se a Porto Feliz, no interior de São Paulo)? Meu amigo. Distribua essa notícia para todo prefeito, governador. Se quisesse blindar toda cidade do Brasil, blindaria.

O presidente Jair Bolsonaro já afirmou que o distanciamento social não reduziu a curva de casos. Também apoia o fim das quarentenas. O senhor concorda?

Não vou avaliar a fala do presidente. Está fora do contexto. O que posso dizer? É importante o isolamento social. É importante a pessoa contaminada estar no período de quarentena. Importante o que ouvimos diariamente, lavar as mãos, evitar aglomerações...

Há especulações de que cargos no Ministério da Saúde podem ser distribuídos a partidos do Centrão. O senhor aceitaria um auxiliar indicado pelo Centrão?

Sou apartidário, apolítico. Tenho autonomia para conduzir a minha secretaria. Com pessoas técnicas.

O senhor recusaria um indicado do governo federal?

Não vou dizer que sim nem que não.

Estadão
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