Cientista alerta para risco de 'carga viral' maior no contágio em família
Apublicado no British Medical Journal indica que pessoas que lidam com infectados dentro de casa também correm o risco de serem expostas a uma carga viral alta.
Na luta contra o coronavírus, os profissionais de saúde de todo o mundo estão pagando um preço alto. Milhares contraíram o covid-19, e o número de mortes continua subindo entre eles.
Especialistas dizem que parte da explicação está na quantidade de vírus a que as equipes médicas são expostas.
"Quanto mais vírus houver dentro de mim, maior a probabilidade de transmiti-lo a você", explicou a professora Wendy Barclay, do Departamento de Doenças Infecciosas do Imperial College London, no programa Newsnight da BBC.
Médicos e enfermeiros geralmente estão em contato próximo com pessoas altamente infectadas e portadoras de cargas altas de vírus em seus corpos, o que significa que estão constantemente expostos a uma grande quantidade de vírus.
Agora, um artigo publicado no British Medical Journal indica que pessoas que lidam com infectados dentro de casa também correm o risco de serem expostas a uma carga viral alta.
"Temos visto famílias inteiras que adoecem gravemente", disse a autora do artigo, Lucy Yardley, professora de Medicina na Universidade de Bristol, à BBC Radio 4, emissora de rádio britânica.
Ela diz que muitos temem cruzar com pessoas sem máscaras nas ruas, mas que o risco de contágio nessas ocasiões é bem baixo.
"Por outro lado, ter de passar um tempo longo com alguém (infectado), essa é uma situação particularmente arriscada."
Yardley diz que pessoas infectadas devem ser isoladas o máximo possível de outros moradores da casa.
"Se houver lugares diferentes para elas se lavarem, seria bom. Se não for possível, deve-se lavar muito bem todas as torneiras e superfícies compartilhadas assim que forem usadas."
A professora também citou a importância de manter boa ventilação na residência. "É possível reduzir o número de infecções dentro de casa fazendo tudo isso."
Uma alternativa, diz ela, é que infectados se mudem temporariamente para outra casa, caso tenham acesso a um quarto só para eles.
O artigo com essas recomendações foi enviado a ministros do governo britânico.
Como a covid-19 entra no seu corpo
Se uma pessoa tem o vírus que causa a covid-19, também conhecido como Sars-CoV-2, ele pode se alojar na parte superior do trato respiratório, pronto para ser compartilhado pela respiração ou pela tosse.
"Toda vez que respiramos ou conversamos, enviamos gotículas para o ar originárias do nariz e da garganta", explicou Wendy Barclay, do Departamento de Doenças Infecciosas do Imperial College London.
Algumas dessas gotas caem no chão e contaminam as superfícies. Por isso, é recomendável manter distância social e lavar as mãos.
Não está claro quantas partículas precisam entrar no corpo de alguém para que ela fique doente.
"Com a influenza, que é um vírus que conhecemos muito, apenas três partículas precisam entrar no corpo de uma pessoa para iniciar a infecção. Não sabemos esse número ainda no caso da Sars-CoV-2, mas pode ser muito pequeno", disse Barclay.
Na Itália e na Espanha, milhares de profissionais de saúde testaram positivo para coronavírus.
Na Espanha, os profissionais de saúde representam cerca de 14% dos infectados
No início de março, as autoridades chinesas estimaram que 3,3 mil profissionais de saúde haviam sido infectados.
Isso significa que entre 4% e 12% dos casos confirmados de coronavírus correspondem a trabalhadores de saúde.
Um diretor de uma instituição de saúde britânica disse à BBC que até 50% da equipe do hospital está em licença médica em algumas áreas.
E se as medidas de controle de infecção falharem, os hospitais podem se tornar um foco viral.
Alguns médicos disseram à BBC que tentam dispensar prematuramente os pacientes que não são afetados pela covid-19, para evitar que sejam infectados.
Esse possível vínculo entre exposição e contágio é a razão pela qual, em muitos países, os profissionais de saúde ficam doentes por conta da falta de acesso a equipamentos de proteção individual (EPI).
Na França, os médicos entraram com ações contra o governo por — segundo eles — não terem conseguido aumentar a produção de máscaras e, portanto, colocá-los em perigo.
Médicos e enfermeiros do Zimbábue entraram em greve para protestar contra a falta de EPIs em um momento em que o país está em situação de emergência para tentar deter a propagação do vírus.
No Reino Unido, Neil Dickson, diretor executivo de uma organização de trabalhadores da saúde, diz que a falta de EPIs enfraqueceu a confiança dos médicos e enfermeiros.
Embora o governo britânico tenha começado a usar as forças armadas para distribuir milhões de máscaras aos profissionais da área médica, Dickson acredita que "levará algum tempo para reconstruir essa confiança".
"O outro problema é que esses equipamentos geralmente são fabricados na Ásia, em particular, na China. E para a China, portanto, garantir o fornecimento a longo prazo será um desafio significativo", acrescenta.
*Parte da pesquisa para esta reportagem foi conduzida por Deborah Cohen, correspondente de saúde do Newsnight.