Cientistas descongelam vírus 'zumbis' de 48 mil anos encontrados no Ártico; entenda o experimento
Objetivo é compreender os riscos para a saúde a partir do aquecimento global
Cientistas conseguiram descongelar 13 vírus dormentes há 48 mil anos no Ártico, em áreas de solo permanentemente congelado (chamadas de permafrost). O objetivo da experiência é tentar entender os riscos para a saúde global impostos pelas mudanças climáticas, que já estão provocando o degelo de várias dessas áreas desde a pré-história, com a alta probabilidade de liberação dos chamados vírus zumbis, patógenos desconhecidos.
Esta é a primeira vez que cientistas descongelam vírus tão antigos. Os 13 agentes infecciosos pertencem a cinco classes diferentes. Eles foram coletados em sete áreas distintas de permafrost. Alguns deles, segundo os cientistas, vieram de fezes de mamutes e do estômago de lobos siberianos.
Em laboratório, os vírus foram colocados em uma cultura de amebas e se revelaram capazes de invadir as células e se replicar. O experimento, segundo os pesquisadores, confirma a capacidade destes patógenos de "permanecerem infecciosos após mais de 48.500 anos passados em permafrost profundo". Os cientistas garantem que a experiência não é perigosa porque os vírus testados não seriam capazes de infectar seres humanos, apenas amebas.
"Mas acreditamos que nossos resultados com vírus que infectam amebas possam ser extrapolados para muitos outros vírus capazes de infectar humanos e animais", afirmaram os pesquisadores em comunicado divulgado à imprensa, depois da publicação do artigo na "Viruses", em março. "Portanto, é provável que permafrost antigo (eventualmente com até mais de 50 mil anos) libere esses vírus desconhecidos após o descongelamento. O risco tende a aumentar no contexto do aquecimento global, quando o degelo do permafrost será cada vez mais acelerado e mais pessoas estarão vivendo no Ártico."
"Felizmente, é razoável supor que uma epidemia provocada por uma bactéria patogênica pré-histórica reavivada possa ser rapidamente controlada com os antibióticos modernos à nossa disposição, ainda que bactérias com genes resistentes a antibióticos pareçam ser prevalentes nos solos permanentemente congelados", escreveram os autores no artigo, encabeçado pelo francês Jean-Michel Claverie. "A situação seria muito mais desastrosa no caso de doenças causadas pelo renascimento de um antigo vírus desconhecido", para o qual não haveria tratamento específico ou vacina imediatamente disponível.
O aquecimento do permafrost já foi responsabilizado por surtos de doenças infecciosas antes. O degelo do permafrost na Sibéria, por exemplo, já foi associado a surtos de antraz em renas, depois que verões excepcionalmente quentes provocaram o ressurgimento de bactérias causadoras da doença em antigos cemitérios de animais.
Um outro estudo, divulgado no início desta semana, indica que o Oceano Ártico poderá ficar completamente sem gelo durante o período de verão já a partir da década de 2030 - dez anos antes do previsto originalmente. Cientistas da Coreia do Sul, Canadá e Alemanha usaram dados de observações feitas entre 1979 e 2019 para fazer as novas projeções.
O desaparecimento completo do gelo nos meses do verão "acelerará o aquecimento no Ártico, o que pode provocar o aumento dos episódios meteorológicos extremos em latitudes médias, como ondas de calor e incêndios florestais", explicou Seung-Ki Min, pesquisador das universidades sul-coreanas de Pohang e Yonsei e coautor do artigo publicado na Nature.