Como foi a reabertura de salões e restaurantes em São Paulo
Donos de bares e restaurantes falam sobre as dificuldades e as dúvidas de protocolos de reabrir seus estabelecimentos em meio à pandemia
A cidade de São Paulo reabriu nesta segunda-feira, 6, bares, restaurantes e salões de beleza. A retomada parcial é permitida pelo Plano São Paulo, do governo do Estado. O funcionamento dos estabelecimentos voltou a ocorrer mediante cumprimento de normas firmadas entre a Prefeitura e as entidades setoriais. O Estadão conversou com proprietários desses locais sobre o que observaram deste momento. Veja:
Celso Kamura, cabeleireiro, dono de salões em São Paulo e no Rio
"O primeiro dia de reabertura parecia um momento histórico. A equipe estava num outro astral, mudou muito. A gente vinha numa loucura de trabalho, de concorrência. Hoje senti as pessoas focadas e com vontade de trabalhar. Testei todos os funcionários e afastei seis.
Uma das minhas preocupações era com a equipe usar todos os EPIs (Equipamento de Proteção Individual). Isso é uma coisa que incomoda quem trabalha com beleza. Mas, para a minha satisfação, pouquíssimos estavam reclamando. Agora as clientes: umas ficam de máscara, outras tiram e a gente pede para por. A minha preocupação neste momento é com o uso da máscara por elas. No Rio, esse é o grande problema.
Até às 13h passaram pelo salão meia dúzia de pessoas, todas com hora marcada. Por ser uma segunda-feira, até que veio mais gente do que eu esperava. A maioria eram loiras, que vieram ao salão para fazer o retoque da tintura e cortar. Tem cliente com medo, tem cliente sem medo, teve aquelas que nem reconheci por causa da máscara.
É um começo difícil, mas não acho que esse segmento vá ter declínio. Acredito que no decorrer do mês vamos ver as principais dificuldades. A primeira delas é a economia porque 40% do faturamento não resolve a nossa situação. Quero ver se vamos conseguir pagar as contas. Pelo investimento que fizemos em segurança até acho que seria honesto aumentar preço. Mas também acho que não é o momento de ficar cobrando taxa a mais."
Denis Nery, sócio da Esquina do Fuad
'O restaurante ficou silencioso. Eu tive de colocar música'
No primeiro dia de funcionamento, tive um movimento bom: reservei 70 lugares e ocupei 58. Nas redondezas, aqui em Santa Cecília, só eu abri. Estamos há 54 anos na região, somos meio pioneiros. Acho que o pessoal está vendo como estou fazendo e vai fazer do mesmo jeito. Senti os clientes meio carentes. Muitas pessoas fotografando, fazendo vídeo para mostrar aos amigos e conhecidos que estavam do outro lado do telefone. O pessoal não se soltou neste primeiro dia.
O restaurante também ficou silencioso. Tive até de colocar música, porque, caso contrário, o barulho que se escutava era o dos talheres batendo no prato. Uma dificuldade é a readaptação dos garçons. Atendendo de máscara mais aquele escudo de acrílico, fica difícil a comunicação com o cliente. É como se fosse um restaurante mudo. Como não temos cardápio, instalei um QRCode para acessá-lo pelo celular. O prato mais pedido hoje foi o medalhão de filé mignon, por R$ 39,90.
De início abri só o salão porque o espaço da calçada está proibido. Gostaria que as mesas na calçada voltassem logo, sem elas perco 50% do faturamento. Mas reconheço que vai ser difícil conter a aglomeração. Quero a calçada, mas acho que tem de esperar um pouco."
Mikaela Paim, proprietária da Osteria Generale
'Recebemos um pouco menos de clientes que a gente imaginou'
"Recebemos nesse primeiro dia um pouco menos clientes do que a gente imaginou. Foram 25, um quarto do que poderíamos ter atendido. Acredito que além de ser o primeiro dia, é uma segunda-feira, um dia normalmente fraco. As pessoas estava muito tranquilas, seguras. Muitas paravam na porta e perguntavam o que tinha de fazer para entrar, porque tudo é novidade. Logo na entrada, o garçom tira a temperatura, oferece álcool em gel e confere se a máscara está sendo usada.
Muitos tiveram dúvidas do cardápio, que agora é apresentado no celular por meio da leitura de um QRCode. Outros queriam saber porque não havia azeite na mesa, o que não é mais permitido.
Um das dificuldades foi o pouco tempo hábil para preparar o restaurante, apenas um dia e meio. O decreto foi assinado pelo prefeito no sábado. Isso é um desrespeito com o setor.
E as informações não estão claras. Por exemplo, além da máscara de pano é preciso usar a máscara de acrílico? Ninguém sabe dizer se o garçom precisa, se o manobrista precisa. Outro ponto é o alto custo de reabertura. Tivemos de comprar vários equipamentos, contratar pessoas para treinar a equipe. Há um custo de reabertura que é um problema para um setor que está em colapso."
Lucas Furlani, dono de duas franquias do Soho de salão de cabeleireiros
'Tive de reinventar o negócio. Vou trabalhar faturando um terço'
Hoje abri o salão para alguns atendimentos, mas o dia foi para passar as instruções do protocolo aos funcionários. Tenho equipe grande: são 23 funcionários no salão da Pompeia e 17 no da Vila Leopoldina. Fiz grupos de cinco, em horários alternados, para passar as instruções. A partir de quarta-feira, os salões estarão trabalhando no novo padrão.
Os preparativos foram intensos. A partir de agora, a limpeza será reforçada e todos os dias serão de faxina pesada. Escolhi produtos específicos para limpar os equipamentos, da bancada às cadeiras, pentes e escovas. Comprei capas descartáveis, máscaras, luvas e sobretudo álcool em gel, que estão custando mais caro.
Aumentei o distanciamento entre as estações de trabalho, mantendo o espaçamento de dois metros. O atendimento será com hora marcada. Tive de reinventar o negócio. Analisei todos os gastos e, a partir de agora, vou trabalhar faturando um terço do que faturava. Reduzi as despesas na mesma proporção. Não precisei mandar ninguém embora.
A maior dificuldade tem sido obter crédito. Os recursos não chegaram para os micro e pequenos empreendedores. Tivemos de renegociar aluguéis e também com os fornecedores. Não tivemos apoio nenhum do governo. Isso tudo foi muito triste."