‘Olhar para o espelho é aterrorizador’, diz mulher após mastectomia
Cirurgia para retirada das mamas feita por Angelina Jolie abala mulheres e desejo por reconstrução é frequente
Ela construiu uma vida na Austrália e não estava nos planos voltar ao Brasil tão cedo, talvez para visitar a família, mas não pela descoberta que mudou tudo há seis anos. Administradora, Joana Jeker, na época com 30 anos, costumava fazer autoexame nas mamas mensalmente, já que a mãe e a tia tiveram câncer mamário anos antes. “Em um determinado autoexame, localizei um nódulo. Eu já tinha tirado vários benignos, mas dessa vez eu soube, minha intuição me disse que era um tumor”, contou.
O histórico genético, segundo Joana, é decisivo em relação à probabilidade de desenvolver a doença. Foi com essa preocupação que a atriz Angelina Jolie optou por fazer dupla mastectomia, como forma de prevenção, e contou ao mundo sua experiência em artigo publicado no jornal The New York Times desta terça-feira (14). “A mãe dela teve câncer”, comentou Joana que já sabia do caso que virou manchete na imprensa. Angelina fez exames que apontaram a tendência ao desenvolvimento da doença e preferiu retirar as duas mamas para não ter que enfrentar o câncer no futuro.
Já o caminho de Joana foi diferente. Ela voltou ao Brasil, fez mastectomia e quimioterapia vermelha – a mais intensa -, por seis meses. “Não sei como explicar como é para uma mulher olhar para o espelho e estar sem uma mama, é aterrorizador. Sem uma parte que designa sua feminilidade”, lembrou ela que se arrependeu de não ter feito acompanhamento emocional na época.
Depois do diagnóstico de uma doença que pode matar, a retirada da mama e a queda dos cabelos foram os momentos mais chocantes, segundo Joana. “Sofri muito, mas cabelo cresce e mama dá para reconstruir”, completou. "Você se olha no espelho e pensa, 'poxa' não sou assim. Mexe muito com a autoestima e sexualidade", contou a assistente social Maria Conceição Machado, 47 anos, que fez mastectomia há cinco anos. Ela descobriu o tumor ao acaso, "arrumando a camisola", consultou uma amiga médica, passou por um ginecologista, mas só caiu a ficha quando pegou o resultado da biopsia.
Solteira, Joana não teve apoio de Brad Pitt como Angelina, mas da mãe que já tinha passado pelo problema. Maria, por sua vez, morava longe da família. Tanto a atriz como a administradora e a assistente social ressaltaram a importância do apoio familiar no tratamento. Genici Luis da Costa, 55 anos, empregada doméstica, considerou a quimioterapia como a parte mais agressiva do tratamento. “Foi o que mais me doeu, fiz seis sessões, depois a cirurgia e radioterapia”, contou. Após sentir dores no seio, ela descobriu dois caroços na mama esquerda há três anos e passou pela mastectomia.
Fim da doença e uma nova mama
Durante a entrevista, Genici aguardava para se consultar com a médica responsável pela reconstrução mamária. Ela está na penúltima etapa para corrigir o seio retirado, mas ainda disse que o implante está bastante diferente da mama direita. No caso da atriz Angelina Jolie, nove semanas depois da retirada das mamas ela fez a reconstrução mas, antes disso, ficou com implantes temporários. “Eu não me sinto menos mulher. Eu sinto que fiz uma forte escolha que em nada diminui a minha feminilidade”, contou a atriz em uma nota pessoal.
Para Joana, que fez a reconstrução dois anos depois da retirada das mamas, o momento “foi uma retomada de vida”. Segundo ela, é como se a mutilação fosse desfeita. Joana não deixou de ter relacionamentos por estar sem uma das mamas, mas contou que não se sentia plena. “Hoje em dia eu me sinto. Tatuei uma flor de cerejeira para cobrir as cicatrizes e estou mais forte do que antes”, disse. Joana fundou a Associação de Mulheres Mastectomizadas de Brasília, para a qual se dedica em tempo integral atualmente.
"Doeu mais para colocar o seio do que para retirar. Mas se eu tivesse que passar por tudo de novo para ter meio seio de volta, eu passaria", contou Maria. Ela fez a reconstrução completa: "primeiro fiz o seio e um ano depois o bico. Ficou perfeito". Segundo ela, a retirada da mama "mexe bastante com o emocional da mulher". Depois de vencer o câncer, ela passou a trabalhar na Associação Catarinense da Mulher Portadora de Cancêr.
Cicatrizes e tatuagens
Não são todas as pacientes de câncer mamário que optam por reconstruir o corpo da forma como era antes da doença. A canadense Kelly Davidson fez dupla mastectomia após ser diagnosticada com dois tumores. Sem as mamas aos 28 anos, ela decidiu tatuar uma fada em um cenário com flores e borboletas sobre as cicatrizes. “Obviamente que devastador para qualquer mulher perder os seios, porque definem nossa feminilidade”, disse ela em entrevista ao The Sun.
“Decidi transformar essa coisa negativa em algo positivo, e coloquei uma obra de arte no lugar de algo que para muita gente é realmente devastador”, postou ela no Pinterest. A imagem compartilhada nas redes sociais ganhou quase 1 milhão de “curtir” em cerca de 48 horas, de acordo com a publicação. A tatuagem para ela, que participa de um grupo chamado World Cancer, é como uma medalha de “honra e força”.