Duas crianças recebem o mesmo fígado em São Paulo; como isso é possível?
Técnica de "transplante split" consiste em dividir o órgão em dois; entenda melhor o procedimento e conheça as histórias de Esther e Diego
No topo da lista de doação de fígado, a pequena Esther, de 2 aninhos, recebeu apenas 35% do órgão que tanto necessitava. A operação aconteceu em abril deste ano e foi realizada no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. No mesmo dia, Diego, de 12 anos, recebeu o restante do órgão.
O transplante foi realizado desta maneira graças a uma técnica que se chama Split (dividir, em português) e permite que um só órgão seja dividido em duas partes. Por coincidência a cirurgia de Esther e de Diego aconteceram no mesmo dia e no mesmo hospital. Ele era o segundo na fila do transplante.
Segundo a ABTO (Associação Brasileira de Transplante de Órgãos), de janeiro a junho deste ano, o Brasil realizou 1.103 transplantes de fígado. A técnica Split é uma alternativa para que a fila se reduza; atualmente 1.343 outros indivíduos aguardam um novo órgão.
Como funciona a técnica Split?
As condições clínicas para a técnica exigem que órgão esteja em boa condição. O fígado pode ser dividido em duas metades desiguais ou iguais (o que pode beneficiar dois adultos, por exemplo). Graças à distribuição anatômica vascular do fígado, é possível realizar esta divisão sem que as funções vitais sejam comprometidas.
Ele possui capacidade regenerativo e cresce de acordo com o tamanho ideal de cada corpo. No caso de Esther e Diego, ela ficou com 35% do fígado e o menino teve direito à parte maior do órgão, de acordo com suas necessidades.
"Não adianta fazer a bipartição de um fígado não tão bom que poderia ser usado inteiro em duas metades ruins", disse o médico cirurgião do aparelho digestivo no Hospital Sírio-Libanês Eduardo Antunes da Fonseca em entrevista ao UOL. Ele participou da cirurgia das crianças.
O médico disse ainda que os resultados deste procedimento são iguais aos de um transplante tradicional e que o risco seria maior na hora de fazer a divisão do fígado, por causa das pequenas estruturas que precisam ser reconstruídas.
Diagnósticos
Esther foi diagnosticada com cirrose criptogênica, condição em que não se sabe a causa da doença. Ela nasceu com peso abaixo do normal e com tamanho menor do que o recomendado para a idade. Ela entrou para a fila de doação em setembro do ano passado.
Tanto a mãe quanto outros familiares eram compatíveis com a crianças, mas diferentes condições os impediram de doar. Uma amiga compatível chegou a se oferecer e no mesmo dia em que o juiz autorizou o transplante, Maiara (mãe de Esther) recebeu a ligação do hospital com a notícia do novo órgão.
Já o pequeno Diego nasceu com atresia de vias biliares, doença que impede o transporte da bile produzida no fígado e faz com que o líquido fique retido no órgão. Complicações no esôfago e nos pulmões da criança levaram a hemorragias e necessidade de cilindro de oxigênio. Ele entrou na fila de transplante há seis anos.